Bolívia

Arce começa governo na Bolívia com equipe de jovens: "Produto da nossa revolução"

Novo ministro da saúde quer 10% do PIB para o setor: combate à pandemia e criação de sistema único de atendimento

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |
David Choquehuanca, o vice, e Luis Arce (à direita na foto) participam nesta terça-feira (10) da primeira atividade comemorativa como governantes da Bolívia - Reprodução

Nesta terça-feira (10), Luis Arce, que assumiu a presidência da Bolívia no último domingo (8), participou do primeiro evento festivo nacional como o novo dirigente do país, acompanhando a celebração de 213 anos da libertação do estado de Potosí. Na ocasião, assegurou que retomará as obras paralisadas há quase um ano pela gestão interina. Em todas as atividades, Arce usou novamente a faixa presidencial com a bandeira boliviana e a Whipala, que representa a congregação dos povos indígenas do Estado Plurinacional.

O chefe de Estado já nomeou um novo gabinete com 16 ministros, sendo 13 homens e três mulheres. Em seu primeiro discurso, destacou que o novo governo será austero devido à recessão econômica do país. A autoproclamada presidenta Jeanine Áñez, que assumiu o governo após o golpe contra Evo Morales em novembro de 2019, entregou o cargo com índices de 5,6% de retração no PIB boliviano, somente no primeiro semestre - um recorde para os últimos 15 anos. 

Novo Gabinete 

Juventude e renovação é a promessa do chefe de Estado com o novo gabinete. Nenhum dos novos ministros chefiou pastas nas gestões anteriores do Movimento ao Socialismo (MAS). O novo ministro de Defesa, Edmundo Novillo, é o mais próximo da direção do partido, sendo considerado um líder histórico do MAS. Foi o primeiro presidente da Câmara de deputados, em 2005, e governador do estado de Cochabamba. 

Arce, no entanto, destacou no seu discurso que os funcionários que o acompanharão são fruto da revolução boliviana. "Há muitos jovens profissionais que emergiram e são produto da nossa revolução desde 2006. São jovens profissionais aymaras, quechuas, guaranis e que agora felizmente têm um diploma e um título acadêmico", assegurou

Para o Ministério da Presidência assume Marianela Prada Tejada, que foi chefe de gabinete quando Arce ocupou o ministério da Economia e Finanças e será a primeira mulher a ocupar a pasta. Felima Gabriela Mendonza também trabalhou no despacho como vice-ministra de Política Tributária e agora assume a pasta de Planejamento.

Já Marcelo Montenegro Gómez García, considerado braço direito de Arce na elaboração das políticas que levaram a Bolívia ao chamada "milagre econômico", é o novo chefe do ministério de Economia e Finanças. 


A nova ministra da Presidência Marianela Prada afirmou que pretende estabelecer pontes de diálogo: "a pluralidade política é um bem essencial da democracia" / ABI

O advogado Rogelio Mayta é o novo ministro de Relações Exteriores. Foi um dos impulsores do comitê pelo julgamento contra os crimes do ex-presidente Gonzalo Sánchez de Lozada (1997-2003), e também advogado das vítimas da chamada Guerra do Gás - protestos em 2003 contra a privatização desse recurso natural. Foi candidato ao senado pelo MAS em 2019.

A pasta de Meio Ambiente e Água ficará a cargo do ex-presidente da Confederação Sindical de Trabalhadores Camponeses, Juan Orlando Cruz. Enquanto, a ex-dirigente da Central Operária Boliviana (COB), Verónica Navia Tejada é a nova ministra de Trabalho, Emprego e Previsão Social.

O novo ministro de Cultura e Esporte também vem do meio sindical. Adrián Quelca Tarqui foi reitor da Escola de Formação de Professores Simón Bolívar e assessor de cultura da COB. 


Novo gabinete ministerial é composto por 13 homens e três mulheres, a maioria são jovens, com perfil técnico e que não chefiaram ministérios durante a gestão de Morales. / Reprodução

O ministério de Desenvolvimento Produtivo e Economia Plural será chefiado por Néstor Huanca Chura, que foi assessor dessa pasta no governo Morales e vice-ministro de Produção Industrial.

Já o ministro de Desenvolvimento Rural e Terras, Wilson Cáceres Cárdenas, é engenheiro agrônomo e foi presidente da Empresa estatal de Apoio a Produção de Alimentos (Emapa).

