Paraná

DITADURA NUNCA MAIS

Em memória dos que não tiveram tempo para ter medo

"Não há nada a se comemorar em 31 de março. O que precisamos é fazer memória daqueles que lutaram contra a ditadura"

Brasil de Fato I Ponta Grossa (PR) |
 Consideramos de extrema importância manter viva a memória dessa página infeliz e cruel da nossa história
Consideramos de extrema importância manter viva a memória dessa página infeliz e cruel da nossa história - Pedro Carrano

“Parcela expressiva dos depoimentos de presos políticos e das demais informações inseridas nos processos judiciais foi obtida com o uso da tortura e outros meios ilícitos e não pode ser considerada como absoluta expressão da verdade”.

Esse é o alerta do site Brasil Nunca Mais (Digital) para aqueles que fazem buscas por documentos relacionados à ditadura militar nos arquivos disponibilizados pela plataforma. Os documentos referem-se à mais ampla pesquisa realizada no país sobre tortura política na ditadura militar (1964-1985) e foi uma iniciativa do Conselho Mundial de Igrejas e da Arquidiocese de São Paulo.

Passados 55 anos do golpe militar deflagrado em 31 de março de 1964, o presidente da República, Jair Bolsonaro, determinou que os militares comemorem o golpe. Em tempos em que avançam os apelos ditatoriais e os revisionismos parecem tomar conta de parte da sociedade, consideramos de extrema importância manter viva a memória dessa página infeliz e cruel da nossa história.

Hoje, muitos arquivos sobre a ditadura estão disponíveis para consulta, estudos, pesquisas. Nesses arquivos, se encontram milhões de documentos, até então secretos ou sigilosos, em sua maioria digitalizados, que atestam os atos cometidos nos anos de chumbo, no país, com detalhes sobre os Inquéritos Policiais Militares, depoimentos, prisões, torturas, assassinatos, desaparecimentos, censura à mídia, aos artistas, aos atores, aos livros, às músicas, dentre outros.

Esses arquivos são facilmente encontrados na internet. Dentre eles, podemos citar: Brasil Nunca Mais (BNM Digital); Documentos Revelados; Arquivos Públicos Estaduais (vários Estados brasileiros possuem seus arquivos sobre a ditadura militar digitalizados e disponíveis para pesquisa); Comissão Nacional da Verdade (Laudos, relatórios, vídeos); Comissões Estaduais da Verdade, além de inúmeras pesquisas acadêmicas.

Todo o esforço em manter viva a memória da repressão, perseguição e censura é fundamental para que não se silencie a luta daqueles que enfrentaram a ditadura em defesa da redemocratização do país. Se hoje é possível vivermos num país democrático, com todos os limites que a democracia ainda tem, devemos a essas pessoas que carregam as marcas da tortura ou pagaram com a própria vida.

A valorização da memória daqueles que lutaram contra a ditadura e pela redemocratização é tarefa para todos que acreditam na democracia como caminho de participação popular e de transformação social. É necessário falar sobre a ditadura e suas graves violações dos direitos humanos. É necessário falar da fragilidade da democracia frente ao autoritarismo militar, falar sobre os riscos que a democracia corre com a chegada ao poder de pessoas que defendem a ditadura e exaltam a comemoração de golpes militares. Falar da afronta à memória daqueles que foram mortos, torturados, presos, cassados, perseguidos. É necessário falar da desigualdade social que se agravou nesse período e que, por vezes é um tema esquecido quando se refere aos anos de chumbo.

Essa determinação do Presidente da República é parte de um projeto de governo que é um misto de neoliberalismo, conservadorismo e militarismo. Bolsonaro e sua equipe econômica não escondem o liquidacionismo das riquezas nacionais por meio das privatizações de estatais, estratégicas para o país, como Eletrobrás, Petrobrás, poços de petróleo do pré-sal, bancos públicos, dentre outras. Em recente viagem aos EUA deixou explícita sua subserviência aos estadunidenses, entregando a base de Alcântara e reforçando que fará as privatizações.

Um governo ataca frontalmente os direitos dos trabalhadores e parece querer atacar os direitos à liberdade do cidadão e à democracia. Trata-se de um governo à deriva. Sua aprovação cai a cada dia entre sua base de apoio. O desemprego aumenta, assim como aumenta o número de pessoas abaixo da linha da pobreza no país.

Não há nada a se comemorar em 31 de março. O que precisamos é fazer memória daqueles que lutaram contra a ditadura, pela redemocratização do país e repudiar ditaduras e ditadores. Esses brasileiros conquistaram a duras penas a volta da democracia, e hoje, nossa voz e nossa luta são legítimas.

É importante que falemos agora, para darmos voz àqueles que foram silenciados na ditadura e, para que, nossa voz continue a ecoar por justiça, democracia e participação popular. Em tempos ditatoriais, em que falar, pensar e lutar por direitos e por transformação social era considerado um ato criminoso, milhares de brasileiros não se calaram. Que em 31 de março e em todos os dias do ano, façamos memória daqueles que não tiveram tempo de ter medo e foram à luta.


 


 


 

 

Edição: Pedro Carrano