COMIDA SEM VENENO

Sociedade civil se organiza em defesa de feira do MST no Parque da Água Branca

Abaixo-assinado foi criado e já conta com quase 10 mil assinaturas; Moradores da região defendem produção dos sem-terra

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Em 2018, foram vendidas 420 toneladas de alimentos agroecológicos
Em 2018, foram vendidas 420 toneladas de alimentos agroecológicos - (Foto: Joka Madruga)

A decisão do governador João Doria de proibir a realização da 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária no Parque da Água Branca, localizado na zona oeste da cidade de São Paulo, não agradou os moradores da região. Um abaixo-assinado online pedindo que o governo do PSDB reveja a decisão foi criado na última segunda-feira (8) e já conta com quase 10 mil assinaturas. 

A petição argumenta que a feira organizada pelos Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) se consolidou como um dos principais eventos públicos de São Paulo e que merece um local adequado para acontecer. 

:: Queremos a feira de orgânicos do MST no Parque da Água Branca! ::

Haroldo Ceravolo, morador de Perdizes e criador do abaixo-assinado, afirma que as edições anteriores da feira foram muito bem recebidas. Os números comprovam: No ano passado aproximadamente 260 mil pessoas passaram pelo parque, onde foram vendidas 420 toneladas de alimentos e 1,5 mil produtos diferentes.

“São Paulo tem poucos espaços ligados à agricultura familiar e alimentação sem ou com menos agrotóxicos. Essa feira organizada pelo MST se tornou rapidamente uma referência nesse espaço. Muitos dos meus vizinhos de bairro que frequentam o Parque da Água Branca gostariam que ela se repetisse lá”, diz Ceravolo. 

A professora Bianca Adami Romero também compareceu às três edições da Feira e defende que ela aconteça no Parque da Água Branca por ser um evento de interesse público. Entusiasmada, ela elogia a qualidade e pluralidade dos produtos agroecológicos do MST. 

“Todas as vezes escolhi escolher uma coisa que eu gosto muito e que é difícil comer aqui em São Paulo. Comi maniçoba, acarajé, coisas gostosas de Goiânia. Foi muito legal. Além de fazer a compra anual de grãos e também do que tinha de frutas”, lembra Romero. 

Moradora da zona oeste da cidade, Bianca considera que a produção orgânica é cada vez mais importante para a saúde dos brasileiros e justamente por isso que a decisão deve ser revertida. 

“O governo de João Doria tem a obrigação de reconsiderar essa decisão em respeito ao trabalho dos assentamentos do MST e a população paulistana, uma vez que temos direito de produzir produtos orgânicos, sem veneno. Já é um evento tradicional da cidade, além de serem produtos que tem uma responsabilidade social com a reparação histórica da desigualdade do Brasil”. 

Haroldo Ceravolo também defende que políticas públicas que incentivem uma alimentação mais saudável, e acredita que a realização da Feira é uma oportunidade para isso.

“É muito importante uma política de Estado que favoreça a redução do uso de agrotóxicos que estão envenenando as pessoas. O MST tem um papel muito importante nisso e as pessoas como indivíduos e consumidores também. Espero que os governos entendam essa mudança que as pessoas querem na vida delas. Elas querem menos veneno na comida”, ressalta. 

Decisão política 

O fácil acesso e o próprio ambiente do parque também fazem com que os moradores da região queiram que a 4ª edição da feira do MST aconteça no Parque da Água Branca. Isso porque além da comercialização de produtos sem agrotóxicos, a população que frequentou a feira encontrou muito mais: Shows, debates públicos e apresentações culturais. 

“Fui em todas as edições da feira. Acho super legal, uma experiência muito rica porque se entra em contato com produtores do Brasil inteiro que trazem produtos que não encontramos geralmente. É uma troca de experiência, com toda essa parte cultural. É uma experiência maravilhosa”, conta Pedro Nabuco, conselheiro participativo municipal da Lapa, que engloba também os bairros da Barra Funda, Perdizes, Vila Leopoldina, Jaguaré e Vila Jaguara. 

Morador da região, Nabuco se junta às pessoas que defendem que a feira deve ser realizada no mesmo local que as edições anteriores. “Acontecer no Parque da Água Branca tem tudo a ver. É um parque com características rurais, ele tem uma vocação para produtos da agricultura pela sua própria formação. Lá era um lugar de leilão de gado, tem a questão dos bichos, que é mais um fator para acontecer lá.” 

Em nota, a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do governo alega que o veto ocorreu porque seu Conselho Gestor avaliou que as estruturas do local não comportam mais o evento. A secretaria acrescenta que alternativas como os parques da Juventude e Ecológico do Tietê foram oferecidas. 

No entanto, segundo o MST, as ofertas não atendem as demandas da feira. O movimento afirma estar buscando outras opções junto à Prefeitura, mas que o único espaço que congrega o conjunto das necessidades da feira, incluindo acessibilidade e estrutura, é o Parque da Água Branca. 

Na opinião de Nabuco, a decisão do governo foi motivada por razões políticas. “Fico muito triste que tenha sido vetado obviamente por questões ideológicas e não por qualquer outro motivo. Lá acontecem inúmeros eventos ao longo do ano, e esse seria mais um. Não tem nenhum motivo para não ser. É uma questão ideológica”, destaca. 

“O que enxergo é que a motivação é política, ignorando que há um trabalho de produção de alimentos saudáveis, bons, e buscando outro modelo de produção alimentar, mais inclusivo. Aqui no meu bairro vários moradores estão comentando e falando sobre isso. Em grupos de Whatsapp, todo mundo está compartilhando o link do abaixa-assinado. Acho que temos que tentar, pelo menos, constranger e mostrar que a população não está de acordo com essa decisão tomada”, complementa o conselheiro.

Bianca Romero considera que o veto à realização da Feira no Parque da Água Branca é um desrespeito com o MST e com a população da cidade de São Paulo, que de acordo com ela, se beneficia dos resultados do evento. “Claramente o atual governador não apoia esse movimento que se diferencia das grandes redes da indústria de alimentos que só vende comida envenenada pra gente”, critica. 

Edição: Pedro Ribeiro Noguera