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PAPO ESPORTIVO | Ronaldinho Gaúcho e o apoio à extrema direita

Apoio a Bolsonaro pode tirar Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo de eventos do Barcelona

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Ronaldinho Gaúcho faz parte do Barça Legends, time de veteranos do Barcelona
Ronaldinho Gaúcho faz parte do Barça Legends, time de veteranos do Barcelona - Bruno Cantini / Atlético-MG
Apoio a Bolsonaro pode tirar Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo de eventos do Barcelona

Certa vez eu disse aqui no Brasil de Fato que futebol e política se misturam sim ao comentar as palavras do jornalista Thiago Leifert, da TV Globo. Num ambiente democrático (pelo menos em tese), cada um pode se manifestar como bem entende desde que não desrespeite nenhum indivíduo ou grupo de indivíduos. E o assunto da semana nesse cenário “político-futebolístico” é a declaração pública de apoio de Ronaldinho Gaúcho ao candidato à presidência Jair Bolsonaro, conhecido pelas declarações homofóbicas, sexistas e racistas. O pentacampeão mundial utilizou as suas redes sociais para manifestar suas ideias.

Ronaldinho Gaúcho atualmente faz parte do Barça Legends, time de veteranos do Barcelona, onde participa de eventos em todo o mundo como representante do clube catalão. Não é exagero lembrar que foi lá que RG10 conquistou o prêmio de melhor jogador do mundo por dois anos consecutivos e se transformou num dos melhores atletas da sua geração. Além de Ronaldinho Gaúcho, outro pentacampeão também manifestou apoio público a Jair Bolsonaro. Trata-se de Rivaldo, jogador que também conquistou o prêmio de melhor do mundo jogando pela equipe blaugrana. Ele também faz parte do Barça Legends.

Mas o ponto aqui é outro. De acordo com o diário “Sport” (jornal da Catalunha), a diretoria do Barcelona não teria ficado nem um pouco satisfeita com o apoio de Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo ao candidato da extrema-direita. De acordo com a notícia, o clube, inclusive, estuda a possibilidade de diminuir a participação dos dois brasileiros nos próximos eventos. Em comunicado feito pelo porta-voz Josep Vives, o clube catalão disse respeitar o pensamento de todos, mesmo sem concordar com algumas ideias defendidas pelo ex-jogador brasileiro:

"No Barça, defendemos valores democráticos que não coincidem com algumas ideias que temos escutado sobre esse candidato. Nós, como democratas, respeitamos a todos. Neste caso, respeitamos a opinião de Ronaldinho. Não compartilhamos de muitas destas ideias, mas respeitamos a liberdade de pensamento. (…) Vamos observar cuidadosamente a evolução do caso Ronaldinho e tomaremos uma decisão. Agora, não há nenhuma decisão tomada, mas seguiremos atentos, porque estamos preocupados sobre como isso pode afetar a imagem do clube", disse o clube em nota.

Democracia

Para entender essa postura do Barcelona, é preciso voltar no tempo e compreender a relação com o clube catalão com o Real Madrid. Durante a ditadura de Francisco Franco na Espanha, o Real Madrid não tinha nem 10% da força que possui atualmente e contou com a “condescendência” e “boa vontade” do governo durante os anos 1950 e 1960 para se transformar no gigante que é hoje. Ao mesmo tempo, Franco desejava tirar o poder do Barcelona e do Athletic Bilbao, maiores clubes do país naqueles tempos e símbolos da Catalunha e do País Basco, ambas regiões separatistas. Alguns historiadores contam que o ditador tolerava as manifestações políticas dentro dos estádios “por ser mais fácil controlar os manifestantes reunidos em um estádio de futebol do que espalhados pelas ruas”. Além disso, o Real Madrid também teria recebido ajuda do governo central para construir seu estádio em 1947, o Santiago Bernabéu, nome do presidente do clube na época e ex-soldado franquista. A polêmica venda da lenda Alfredo Di Stéfano para o clube merengue em 1953 também acirrou a rivalidade com o Barcelona.

Voltando a Ronaldinho Gaúcho, a tendência (pelo menos diante do que foi apurado) é que o brasileiro fique mais afastado dos principais eventos do Barça Legends para, aos poucos, ter sua imagem desvinculada do clube catalão. A mesma medida deve ser tomada com relação a Rivaldo apesar do comunicado oficial que afirma respeitar o pensamento, a ideologia política e a liberdade de expressão de cada um. Por outro lado, fontes de dentro do Barcelona colocam que a alta cúpula do clube anda bem preocupada com o voto explícito a Jair Bolsonaro, candidato conhecido pelas posições totalitárias contra a defesa dos Direitos Humanos, independentemente do que acabará sendo sua ação governamental.

Certo é que esse assunto não vai acabar no dia 28 de outubro. E certo é que todo pensamento que desrespeite o próximo deve ser combatido. Não censuro Ronaldinho Gaúcho ou Rivaldo. Apenas gostaria de entender os motivos que os levaram a apoiar um candidato que vai de encontro aos valores defendidos pelos dois ao longo das suas carreiras. Ao mesmo tempo, a relação de clubes com patrocinadores “questionáveis” anda cada vez mais estranha. Ou será que eu fui o único a estranhar a realização de dois amistosos da Seleção Brasileira na Arábia Saudita, país conhecido por sua repressão à oposição e às minorias e o apoio a grupos terroristas? Basta abrir a carteira que as portas se abrem. Mesmo que isso resulte em fechar os olhos para violações e mais violações dos Direitos Humanos.

Ronaldinho Gaúcho e Rivaldo fizeram este colunista sorrir muitas vezes. Já não posso falar a mesma coisa depois dessa declaração pública. Vida que segue.

Aquele abraço e até a próxima.

Edição: Brasil de Fato (RJ)