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Faye Ndiaga traz Senegal ao Brasil por meio do artesanato

Confecções do imigrante senegalês fazem sucesso com o público brasileiro

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Faye é um dos 16.622 estrangeiros que trabalham no Paraná
Faye é um dos 16.622 estrangeiros que trabalham no Paraná - Carolina Goetten

Talvez seja a condição de imigrante senegalês, ou um reflexo externo de sua personalidade interior, mas antes mesmo de Faye Ndiaga confessar a timidez essa sua natureza se revela por conta própria. Leva um tempo de conversa até que abra o sorriso largo de dentes brancos, expressando a simpatia que vive em seu lado de dentro. Mas o riso logo vem, depois de alguns momentos; e quando Faye ri, não há quem não perceba que a sala inteira se torna mais alegre.

Ele é um dos 16.622 estrangeiros que trabalham no Paraná. Chegou Brasil oito anos atrás, trazendo o francês como único idioma. Mas Faye não veio só em busca de oportunidade: tinha vontade de viver aqui. Ou desejo, na palavra do nosso dicionário que ele escolheu para definir o motivo de vir e ser nosso vizinho. De início, ao desembarcar, a comunicação foi difícil, mas hoje o senegalês se comunica com mais fluência. É entre frases curtas e vocabulário reunido com esforço que ele conta sua história.

Nas últimas semanas, Faye aumentou a carga e o tempo de trabalho. Tudo porque precisa retornar a Senegal e visitar a filha mais nova, que sofreu um acidente. Um bazar foi organizado para ajudá-lo na empreitada de bancar a viagem: são peças de roupa coloridas e tipicamente africanas, bijouterias, máscaras étnicas e artesanato que fazem sucesso por onde passa.

Faye já morou em Fortaleza, no Rio de Janeiro, em Francisco Beltrão, Cascavel, Londrina e no Rio Grande do Sul, até onde pôde recordar. “Tenho um caminho junto aos professores paranaenses, que ficaram muito amigos meus”, diz.  Participou de diversas edições estaduais da Conferência Nacional de Educação (Conae), aonde levava suas peças e montava um espaço para expor e vender. “Muitos gostam de comprar as minhas máscaras para utilizá-las nas aulas e contar histórias da África”, revela o artista. No Brasil, a Lei 10.639/03 prevê a obrigatoriedade do ensino de história e cultura africana e afro-brasileira no currículo da educação básica, mas a abordagem do assunto ainda depende da iniciativa individual dos professores.

Da estofaria à arte da costura             

Em Senegal, Faye profissionalizou-se como estofador, ofício que o levou à arte da costura e ao sucesso como estilista. “Lá é diferente do Brasil: aprendemos todas as etapas para estofar um sofá, desde as lições de marcenaria”, explica. O curso no país de origem não lhe custou nada financeiramente e, como recompensa pelo aprendizado, enquanto vivia na África, ensinou a mais de 30 pessoas o ofício que aprendeu. “Eu sinto que preciso fazer algo pelo mundo. Isso me faz feliz”, comenta. No Brasil, mantém a prática de agir na sociedade: tem uma sacola de roupas reservadas especialmente para emprestar a quem precisa delas em apresentações artísticas, e vez ou outra doa peças para que as pessoas possam revendê-las e levantar algum dinheiro.

Os trajes são costuradas com um tecido de algodão enviado por amigos e familiares de Senegal. Indica os cuidados necessários e destaca que as peças não devem ser lavadas com muita frequência. “Se a roupa ficou com o cheiro do corpo, ele sai do algodão de forma natural após alguns dias”, ensina. É também naturalmente que preserva sua saúde: não toma remédios industriais há muitos anos. “O corpo fala com o ser humano. Nós somos fortes, e uma alimentação saudável é capaz de prevenir doenças”, diz o senegalês, que em seus passos pelo Brasil coloca em prática uma profunda troca cultural entre continentes que interagem há séculos, mas que ainda hoje encaram a desigualdade racista que já passou da hora de ser superada.

Edição: Ednubia Ghisi