Despejo

Justiça aprova liminar de despejo de famílias produtoras do café Guaií, em MG

Agricultores estão acampados há 20 anos e produzem alimentos sem agrotóxicos; safra anual de café chega a 510 toneladas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Acampados levaram toneladas de alimentos em frente ao Fórum para mostrar que o terreno gera trabalho e renda
Acampados levaram toneladas de alimentos em frente ao Fórum para mostrar que o terreno gera trabalho e renda - Douglas Mansur

Nesta quarta-feira (7), uma liminar de despejo, que propõe retirar 450 famílias sem-terra do acampamento Quilombo Campo Grande, no Sul de Minas Gerais, foi aprovada pelo juiz Walter Zwicker Esbaille Júnior. Os agricultores estão acampados há duas décadas no município de Campo do Meio-MG, e o terreno ocupado gera trabalho e renda para cerca de 2 mil pessoas.

Se a decisão for confirmada, após esgotamento dos recursos, as famílias têm sete dias para deixar o local.

Em nota, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem terra (MST) afirmou que "é sabido que a veia fascista do projeto eleito ao governo do Brasil vai intensificar o uso de toda máquina do estado para criminalizar e segregar o povo Sem Terra. Assim como o fará nas comunidades urbanas. Mas o povo brasileiro é corajoso e forte. O Movimento enfrentou a ditadura militar desde o nascimento. É com essa história e com essa coragem que as famílias do Quilombo Campo Grande irão resistir e permanecer nas terras de Ariadnópolis. Não vai ser uma liminar de despejo que apagará tantos anos de luta".

Com larga escala de produção agroecológica ou em transição, as famílias produtoras do Café Guaií levaram toneladas de alimentos para acompanhar o julgamento em frente ao Fórum da Comarca de Campos Gerais (MG). A audiência, marcada para 13 horas, começou por volta das 15h40 e contou com mobilização do lado de fora, em defesa da permanência das famílias. O julgamento se estendeu até às 18 horas.


(Fotos: Douglas Mansur)
 

"Vai ser a maior tragédia do Brasil se for despejado um acampamento de mais de 20 anos, que foi ocupado em 18 de março de 1998, e em todo esse tempo não houve o assentamento", analisa Sebastião Melia Marques, da direção regional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) pelo sul de Minas Gerais.

As famílias vivem na área da usina falida Ariadnópolis, da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo (CAPIA), que encerrou suas atividades em 1996, embora ainda possua dívidas trabalhistas que ultrapassam R$ 300 milhões.

"Nós temos hoje uma cooperativa, a marca Café Guaií, que é conhecido em todo o país e fora do Brasil. Então nós temos como apresentar nossa produção e todas as nossas áreas plantadas de café e de outras variedades de alimentos", ressalta Débora Vieira Borges, dirigente estadual do MST pelo sul mineiro.

Segundo levantamento do MST, neste ano, o acampamento Quilombo Campo Grande conta com 40 hectares de horta, 60 mil árvores nativas e 60 mil árvores frutíferas, além da produção de oito toneladas de mel. A safra anual de café chegou a 510 toneladas. As famílias produzem sem o uso de agrotóxicos.

José Maria de Moraes nasceu e cresceu no acampamento Quilombo Campo Grande e, aos 18 anos, trabalhou na Usina Ariadnópolis. O agricultor acampado afirma que não consegue se imaginar em outro lugar: "Eu sempre gostei de trabalhar aqui, porque foi onde nasci e nós temos o direito de nascituro. Acho que juiz nenhum pode banir esse direito". 

Entenda o caso

O Decreto Estadual n.º 365/2015 desapropriava 3.195 hectares da falida Usina Ariadnópolis. O documento tinha como proposta desapropriar a área mediante o pagamento de R$ 66 milhões à CAPIA. Há dois meses, as famílias do Quilombo Campo Grande chegaram a firmar um acordo em que o Estado se comprometia a pagar o valor em cinco parcelas.

Porém, acionistas da empresa, apoiados pela bancada ruralista e latifundiários da região, não aceitaram o acordo e levaram o caso à Justiça contra o governo de Minas Gerais, pedindo anulação do decreto, que já havia sido validado por dois julgamentos.

Através de uma operação jurídica, os empresários retomaram uma liminar de despejo de 2012 referente à falência da usina e estava parada há mais de um ano. Foi justamente essa a liminar aprovada nesta quarta-feira (7).

Cabe recurso, e as famílias prometem recorrer da decisão do juiz.

Edição: Daniel Giovanaz