Memória

Miruna Genoíno lança livro “Felicidade Fechada” sobre a prisão de seu pai

Relatos familiares e cartas fazem parte de livro que conta como a família de José Genoíno lidou com o assédio da mídia

Colaboração para o Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
Autora lançou publicação na última sexta-feira (2), em Belo Horizonte
Autora lançou publicação na última sexta-feira (2), em Belo Horizonte - Reprodução

Em evento de lançamento do livro “Felicidade Fechada”, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas recebeu, na sexta (2), a presença da educadora e escritora Miruna Kayano Genoíno, primeira filha de José Genoíno. Seu pai, sua mãe Rioco Kayano, familiares e amigos acompanharam o evento, além de um público de 200 pessoas interessadas na história e no momento em companhia dos protagonistas.

A obra é dividida em duas partes. A primeira é uma compilação de relatos de Miruna sobre como a família viveu o processo iniciado em 2005, que julgou e condenou seu pai através de princípios questionados por vários setores, inclusive jurídicos. A situação levou a família a uma condenação paralela, que além de todo sofrimento implicado na prisão de Genoíno, sofreu assédio, várias violações de direitos por parte da imprensa e discriminação nas ruas. O processo alterou o modo de vida de todos, incluindo os dois filhos de Miruna, à época com 5 e 6 anos. Já a segunda parte do livro traz as cartas que Minura escreveu ao pai quando ele já estava na prisão.

Miruna explica que o processo em questão, a Ação Penal 470, o “Mensalão”, condenou seu pai, então presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), e outros políticos de forma controversa com relação aos demais réus. Para ela, houve parcialidade, seletividade, e uso de Teorias de Direito questionadas até hoje nos meios jurídicos, citando o “Domínio do Fato”. Minura contesta o que foi usado como provas para condenação, referindo-se às assinaturas de Genoíno em atos de ofício e empréstimos feitos ao PT, que haviam sido declarados e aprovados pelo Superior Tribunal Eleitoral.

Miruna nos fala sobre sua obra:

Qual o motivo da escolha de “Felicidade Fechada” como nome ao livro?

O livro se chama “Felicidade Fechada” por escolha da minha filha, que à época tinha entre 6 e 7 anos, e sugeriu esse nome porque o vovô é a felicidade de todo mundo, então se ele está preso, a felicidade está fechada. Essa parte é citada na contracapa do livro.

Como foi contar para os seus filhos que o avô estava preso?

Fomos contando aos poucos. Eles têm um papel muito importante para a família no processo. O menor tinha apenas 5 anos e ele é o que teve maior dificuldade de entender. Fomos antecipando, contando que tinham pessoas que achavam que o avô deles tinha feito uma coisa que não era verdade, que teríamos que ser muito fortes e unidos e contar com apoio uns dos outros. Eu estava fraca naquele momento e também me sustentei nesse apoio [do grupo familiar]. Tivemos a sorte de eles não estarem em casa no momento da prisão, e apesar da força que tiveram para absorver o fato, sofreram também por não terem tido a oportunidade de se despedir do avô, e isso foi bem difícil. Eles foram ao parque com uma amiga e quando voltaram já não tinham mais a presença do avô, que demorariam a ver de novo, e mesmo a minha, que tive que ir pra Brasília logo em seguida. Tudo isso às vésperas do aniversário da minha filha, o que marcou a data.

Como está seu pai hoje, juridicamente e pessoalmente?

Juridicamente, ele não tem nenhum processo, pois recebeu o indulto no começo de 2015 e pôde vir para são Paulo. Mesmo assim continuamos defendendo que ele nunca deveria ter ido à prisão, nem ter passado por tudo isso. E de saúde ele está muito bem (risos), está se cuidando, parou de fumar depois da cirurgia e está muito melhor e fortalecido com relação à época.

Qual é o núcleo familiar envolvido no livro?

