Opinião

Esperança e luta

A democracia é o caminho, é o regime do debate, da argumentação, da disputa transparente

Belo Horizonte |

Sei que o momento é de perplexidade e angústia, de luta e esperança, de travessia tangenciando o abismo, mas eu ainda confio no bom senso das pessoas. Como artista e cidadão luto pela liberdade, defendo a democracia, luto por meu direito e respeito e o direito de todos, inclusive dos que pensam diferente de mim.

Espero ver a claridade depois da escuridão e a lucidez reinar no meu país.

O ódio que se espalhou pelas ruas e pelas redes sociais me assusta e, como ser humano, me faz ter vergonha de mim.  A violência em qualquer nível é incompatível com a essência da alma humana, embora a humanidade tenha guerreado tanto, tenha cometido tantos equívocos imperdoáveis, vergonhosos e incompreensíveis como a escravidão, holocausto e ditaduras violentas. O momento brasileiro não se compara com tais momentos históricos que envergonham a humanidade, mas pode levar nosso país a um caos imprevisível.

Esse texto nasceu da experiência do silêncio, um processo de dor, reflexão e aprendizado. O silêncio é também um ato de resistência. Silenciar nem sempre é acovardar,  ocultar, ou contribuir para o caos. Silenciosamete caminhei e encontrei caminhantes da resistência. Silênciei em repúdio e desprezo às tagarelices e ruídos midiáticos tendenciosos e parciais.  Percebi que silenciar pode ser um processo meditativo para tentar entender a mediocridade humana.

Se o silêncio é uma forma de repudiar ruídos, o silêncio é também escuta profunda e autêntica de vozes que clamam por justiça.

Na escuta do silêncio eu fui ouvir Paulinho Saturnino Figueiredo, Rafael Patto, João Paulo Cunha, Malu Aires, Tião Rocha, Chico Cesar, Chico Buarque, Leonardo Boff e tantos outros que me inspiram e me fortalecem sem perder a ternura.

A democracia é o caminho. É o regime do debate, da argumentação, da  disputa transparente. O resultado de eleições transparentes deve ser acatado e respeitado, principalmente pelos concorrentes. O respeito às decisões da maioria deve ser sentimento e gesto de quem vive numa sociedade sujeito às regras e às leis democráticas.  Aceitar a derrota não é nenhuma grandeza, é um gesto elementar, é obrigação de quem perde, não aceitá-la é negar um princípio básico da democracia, o voto como direito, é ser pueril, incoerente ou adepto da maldade, é revelar incompetência para administrar uma vitória. Usurpar, conspirar, rasgar as leis, incitar o ódio, ganhar passando por cima das regras, não fazem parte do jogo democrático e o Brasil precisa continuar no caminho da democracia que foi conquistada com muita luta, sofrimento, exílio e muitas mortes.  

Não sou adepto de agressões, sejam elas vindas dos que pensam diferente de mim, ou vindas dos que pensam como eu.  Não há como discutir quando o radicalismo e o ódio imperam. Fica difícil o diálogo se não abaixarem as armas. Impossível controlar uma multidão quando é extrapolado o limite da convivência, do diálogo e do respeito.

Os falsos líderes, os reacionários, os pregadores do rompimento democrático, adoram ver o “trem” pegar fogo, não são capazes de jogar uma gota d’água no incêndio e se puderem ateiam gasolina na fogueira, não esperam o tempo regulamentar, dão golpe baixo, distorcem informações, fazem joguinhos de apostas e brincam com coisas tão sérias. São manipuladores do sentimento coletivo, farsantes, sabem que são desonestos, mas para fugirem dos tribunais e continuarem impunes entregam os honestos.

Ainda que o impeachment seja previsto na constituição brasileira, ele só pode ser aplicado se houver crime de responsabilidade praticado pelo Presidente da República. Como no caso atual não há crime  de responsabilidade da Presidenta, quem pensa diferente que me desculpe, mas impeachment é golpe.

*Rubinho do Vale é cantor e compositor.

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