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O engenheiro metalúrgico Ramiro Villavicencio Niño de Guzmán é o novo ministro de Mineração e Metalurgia, um dos setores-chave da economia boliviana. Foi gerente da Empresa Metalúrgica de Vinto (EMV), que, durante sua gestão, se tornou uma das maiores do setor no mundo.

Iván Manolo Lima Magne, ex- magistrado do Tribunal Supremo de Justiça agora assume como novo ministro de Justiça e Transparência Institucional. 

O cirurgião Edgar Pozo assumiu o ministério de Saúde e já declarou que irá retomar a proposta de criação do SUS - Sistema Único de Saúde, aprovada durante o último governo de Morales, e reivindicará 10% do PIB para o setor, como parte das políticas para combater a pandemia. Até o momento a Bolívia registra 142.561 casos confirmados e 8.802 falecidos pela covid-19.

Já o ministro de Obras Públicas, Serviços e Moradia, Edgar Montaño anunciou que realizará uma auditoria nas contas da Administradora Boliviana de Estradas (ABC - pelas siglas em espanhol), da telefônica Entel e da companhia aérea Bolivana de Aviação. Montaño foi deputado pelo MAS pelo estado de Santa Cruz, na última legislatura. 

Todos receberam a tarefa de entregar um relatório preliminar sobre a situação do setor que atendem e o orçamento atualizado da pasta. 

O presidente boliviano ainda assegurou que nos próximos dias irá emitir um decreto supremo para recriar o ministério de Cultura, que será comandado por uma mulher.


Movimentos sociais, sindicalistas e camponeses realizaram um desfile em frente à sede do governo em La Paz para receber Arce e Choquehuanca. / Reprodução

Reconhecimento internacional

Vários chefes de Estado, de governo e representantes internacionais compareceram ao ato de posse de Arce e Choquehuanca ou enviaram felicitações à distância. O chanceler iraniano, Mohamad Yavad Zarif chegou à La Paz depois de realizar uma visita oficial à Venezuela. 

Pelos Estados Unidos, o secretário de Estado Mike Pompeo telefonou para o novo presidente e enviou o subsecretário do Tesouro, Brent McIntosh e a encarregada de negócios, Charisse Phillips.

O rei da Espanha Felipe VI foi acompanhado do primeiro vice-presidente Pablo Iglesias, quem afirmou que o povo boliviano deu uma "lição de democracia diante do golpismo e decidiu pelo rumo do progress, soberania e da justiça social".

O presidente da Colômbia, Iván Duque também compareceu ao ato e se reuniu com o novos governantes bolivianos.

O presidente Alberto Fernández depois de participar do ato de regresso de Evo Morales à Bolívia, reuniu-se com Arce e Choquehuanca, junto a seu chanceler, Felipe Solá.

O ministro de Relações Exteriores da Venezuela, Jorge Arreaza acompanhou o ato, participou da retomada da embaixada venezuealana em La Paz, que estava ocupada por opositores nomeados por Juan Guaidó e ainda se reuniu com seu homólogo recém empossado. 

Além disso, enviaram mensagens de felicitação, o presidente francês Emmanuel Macron, o chinês Xi Jinping e o presidente paraguaio Mario Abdo Benitez.

Regresso de Evo

Outro evento que marcou os primeiros dias do novo governo foi o retorno de Evo Morales ao país. Milhares de pessoas participaram do ato na Ponte Internacional de Quiaca, fronteira entre os dois países, para despedir o ex-mandatário.

Evo segue em caravana pelo território boliviano até chegar a sua residência em Chapare, estado de Cochabamba. 


Evo Morales e Alvaro García Linera são recebidos por uma multidão depois de quase um ano de exílio na Argentina. / Reprodução

Passando pela região do Salar de Uyuni, estado de Potosí, o líder indígena se pronunciou em um novo ato, onde agradeceu pela receptividade do povo.

"Estamos vivendo novamente dias históricos. Voltamos. Recuperamos a democracia novamente. Recuperamos a Pátria. Os 'anti-pátria' nos tiraram através da violência por um ano. Um ano de profunda reflexão, mas agora  nosso processo de mudança volta novamente à Casa do Povo. Nossa luta vai muito além: é contra o capitalismo, contra o imperialismo", assegurou o primeiro presidente indígena do país.

Potosí é o estado que concentra as maiores reservas de lítio do mundo. A disputa pelo controle desse recurso natural foi apontada como uma das razões econômicas para o golpe de Estado. Evo afirmou que as medidas de industrialização da extração do lítio serão retomadas pelo atual governo. 

Edição: Rogério Jordão