Demissão

Afirmações de Moro soam como confissão de crimes no meio político e jurídico

Ex-juiz disse que Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal para ter acesso a investigações sigilosas

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Moro afirmou que Bolsonaro quis intervir politicamente na Polícia Federal - Marcos Corrêa/PR

As declarações do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro para justificar sua demissão do governo, nesta sexta-feira (24), soaram como uma confissão de crimes no meio político e jurídico.

Segundo o ex-juiz, Jair Bolsonaro (sem partido) tentou interferir na Polícia Federal para ter acesso a investigações sigilosas, inclusive sob a tutela do Supremo Tribunal Federal (STF).

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Para juristas, parlamentares e lideranças políticas, a afirmação de Moro é a exposição de um crime cometido pelo presidente, por tentar obstruir a justiça, e, ao mesmo tempo, a admissão de um crime próprio – o de prevaricação, por não ter exposto o delito mesmo sabendo.

Em entrevista à Rádio Gaúcha, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, diz que Bolsonaro pode ter cometido crime comum ao tentar acessar relatórios de inteligência da PF. 

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O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, declarou que a ordem vai analisar os indícios de crimes. “A OAB irá analisar os indícios de crimes, apontados por Moro. Mas preciso registrar meu lamento e minha indignação com as crises que o presidente nos impõe, por motivos extremamente suspeitos, em meio a uma crise pandêmica que, de tão grave, deveria ao menos ser a única”, ressaltou.

A OAB vai pedir um relatório à sua comissão de estudos constitucionais para saber se Bolsonaro cometeu algum crime de responsabilidade, o que poderia sustentar um pedido de impeachment.

O líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), também anunciou que vai entrar com um novo pedido de impeachment do presidente ainda nesta sexta  e classificou o pedido de demissão de Moro como “uma delação premiada”.

“Entraremos ainda hoje com pedido de impeachment do Presidente da República, a partir das graves denúncias feitas pelo agora ex-ministro da justiça”, afirmou.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) usou a seu perfil no Twitter para pedir a renúncia de Bolsonaro. 

"É hora de falar. Pr está cavando sua fossa. Que renuncie antes de ser renunciado. Poupe-nos de, além do coronavírus, termos um longo processo de impeachment. Que assuma logo o vice para voltarmos ao foco: a saúde e o emprego. Menos instabilidade, mais ação pelo Brasil", postou.

O ex-candidato do PT à presidência Fernando Haddad reforçou que o ex-ministro descreveu vários crimes de responsabilidade e pediu que os ministros que restaram no governo forcem a renúncia de Bolsonaro.

“Vários crimes de responsabilidade descritos por Moro. Os ministros, especialmente os militares que ainda respeitam esse país, deveriam renunciar a seus cargos e forçar a renúncia. O impeachment é processo longo. A crise sanitária e econômica vai se agravar se nada for feito”, afirmou em rede social.

Guilherme Boulos, ex-candidato à presidência pelo PSOL, disse que Moro tem o dever de dar mais detalhes sobre os crimes que ele sugeriu. “Moro acusou Bolsonaro abertamente de desvio de função e tentativa de obstrução de justiça. Tem o dever de dar detalhes ao Ministério Público e ao Congresso. Se confirmar as acusações e houver ainda alguma lei neste país, Bolsonaro cai”, disse.

Para o ex-candidato à presidência Ciro Gomes, o confronto entre Moro e Bolsonaro gerou uma lista de “artigos do código penal”. “Nesta confrontação chocante entre Moro e Bolsonaro, o país ganha muito com a briga em si. Só hoje já tivemos notícia de uma lista de artigos do código penal além de crime de responsabilidade: prevaricação, falsidade ideológica, tráfico de influência, (...)”.

A líder do PSL na Câmara, Joice Hasselmann, ex-aliada de Bolsonaro, classificou o depoimento de Moro como “avassalador”.

“Pode demorar 4 anos, mas a máscara dos hipócritas sempre cai. Quem quer controlar a PF, bananinha, é seu PAI, pra proteger vc e seus irmãos dos crimes que cometeram: gabinete do ódio, rachadinha. Só escolher!”, declarou a deputada em mensagem ao filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (sem partido).

A deputada Érika Kokay (PT-DF) declarou que a saída de Moro não o livra da responsabilidade de ter se aliado ao governo. “Ficou em silêncio todo tempo enquanto a familícia Bolsonaro cometia crimes, ameaçava a democracia, o STF, o Congresso, defendia AI-5, tortura e o retorno da ditadura militar. Foi um ministro da Justiça omisso que não deixará nenhum legado p/ o Brasil”, postou.

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O ex-ministro e atual deputado Alexandre Padilha (PT-SP) reforçou que o ex-juiz “não é inocente nessa história”, lembrando que ele foi decisivo para a eleição de Bolsonaro e perseguiu Lula mesmo não tendo provas. “Moro sabia a quem estava servindo, foi subserviente com Bolsonaro”, disse.

Segundo o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), Moro se defende com um método que já utilizado, o de usar politicamente a Polícia Federal. “Essa delação premiada feita pelo Moro não atenua o fato de ele ter usado o Ministério da Justiça e a Polícia Federal para encobrir diversos crimes da família Bolsonaro”, aponta.

O senador Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que os crimes apontados pelo ex-juiz são estarrecedores e gravíssimos. “Moro sai atirando no fascismo que defende e ajudou a fabricar. Os crimes de responsabilidade apontados por ele são estarrecedores e gravíssimos: controlar investigações, blindar filhos, interferir na PF para ter acesso a relatórios sigilosos são o fim da linha. Com Nixon foi assim", afirmou.

Edição: Leandro Melito