Protesto

Pescadores se organizam contra impactos ambientais de empresa no litoral baiano

Por fora de associações, trabalhadores fizeram ação autônoma contra Fibria e denunciaram falta de participação política

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Pescadores fecharam canal do Tomba em Caravelas (BA) no último sábado, onde empresa escoa produção de eucalipto
Pescadores fecharam canal do Tomba em Caravelas (BA) no último sábado, onde empresa escoa produção de eucalipto - Alan Machado

Para enfrentar os impactos ambientais da empresa de celulose Fibria, pescadores artesanais e marisqueiros tem se organizado de forma autônoma em Caravelas, município localizado no litoral sul da Bahia.

Na madrugada do sábado (1º), os trabalhadores fecharam o canal do Tomba, criado para o acesso entre o mar e o Rio Caravelas. A passagem é onde a Fibria, antiga Aracruz Celulose, transporta toras de eucalipto até o Terminal de Barcaças de Barra do Riacho, em Aracruz, norte do Espírito Santo.

 

Imagem de satélite do Canal do Tomba, em Caravelas (BA) (Foto: Reprodução/ Google)

A empresa — maior produtora de celulose de eucalipto do mundo e que teve lucro líquido de R$ 329 milhões no primeiro trimestre deste ano — é responsável pela dragagem do canal que, segundo os pescadores, promove graves impactos ambientais no território tradicional de aproximadamente 2 mil pescadores da Reserva Extrativista de Cassurubá.

A reserva abrange, além de Caravelas, os municípios de Nova Viçosa e Alcobaça e é uma unidade de conservação federal.

Movimento autônomo

A ação do sábado interrompeu o escoamento da produção por cerca de 12 horas, até a empresa atendê-los em uma reunião, que ocorreu nesta segunda-feira (3). O pescador Alan dos Santos Machado, de 32 anos, conta que a ação foi pensada de maneira autônoma pelos pescadores, que não se sentem representados pelas associações ou pelas cooperativas da região. As entidades existentes, segundo eles, atuam alinhadas à empresa. 

"A gente estava cansado de ver quem mais nos prejudica sempre ficar impune, sempre sair ileso de reuniões, de sempre prometer e não cumprir", disse ele. "Então a gente deixou bem claro que a gente queria dialogar, mas é para dialogar com quem está sendo impactado e não com quem é falsa representação, falsos líderes".



Cartaz que denuncia impactos da dragagem no Canal do Tomba (Foto: Alan Machado)

Com o protesto, eles denunciam que o processo de retirada e descarte dos sedimentos do canal resulta no assoreamento do entorno do rio e mar, carregamento de material lamoso à costa e a recifes de corais, soterramento dos bancos de camarões, além da limitação das áreas tradicionais de pesca. Ao lado do turismo e da agricultura, a pesca é uma das principais atividades econômicas de Caravelas.

Em nota enviada pela assessoria de imprensa, a empresa disse que não concorda com a maneira como foi feito o fechamento do Canal do Tomba,  "uma vez que prejudica não só a Fibria, mas todos os usuários que navegam na região".

Participação

A principal reivindicação dos pescadores artesanais é a participação na Cooperativa das Marisqueiras e Pescadores de Caravelas (Coompescar). A entidade foi criada e é mantida pela Fibria como contrapartida do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) à construção do Terminal Marítimo de Barcaças de Caravelas em 2003. A exigência, feita durante o licenciamento da obra, é que a empresa financie projetos em caráter indenizatório às comunidades tradicionais.

No entanto, os pescadores afirmam que a Controller, uma empresa contratada para auxiliar na consultoria financeira e coordenar a execução dos projetos da cooperativa, tem impedido e enfraquecido a participação popular nos processos decisórios.

Para Alan, a Coompescar é pouco representativa. "A Fibria é muito omissa em entregar um empreendimento de mais de 2 milhões de reais na mão de duas pessoas, presidente e secretário. A cooperativa tem que ser aberta à comunidade, para todo mundo. É isso que a gente está reivindicando", disse o pescador. Em nota, a empresa afirmou que a direção da entidade é "autônoma e independente, e não sofre nenhuma interferência da empresa".

Além da participação política na Coompescar, o movimento reivindica uma câmara de resfriamento e um frigorífico, a construção de sede da associação, além de uma solução para o problema dos sedimentos que atingem a costa e o entorno de Caravelas.

A empresa recebeu o movimento em uma reunião e acenou que vai atender às reivindicações, entre elas a indicação de mais duas entidades para participar de um licitação para um curso de cooperativismo, a abertura das inscrições na Coompescar e a realização de auditoria na cooperativa.

O coletivo deve realizar mais uma reunião com a empresa nesta sexta-feira (7) e pretende, agora, estruturar um coletivo de mulheres pescadoras.

Edição: Rafael Tatemoto