Minas Gerais

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Grafite é atração especial de nova trincheira de Contagem

Obra foi pintada por artistas da cidade antes de ser entregue e conta, a partir da arte, história do município

Belo Horizonte |
Primeira grande mobilização sindical do Brasil e mulheres negras são assuntos dos desenhos
Primeira grande mobilização sindical do Brasil e mulheres negras são assuntos dos desenhos - Arquivo Pessoal / Krol

Inaugurada em Contagem no dia 19 de agosto, a Trincheira do Itaú chama a atenção de quem passa por lá. Ao contrário do que acontece em outras obras, tomadas por grafites e pixos após a abertura, a construção teve a linguagem da rua impressa antes de ser entregue ao público. 
A ideia foi do grafiteiro Luís Otávio, mais conhecido como “World”, que apresentou a proposta para a prefeitura. Assim, como parte da decoração, a trincheira foi preenchida com grafites que contam a história do município e revelam diferentes estilos dos artistas da região.  
De um lado, uma parede foi usada para retratar desde a chegada da Coroa Portuguesa na cidade até os dias de hoje. Do outro, 406 metros foram dedicados à criatividade dos grafiteiros, que tiveram liberdade para desenhar. 
A ideia de desenvolver a cronologia de Contagem também veio de Luís. “Moro aqui desde que nasci e minha família também. Eu lembro do meu avô, que era mestre de obra, me contanto curiosidades sobre as coisas de antigamente”, rememora. Mais três grafiteiros participaram dessa etapa da pintura, Jeferson Atos, Tot e Guilherme Maisena, todos contagenses. “A história está gravada na gente”, ressalta World. 
Uma das imagens representadas narra a primeira grande mobilização sindical do Brasil. Iniciada pelos metalúrgicos da cidade na época da ditadura, em 1968, o momento foi primordial para a luta da classe trabalhadora no país. Uma grande greve parou a produção de diversas empresas e envolveu 20 mil funcionários. Apesar da repressão, o movimento foi vitorioso e conquistou o reajuste salarial. “Mesmo que os cidadãos não saibam nada sobre esse acontecimento, surge o interesse. A arte na trincheira também auxilia na cidadania, no conhecimento da própria origem”, afirma o grafiteiro. 

Intervenção que transforma
O muro dedicado à expressão livre contou com a participação de 50 artistas. World conta que foram selecionadas também pessoas especialistas no “grapixo”, tipo de trabalho que mistura o grafite com a pichação, para que “estivessem presentes todas as classes que estão lado a lado na ‘hierarquia da rua’”.
Carolina Jaued, a grafiteira Krol, participou do projeto com um desenho sobre aceitação do cabelo. Após um sábado inteiro dedicado à arte, deu vida a uma mulher que, além de possuir um poderoso penteado afro, portava na blusa dizeres sobre a importância da transição. Para ela, a localização do desenho pode ajudar muitas meninas que ainda não se libertaram do alisamento. “Ainda quando eu estava pintando apareceu uma garota que se identificou, disse que já havia sofrido com isso. Achei muito legal”, diz a artista, que também é integrante do grupo Minas de Minas. O grafiteiro Henrique Zailan também retratou uma mulher negra e acredita que a iniciativa auxilia na diminuição da barreira que a sociedade tem com a arte de rua.
A opinião é respaldada pela moradora do bairro Eldorado Maria Angélica Gori, que revelou conhecer agora um pouco mais da cidade em que vive. Além disso, ela considera que adicionar uma expressão artística marginalizada como “decoração oficial” de um município é importante para a valorização da prática.

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