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O vírus Bolsonaro sofre mutação para sobreviver

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"É preciso acompanhar com cuidado a evolução da mutação do Bolsovirus, para combater sua circulação e contaminação" - Isac Nobrega / PR / AFP
Seu discurso brando aumenta ainda mais a desconfiança de que esteja agindo para enganar as defesas

A Biologia está em alta, inclusive na jocosidade dos memes que são difundidos nas redes sociais. Em meio a uma pandemia, falar de vírus, esse ser invisível a olho nu, tornou-se comum. E para além de toda compreensão profunda que a ciência possa nos trazer, sabe-se, com certeza, que esses seres podem ser destrutivos e letais; que conseguem invadir células e reproduzir-se em larga escala, muitas vezes causando doenças graves.

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A capacidade de sofrer mutações genéticas é uma das características que os vírus têm em comum com os seres vivos.

Os recorrentes sofismas de Jair Bolsonaro não desenvolvem uma tática definida, como alguns ainda ponderam. É um jogo de tentativa e erro, com muita disposição de ganhar a disputa de narrativa. O que não exclui intenções a longo prazo, arrogância renitente e, paradoxalmente, a percepção de quando o sinal amarelo pisca avisando para não avançar.

O discurso proferido por Bolsonaro nesta terça-feira, (31) em rede nacional de rádio e televisão, enquanto as janelas produziam barulhos em protesto Brasil afora, teve um tom completamente diferente de oito dias atrás, pedindo desta vez um pacto social para o enfrentamento à pandemia. Um pacto com as mesmas instituições e autoridades que agrediu na semana anterior.

Foi uma amostra de como o Bolsovírus pode ser mutante na busca de sobrevivência. A “gripezinha” e o “resfriadinho” transmutaram-se no “maior desafio da nossa geração”.

A sociedade civil, como o corpo humano, possui defesas. Nossos anticorpos foram produzidos no processo de redemocratização, após mais de vinte anos de uma doença chamada ditadura civil-militar.

Doença que, a propósito, fez aniversário na exata data em que um de seus mais ardorosos defensores – o Presidente da República - falou à nação, mas curiosamente “esqueceu” da comemoração. As proteínas são produzidas por células especiais: sindicatos, frentes, entidades, partidos, imprensa, coletivos organizados. São organismos vivos para combater os agentes que causam as doenças na democracia.

O Bolsovírus, além de ter sempre em conta a perspectiva de fechar o regime e se livrar desse incômodo que é a democracia, alimentando o desejo de construir o ambiente ideal para uma aventura golpista, trabalha com o cenário de que, passada a crise, com a recessão e o país em frangalhos, poderá culpar a imprensa, a oposição, os governadores, prefeitos, a OMS (Organização Mundial de Saúde), o papa e quem mais tenha defendido isolamento social para combater a pandemia.

Segundo sua própria fala, tem que pensar “além dos próximos meses”. Apostará no esquecimento coletivo de que a economia já vinha de índices de estagnação, sem um plano claro de crescimento, desemprego alto, desmonte de políticas públicas e sociais. Daí manter a narrativa de que sempre esteve certo em, supostamente, defender empregos durante a pandemia.

A oposição, por meio dos partidos com representação no Congresso Nacional, busca formas de reagir e combater o Bolsovírus, sem que, para atacar o parasita, termine por matar também o hospedeiro.

Nesse rumo, seis partidos apresentaram na mesma terça-feira (31) uma notícia-crime junto ao STF (Supremo Tribunal Federal), apontando os crimes cometidos até aqui por Jair Bolsonaro, instigando, tanto a Corte maior, quanto o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, que até aqui tem se mantido inerte, a tomar providências contra as infrações do presidente que coloca vidas humanas em risco.

Ao mesmo tempo, há uma corrida para a aprovação de projetos no Congresso Nacional que garantam distribuição de recursos, não apenas para a saúde, mas para que os trabalhadores possam sobreviver a este período sem trabalhar, e garantindo que apenas os serviços essenciais continuem funcionando.

É preciso acompanhar com cuidado a evolução da mutação do Bolsovirus, para combater sua circulação e contaminação. Ao tratar tudo como disputa política de narrativa, inclusive um problema grave de saúde mundial, cujas proporções ainda são incalculáveis, Bolsonaro não se mostra digno da mais superficial confiança sobre como pretende conduzir a crise.

Seu discurso brando aumenta ainda mais a desconfiança de que ele esteja agindo como um HIV, capaz de enganar as estratégias de defesa de nosso corpo.

Enquanto não criamos a vacina definitiva para destruir o Bolsovírus, a regra é fortalecer o sistema imunológico com propostas concretas para a crise e, dentre elas, um ótimo remédio é a revogação da Emenda Constitucional nº 95, conhecida como “teto de gastos”, que limita as despesas públicas e impede uma política fiscal que seja coerente com a crise por que passa o país.

Isso ou, mesmo em um cenário otimista, tudo irá piorar muito.



 

Edição: Leandro Melito