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Por que os rastafari praticam agroecologia?

Na maior favela de Belo Horizonte, o coletivo Roots Ativa tem como um de seus focos a agroecologia urbana

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Coletivo Roots Ativa trabalha na recuperação de uma área degrada no Aglomerado da Serra, a maior favela da capital mineira
Coletivo Roots Ativa trabalha na recuperação de uma área degrada no Aglomerado da Serra, a maior favela da capital mineira - Vitor Taveira
Na maior favela de Belo Horizonte, o coletivo Roots Ativa tem como um de seus focos a agroecologia urbana

Com mais de 40 mil habitantes, o Aglomerado da Serra é considerada a maior favela de Belo Horizonte. É lá no alto da Vila de Nossa Senhora de Fátima, uma de suas localidades, subindo ruas e escadas, que se encontra uma experiência que une agroecologia urbana e cultura rastafari.

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Criado em 2006, o coletivo Roots Ativa surgiu para difundir a cultura rastafari. Alguns integrantes foram morar em outras partes do Brasil e estabeleceram núcleos locais. Na capital mineira, o grupo criou uma sede própria há 10 anos em Aglomerado da Serra, como explica Thiago Lopes, um de seus integrantes.

“A gente já tinha essa parte com a cultura e tinha essa necessidade tanto de moradia como de espaço para desenvolver nossa cultura, nossa forma de alimentar, nossa forma de viver e aí que na Serra a gente encontrou esse espaço”, diz. 

Dentro da cultura, espiritualidade e filosofia rastafari, o alimento é uma parte fundamental não só para o corpo mas também para a alma. Ou seja: quanto mais natural, melhor. Thiago conta que a dieta rastafari, chamada de “ital”, refuta alimentos geneticamente modificados, que usem insumos químicos ou ultraprocessados.

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“O rastafari tem uma cosmovisão, uma visão ampla quando fala de alimentação. Fala de cuidar do nosso corpo, que é nosso templo, que é onde tem que começar nosso primeiro cuidado. A gente vê que é necessário um cuidado com o que a gente tá ingerindo, com esse alimento que é cheio de agrotóxico. Então isso tá intrinsecamente ligado no nosso modo de viver, de forma que a gente respeita o meio ambiente, respeita a natureza”, explica.

A sede do coletivo está localizada nas bordas de uma área de proteção ambiental. Lá, o grupo está recuperando um espaço degradado, antes tomado por braquiária, espécie de capim nocivo para diversas plantas e arbustos. Além disso, há o desenvolvimento de um sistema agroflorestal, conciliando produção de alimentos com preservação de espécies nativas. O local, no sul de BH e com vista panorâmica de quase toda cidade, também possui uma horta e um viveiro. Thiago fala da diversidade da plantação cultivada no local. "Tem copaíba, tem banana, tem abacate, tem alface, couve, cebolinha, salsinha, taioba, manjericão, cavalinha, tem muita coisa aí, tem pé e limão, de manga". 

O músico Lucas Rasta, de 27 anos, é um dos jovens que se aproximou da agroecologia a partir do Roots Ativa. Ele conta da experiência vivida no coletivo. “Não sabia plantar, não sabia germinar semente, não sabia que podia plantar tudo junto, não comia muita comida viva, comida mais cozida. Graças ao coletivo eu aprendi muito, fui uma das pessoas que foi formada aqui. Não tinha muito conhecimento, até de experiência de vida mesmo, agroecologia. Aqui foi base pra mim”.

Com cerca de dez pessoas no grupo formado em Belo Horizonte, com maioria de jovens entre 17 e 25 anos, o Roots Ativa atua com foco em três frentes. Na Cozinha Criativa realiza a produção de alimentos integrais e vegetarianos, comercializados em feiras.

Por meio do Vida Composta, realiza a coleta de resíduos orgânicos de cerca de 30 famílias da comunidade, que são transformados em adubo que nutre a terra, fortalece a produção de alimentos e gera renda ao vender mudas e de fertilizantes naturais. Um terceiro eixo é o projeto Preta Linda Sou, focado na valorização da mulher negra e periférica.

No ano em que completa 10 anos em Aglomerado da Serra, o Roots Ativa vem dedicando esforços numa campanha de financiamento coletivo para poder melhorar a infraestrutura do local. O link para doação é: www.evoe.cc/rootsativa.

A meta é criar uma estrutura permanente para realização de aulas e oficinas para o público infanto-juvenil, junto com um espaço voltado para o empoderamento feminino e beleza negra. Dentro do projeto pretende-se ainda realizar a construção de uma farmácia popular e natural com ervas da própria horta local.

Entre as recompensas para quem colaborar estão mudas de ervas naturais, granola artesanal, oficinas de compostagem e minhocário doméstico, e outros.

Thiago explica que apesar de estar num local mais isolado, que permite certa tranquilidade no meio do caos urbano, o Roots Ativa participa de várias redes como a AMAU, Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana, e a Rede Terra Viva, que promove a economia solidária. “Estamos nos articulando em torno de um mundo melhor, de uma cidade mais justa, que a gente acredita”, finaliza.

Edição: Guilherme Henrique