Novos fundamentos

“É preciso refundar o Brasil”, defende Boff em novo livro

Publicação foi lançada na 17ª Jornada da Agroecologia que acontece em Curitiba (PR)

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |

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Teólogo também participou da conferência de abertura da 17ª Jornada de Agroecologia no Teatro Guaíra
Teólogo também participou da conferência de abertura da 17ª Jornada de Agroecologia no Teatro Guaíra - Giorgia Prates

Já são mais de cem livros escritos pelo filósofo e teólogo Leonardo Boff, uma das maiores autoridades em temas como sustentabilidade, ecologia e justiça social. A sua mais nova obra, “Concluir a refundação ou prolongar a dependência?", foi lançada em Curitiba (PR), durante a abertura da 17ª Jornada da Agroecologia, no Teatro Guaíra. Em entrevista exclusiva para o Brasil de Fato, ele falou sobre a atual conjuntura e as questões colocadas no livro, que vão desde a crítica necessária à esquerda até chegar a atual conjuntura. Ele defende uma refundação ao Brasil, em novas bases como a natureza, a cultura e o povo brasileiro

 O livro traz duas questões bastante importantes para nossa atual conjuntura: refundar o Brasil ou prolongar a dependência. Quais foram as suas reflexões para chegar a elas?

São exatamente os dois projetos que estão em curso: aqueles que deram o golpe querem prolongar a dependência, que antes era de Portugal, Espanha e da Inglaterra e agora dos Estados Unidos. Eles não tem um projeto de Brasil, tem um projeto para eles garantirem privilégios. A alternativa que os movimentos sociais, partidos e os grupos progressistas tem é de refundar o Brasil. Ele nunca foi refundado, ele sempre foi uma colônia. E a estratégia atual é que querem recolonizar toda a  América Latina, fazê-la  exportadora de comodittes, grãos, água, minérios para os países centrais.

De que forma a crise desperta a reflexão para um novo projeto de país?

O momento de crise como o nosso é momento de repensar os fundamentos da nossa sociedade e fechar o ciclo da Casa Grande. Os grandes endinheirados deram o golpe.  Ficou claro até pela investigação feita pelo próprio Senado que Dilma não tinha nada a ver com as tais pedaladas fiscais. Foi golpe que vem promovendo uma crise profunda. Estamos  nessa disputa nos questionando sobre qual projeto deve prevalecer. Somos contra o projeto reacionário, anti-popular, anti-nacional. Mas perdemos quando quisemos conquistar o poder para fazer transformação.  Entramos novamente no ciclo da Casa Grande, que precisa ser superado.

O que seria a refundar o Brasil?

Refundar o Brasil é buscar novos fundamentos. O primeiro é a nossa natureza, uma riqueza mundial, as maiores florestas úmidas estão aqui, potência em água, maior biodiversidade, temos milhões de hectares férteis que poderiam matar a fome e a sede com mesa posta para todos.

O segundo fundamento é a cultura brasileira, que é riquíssima. Mas falo do modo do povo viver. Preconceitos e ódio não são da tradição do povo, mas vem das classes dominantes, que transmitiram o ódio que tinham dos escravos e repassaram aos pobres. E, apesar de tudo temos essa cultura popular alegre, criadora, inventiva que é capaz nos levar a nova travessia.

O terceiro ponto é o povo brasileiro, que é a maior riqueza do Brasil. Eles construíram tudo o que temos e foram explorados durante toda nossa história pela elite brasileira.

Muitas vezes o tema da natureza e da agroecologia são esquecidos como possibilidades de projetar o futuro de um país.

83% da população vive na cidades e muitos não conhecem o campo. É urgente unir campo e cidade. É do campo o alimento limpo, saudável, sem veneno. A agroecologia é o que mais dará futuro para a humanidade porque nós queremos viver bem. Ninguém come computador, automóvel, ninguém se alimenta destes aparatos. A natureza é a nossa grande Mãe, que nos dá tudo o que precisamos. Nós pertencemos a natureza, somos parte e precisamos cuidar dela. E o homem urbano precisa ganhar esta consciência que ele também é filho da terra.

Edição: Laís Melo