Visita ao Brasil

Macron exalta reconstituição democrática do governo Lula após 8 de janeiro

Presidente francês foi recebido pelo chefe do executivo brasileiro nesta quinta e os dois fecharam mais de 20 acordos

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Lula e Emmanuel Macron no Palácio do Planalto
Lula e Emmanuel Macron no Palácio do Planalto - Ricardo Stuckert/Divulgação

O presidente da França Emmanuel Macron exaltou nesta quinta-feira, (28), a atuação do governo Lula para reconstruir a democracia e o equilíbrio das instituições após os ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. 

"Toda minha comitiva e eu, pessoalmente, nos sentimos imensamente honrados de estarmos hoje aqui ao seu lado, neste lugar, nesta Praça dos Três Poderes, que foi atacada, destruída praticamente, ou, pelo menos, bastante maltratada pelos inimigos da democracia. A maneira com que [Lula] conseguiu reconstituir os equilíbrios da democracia e levar a cabo esse debate internacional significa muitíssimo para nós", declarou Macron durante visita ao Palácio do Planalto.

O presidente francês teve uma série de desentendimentos com Bolsonaro, que chegou a zombar a esposa de Macron nas redes sociais. Agora, ele afirma que a democracia brasileira teve "força" para resistir a ataques golpistas "com uma alternância democrática, restaurando plenamente e integralmente todos os equilíbrios", segundo a tradução feita pelo governo brasileiro.

Na sequência, Lula ressaltou a parceria entre os dois países e lembrou que Macron o recebeu na França como chefe de estado quando ele ainda nem era presidente, durante o governo de Jair Bolsonaro. "Isso marcou muito a minha vida. O respeito crescente que eu tenho pela França só aumentou a partir do gesto do presidente Macron", afirmou.

Parcerias

O presidente francês foi recebido por Lula nesta quinta como um dos últimos compromissos de sua viagem de três dias no Brasil, iniciada na terça-feira, (26). Em sua a primeira viagem ao país, ele passou pelos estados do Pará, Rio de Janeiro e São Paulo antes de chegar a Brasília, onde assinou mais de vinte tratados sobre temas que vão da indústria de defesa à preservação da Amazônia, combate ao garimpo, desenvolvimento tecnológico e parcerias culturais entre os países.

Macron anunciou ainda que a França pretende fazer investimentos de cerca de 1 bilhão de euros no Brasil nos próximos anos, entre iniciativas públicas e privadas, e relembrou medidas defendidas pelos dois países no cenário internacional, como a tributação dos super-ricos.

A França atualmente é o terceiro maior investidor no Brasil. No ano passado, investiu R$ 8,4 bilhões no país nas áreas de hotelaria, defesa, tecnologia, dentre outros. O país é ainda o maior empregador estrangeiro no Brasil.

Além dos acordos comerciais e estratégicos, o encontro dos dois presidentes foi marcado pela entrega por Lula do colar da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul a Emmanuel Macron. A honraria é a mais alta condecoração brasileira dada a autoridades estrangeiras. Em contrapartida, Macron concedeu à primeira-dama Janja da Silva uma insígnia da ordem nacional da legião de honra no grau de oficial e explicou que Lula já havia sido agraciado com essa honraria do governo francês no passado e, por isso, iria agraciar também a primeira-dama.

Oposição venezuelana fragmentada  

Lula e Macron também foram questionados pela imprensa sobre a situação das eleições na Venezuela. O presidente brasileiro afirmou que é "grave" que uma candidata da oposição ao governo de Nicolás Maduro não tenha conseguido se registrar para concorrer nas eleições. Foi apoiado pelo presidente da França Emmanuel Macron, que endossou a fala do petista e disse esperar uma solução para a situação ainda nesta semana.

"É grave que a candidata não possa ter sido registrada. Ela não foi proibida pela Justiça, (ela) tentou usar o computador e não conseguir entrar, isso causou prejuízo", afirmou Lula ao ser questionado pela imprensa sobre a situação do país vizinho, onde a professora Corina Yoris tentou se registrar e não conseguiu por um problema técnico.