O núcleo envolvido, e eu sempre digo nos lançamentos, somos eu, meu pai Genoíno, minha mãe Rioco, meu irmão Ronan, meu marido Miguel, meus filhos Paula e Luis Miguel, minha cunhada Marília, minha irmã Mariana e meu cunhado Pedro, que agora têm uma filhinha bebê, esse núcleo da família Genoíno.

Como foi conciliar seu trabalho com escrever um livro e sua vida familiar como mãe de dois filhos relativamente pequenos?

Para o livro em si foi tranquilo, porque eu não sentei e escrevi o livro a partir do zero, e sim fiz uma junção de textos que já estavam escritos. As partes que eu precisava escrever, fazia quando ia visitar meu pai em Brasília nos finais de semana. O que foi mais difícil foi essa dinâmica deles [os pais] estarem em Brasília e a gente em São Paulo, até por isso eu não pude visitá-lo na Papuda enquanto eu não tive férias, já que economicamente dependo do meu trabalho. Meu pai nunca enriqueceu. Eu e meus irmãos tivemos sempre que trabalhar para mantermos nossas vidas. Então, fomos conciliando e dando o suporte necessário dentro do possível para não prejudicar nosso trabalho.

Como surgiu a ideia do livro, o que te levou a escrever?

A partir dos relatos que eu já tinha escrito, decidimos em família que aquilo deveria ser usado como instrumento de defesa do meu pai, que era importante revelar essa parte de nossa vida, do nosso dia a dia, em nome dessa nossa batalha. Quem ler o livro vai notar. Falamos de aspectos pessoais nossos, tudo em nome dessa luta. A partida desses relatos, não só facilitou os caminhos da elaboração do livro, como nos poupou emocionalmente de reviver essa parte dolorosa de nossas vidas.

Desde quando seu livro está lançado?

Fizemos o primeiro lançamento em março do ano passado, desde então temos feitos vários lançamentos, e pretendemos seguir nisso. Temos a parceria da Editora Cosmos, que é pequena e está começando, e sabemos que este é um livro contra a corrente no que diz respeito ao mercado, então dependemos dos lançamentos para vendê-lo. Não é um livro que se faz e joga na livraria e vende. Precisamos dessa veia presencial para que o projeto continue acontecendo.

Como está sendo o financiamento da produção dos exemplares do livro?

Fizemos para a primeira edição uma campanha no Catarse. A editora conseguia arcar com os custos da edição, da produção, mas não da impressão. Foi uma campanha maravilhosa, pois arrecadamos em duas semanas o valor necessário. Dando conta da primeira edição, conseguimos bancar essa segunda, que é a que temos agora.

Como foi que seu pai recebeu a ideia do livro? Qual era a situação dele na época?

Consegui respirar pra organizar isso quando as coisas já tinham acalmado um pouco, ele estava em prisão domiciliar e estava conosco presencialmente. Meu pai participou inicialmente em pílulas, pois aquele assunto ainda mexia muito com ele, e entrou quando o livro já tinha um corpo. A essa altura ele topou e sentiu que dava sim, que aquilo era uma maneira de sair da situação que ele estava e levantar a cabeça.

O que você avalia como ponto positivo ou aprendizado ao escrever esse livro?

Positivo eu não diria, porque eu preferiria nunca ter precisado escrever esse livro, como preferia que meu pai nunca tivesse passado por isso, que hoje ele estivesse fazendo diferença na política partidária. Mas, por conta até da minha veia educadora, é gratificante saber que a palavra escrita ainda tem um espaço. Vale a pena ler e escrever, numa época em que tudo se reduz muito em histórias de Instragam, Face e postagens. Escrever um livro, fazer seu lançamento em papel, fazer dedicatórias, tem sim muito valor. E esses lançamentos têm sido um resgate da história do meu pai, proporcionando momentos muito especiais, reencontros, desde os lançamentos menores em sindicatos até os maiores, como em São Paulo, que reuniu 500 pessoas. Levando meu pai de encontro a suas raízes verdadeiras de luta política, fazendo muito bem pra ele, o que pra mim, já vale tudo.

Edição: Joana Tavares