Saúde

Trabalhadores do Samu criticam "realocação" e temem extinção do serviço em São Paulo

Fechamento das 58 bases do serviço foi publicado no Diário Oficial do Município (DOM) no dia 23 de fevereiro

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Entre situações que o Samu não atende, o site do Ministério da Saúde destaca os casos que não caracterizem urgência ou emergência médica
Entre situações que o Samu não atende, o site do Ministério da Saúde destaca os casos que não caracterizem urgência ou emergência médica - Foto: Prefeitura de João Pessoa (PB)

Trabalhadores do Serviço de Atendimento Móvel Ambulatorial (Samu) 192 estão insatisfeitos com a "realocação" de espaço das unidades, iniciada esta semana em São Paulo (SP). O fechamento das 58 bases do serviço foi publicada no Diário Oficial do Município (DOM) no dia 23, com acréscimos na última terça-feira (26). De acordo com a Secretaria de Saúde da Prefeitura, trata-se de uma nova etapa do processo de “descentralização” do atendimento, iniciado em 2017.

Para um condutor do Samu ouvido pela reportagem do Saúde Popular, que pediu para não ser identificado, a “realocação” de equipes de 58 bases do serviço poderá significar a extinção do programa federal. “Acho que estão querendo acabar com o Samu, para chegar num ponto de terceirização”, lamentou.

Outra funcionária do Samu, que também teme por retaliações, acrescentou que há uma sistemática redução do número de funcionários. “Estamos perdendo a essência para o qual o serviço foi criado. No ano passado, perdemos 200 profissionais tecnicamente aptos e treinados para o Samu. Este ano mais 40 saíram do serviço, sem reposição de recursos humanos”, informou.

A Prefeitura não respondeu se o intuito da mudança está associado à economia de gastos e informou que a realocação das equipes “ampliará a cobertura assistencial para 78 pontos de apoio” e “vai gerar sinergias entre as equipes do Samu e das unidades assistenciais, qualificando ainda mais o atendimento, proporcionando ganhos aos usuários”. No entanto, uma técnica de enfermagem da região Norte admitiu estar temerosa quanto ao futuro: “Ampliar pontos não significa ampliar equipes. Está havendo uma redistribuição de equipes. Desta forma, o futuro do serviço é incerto”.

Somente as bases da marginal Pinheiros, 23 de maio e integradas ao Corpo de Bombeiros permanecerão no mesmo local, como “as estrategicamente localizadas em pontos de rápido acesso a vias de grande circulação”, diz a nota da Secretaria de Saúde.

“O decreto é uma enganação. A cobertura territorial para o atendimento do Samu será extremamente prejudicada nas disposições de base, que se dizem estratégicas. É uma falácia. A região Norte haverá 8 equipes na mesma rua, onde estrategicamente aumenta o tempo-resposta e, consequentemente, gerando prejuízo em atendimento para a população”, defende a técnica de enfermagem.

Perímetro

O portal do Ministério da Saúde destaca que “as ambulâncias do SAMU 192 são distribuídas estrategicamente, de modo a otimizar o tempo-resposta entre os chamados da população e o encaminhamento aos serviços hospitalares de referência”.

Representante da Comissão de Saúde da Câmara Municipal de São Paulo, a vereadora Juliana Cardoso (PT-SP) avalia que as mudanças prejudicarão muito o atendimento. “Retirar [as bases do] Samu da onde ele já está fixo [baseado] para levar para um hospital é um erro. Eu ouso até dizer que é para poder matar mais pessoas. Porque como você retira [um serviço] que já está estrategicamente pensado [em locais com volume maior de acidentes] para garantir atendimento rápido e salvar vidas?”.

Outro ponto incongruente entre o que estabelece o programa federal e as novas orientações do decreto é que o Samu “não irá somente ‘levar’ os pacientes, mas sim irá ‘buscar’ o paciente para o atendimento no ponto de atenção mais adequado às suas necessidades”.

"Eficiência"

A Prefeitura sustenta em nota que “a descentralização e a integração das equipes têm ainda como objetivo melhorar a eficiência gerencial e administrativa”. Ao contrário do que pontuou a vereadora Juliana Cardoso (PT) junto ao secretário de Saúde, Edson Aparecido, sobre uma ausência de preparação dos espaços para a mudança, a Prefeitura assinala em nota que houve planejamento "para aprimorar o aproveitamento dos recursos humanos e materiais do Samu".

Outro ponto criticado pelos trabalhadores é a falta de estrutura dos espaços. “Eles estão falando em integração do Samu com a rede de saúde, hospitais, UPAs, AMAs, e estão tirando a gente dessas bases, falam que acabou o contrato, e alocando a gente em hospitais, UPA, AMA, só que os locais são precários. As nossas coordenações já estão dizendo que a gente tem que estar nas bases dias 25, mas não têm instalação, não tem nada, não tem como ficar naquele local. Eles colocaram uma base do Campo Limpo, debaixo do Hospital Campo Limpo, no estacionamento”, relata o condutor de ambulância Samu.

Atualmente, as equipes do Samu dispõem de uma área de descanso com camas, banheiro com chuveiro, sala de TV, copa, além de áreas específicas para esterilização dos equipamentos utilizados nas ambulâncias como macas e respiradores.

Protesto

Insatisfeitos, vários trabalhadores do Samu têm se somando a outras categorias de servidores municipais de São Paulo em greve pela revogação da Lei 17020/18 do Sampaprev – que estabelece mudanças na previdência municipal – e descontos nos salários de quem está parado.

A vereadora Juliana Cardoso (PT) reforça que a unidade dos trabalhadores é fundamental para barrar o que ela chama de “desmonte” e “eliminação de marcas da gestão petista”.

“O Samu já vem sofrendo ataques desde a mudança de governo, com o [Michel] Temer [MDB] efetivamente começou essa forma de reorganização federal do Samu. No município, eles [João Doria (PSDB) e Bruno Covas (PSDB)] anunciavam que iriam mudar, mas não efetivava porque tinha uma resistência muito grande dos próprios profissionais. Não temos ainda um olhar do plano que eles irão fazer, mas normalmente quando se mexe num serviço, para esse governo que quer fazer cortes, é fechamento”, avalia a vereadora.

A parlamentar irá propor no Legislativo uma audiência pública para que o governo explique os investimentos e ameaças de fechamentos de serviços, como o Samu.

Edição: Daniel Giovanaz