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Folclore e política

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Dia 22 de agosto marca a celebração do "Dia do Folclore"
Dia 22 de agosto marca a celebração do "Dia do Folclore" - Wikimedia Commons
O Rui foi se desenvolvendo tanto no conhecimento do folclore quanto no político

Todo mês de agosto, quando vai chegando o dia 22, data oficializada como “Dia do Folclore”, eu me lembro do Rui e do meu amigo Tião Livrinho.

O Tião Livrinho tinha esse apelido porque andava sempre com um livrinho debaixo do braço. Era o “Manifesto Comunista”. 

Militante do Partido Comunista Brasileiro, onde ia ele dava um jeito de fazer a cabeça de alguém. E o “Manifesto Comunista” tinha presença garantida nos seus discursos. 

Foi o primeiro comunista que conheci. Era mineiro, como eu, e trabalhava no supermercado que foi meu primeiro emprego em São Paulo, quando eu tinha dezesseis anos de idade. 

Veio o golpe de 1964 e o Tião teve que sumir uns tempos, para não ser preso. 

Alguns anos depois fiquei sabendo que ele tinha se tornado folclorista e dava cursos sobre a cultura popular brasileira, aproveitando para mexer com a consciência política de seus alunos e dos grupos folclóricos com que se relacionava. 

Um amigo meu, o Rui, engenheiro, foi fazer um curso na Escola de Folclore que tinha no Ibirapuera e lá foi aluno do Tião Livrinho, meu velho amigo. 

E o Rui foi se desenvolvendo tanto no conhecimento do folclore quanto no de conhecimento político. E aproveitava para conciliar as duas coisas.

Naquela época não existia secretária eletrônica, nem rádio despertador, nada disso. E o Rui inventou uma coisa para acordar já com sentimento revolucionário: adaptou um despertador daqueles antigos a um gravador, e gravou uma fita especial para ser acordado com mensagens folclóricas e ao mesmo tempo revolucionárias.

Na hora de despertar, em vez de tocar a campainha do despertador, uma pecinha inventada pelo Rui ligava o gravador. 

Aí vinha o som gravado: galo cantando, bois mugindo, cachorro latindo, cabrito berrando, cavalo relinchando e porteira batendo, como se fosse o amanhecer na roça, e no meio disso tudo vinha a voz dele falando bem alto: “Acorda, gordo, vai trabaiá pra fazê a Revolução”.

Eu morava na mesma república que ele e, no quarto ao lado, acordava mais cedo do que precisava, por causa da invenção dele. Mas não me incomodava, ao contrário, me divertia, caía na risada. 

Edição: Júlia Rohden