Ele ainda comparou a situação com o Brasil: "Aqui é proibido proibir, a não ser que tenha uma punição judicial e que essa punição garanta o direito de defesa", seguiu Lula.

Na sequência, Macron disse concordar com tudo que Lula disse sobre Venezuela, mas adotou um tom mais alarmista sobre o país.

"Vamos fazer de tudo para convencer o presidente Maduro e o sistema eleitoral para que reintegre os candidatos. Condenamos firmemente o fato de terem retirado uma candidata muito boa desse processo e espero que seja possível ter um novo marco construído nessa semana. Não nos desesperemos, mas a situação é grave e piorou com a ultima decisão", afirmou Macron.

O presidente brasileiro ainda afirmou que vai indicar observadores para acompanhar o processo eleitoral no país vizinho, e disse esperar que ele ocorra como no Brasil: "Não quero nada melhor e nem pior. Eu quero que as eleições sejam feitas igual nós fazemos aqui no Brasil. Com a participação de todos. Quem quiser participar, participa, quem perder chora, quem ganhar sorri e assim a democracia continua", disse o petista.

Ele ainda relembrou que em 2018 foi impedido pela Justiça Eleitoral de se candidatar e indicou o nome de Fernando Haddad para exemplificar que são situações que podem ocorrer em uma democracia.

As manifestações de Lula e Macron ocorrem após o governo da Venezuela declarar que uma nota divulgada pelo Itamaraty sobre as eleições venezuelanas parece "ter sido escrito pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos". Na nota, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil afirmou que acompanha o processo eleitoral da Venezuela com "expectativa e preocupação".

"Com base nas informações disponíveis, observa que a candidata indicada pela Plataforma Unitária, força política de oposição, e sobre a qual não pairavam decisões judiciais, foi impedida de registrar-se, o que não é compatível com os acordos de Barbados", afirmou o Itamaraty no texto.

Nesta quinta, Lula relembrou que já conversou com Maduro sobre a importância de as eleições venezuelanas ocorrerem sem intercorrências e questionamentos. "Eu estive com o Maduro na Guiana, para uma reunião do Caricom e tive uma longa reunião com o Maduro. E disse para o Maduro que a coisa mais importante para restabelecer a normalidade na Venezuela é não ter problema eleitoral, é que as eleição fossem convocadas da forma mais democrática possível", disse o petista antes de condenar a situação da candidata que não conseguiu se registrar por problemas técnicos.

No cenário político venezuelano, onde o chavismo é força política hegemônica há anos, a oposição frequentemente se fragmenta em períodos eleitorais e, desta vez, não foi diferente: serão 12 candidatos tentando impedir nas urnas a reeleição de Maduro.

Parte da oposição apostava no nome da ex-deputada María Corina Machado, do Vente Venezuela, para enfrentar o atual presidente. Mas a opositora está inabilitada de ocupar cargos públicos por 15 anos e, por isso, escolheu a professora Corina Yoris para seu lugar. Ela também não conseguiu se inscrever alegando problemas no site do Conselho Nacional Eleitoral (CNE).

Sem Corina, o governador de Zulia, Manuel Rosales, do partido Un Nuevo Tiempo (UNT), que se inscreveu na noite de 25 de março, surge como nome forte da direita para a disputa.

Acordo Mercosul-União Europeia

O presidente francês também aproveitou a visita para criticar a proposta de acordo entre Mercosul e União Europeia. Segundo ele, o atual acordo está sendo negociado há mais de 20 anos e não foi atualizado, prevendo, por exemplo, temas como o clima. Para ele, o acordo "precisa ser renegociado do zero".

"O Mercosul é um péssimo acordo como ele está sendo negociado agora. Esse acordo foi negociado há 20 anos. Eu não defendo esse acordo. Não é o que queremos", disse. "Deixemos de lado um acordo de 20 anos atrás e construamos um novo acordo, mais responsável, prevendo questões como o clima e a reciprocidade", destacou Macron em sua participação no Fórum Econômico Brasil-França, realizado na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Edição: Matheus Alves de Almeida