Rio Grande do Sul

DEBATE

Dirceu: as esquerdas não podem se limitar ao “Fora Bolsonaro”

O ex-ministro José Dirceu defendeu uma frente de esquerda na live As Ameaças à Democracia e a Frente Antifascista

Brasil de Fato | Porto Alegre |
“É uma tragédia o governo Bolsonaro. Pela pandemia, pelo desmonte do estado, pela política externa, ele tem que ser removido. É um crime de lesa-pátria”
“É uma tragédia o governo Bolsonaro. Pela pandemia, pelo desmonte do estado, pela política externa, ele tem que ser removido. É um crime de lesa-pátria” - Agência Brasil

O ex-ministro José Dirceu defendeu a constituição de uma frente de esquerda que não se limite ao “Fora, Bolsonaro” ou ao impeachment. Reconheceu, porém que, com a pandemia, o apoio das ruas, essencial para acelerar o processo, ainda é restrito. E notou que a oposição pela direita, como DEM, MDB e PSDB e a Rede Globo, ainda não está pedindo o afastamento de Jair Bolsonaro. “Iremos chegar num momento em que se convergirá para um programa mínimo, como aconteceu nas Diretas Já e no impeachment de Collor”, prognosticou ao participar da live As Ameaças à Democracia e a Frente Antifascista (*).

“Vai se concordar com a política de desigualdade social? Com o Lula sem direitos políticos, quando ele tem 40% dos votos da população?” questiona, aventando que, talvez para muitos partidos, a única convergência seja a saída de Bolsonaro. “Estamos numa situação de empate num jogo de xadrez”, descreve. Dirceu acentua que como o STF, a classe média, a mídia e o parlamento se posicionaram na partida, Bolsonaro não pode avançar.

“Temos que fazer a maior política unitária possível. Não podemos retirar da nossa perspectiva o fato de que está morrendo um brasileiro ou uma brasileira por minuto”, alerta. Caso prossigam Bolsonaro e sua política quanto à pandemia, adverte que as mortes poderão chegar a um milhão. “O próprio (Donald) Trump disse que, se tivesse adotado a política do Bolsonaro (contra a covid-19), morreriam 2,5 milhões de americanos”.

Além da questão das alianças, Dirceu abordou muitos outros temas ao longo de 1h25min de discussões, como o papel dos militares, a decadência das elites, a agenda da oposição de direita, a atuação da TV Globo e o apequenamento do Brasil no mundo. A seguir, os tópicos mais importantes:

Ditadura

“Como o Bolsonaro trabalha para constituir uma ditadura, a questão democrática se sobrepõe. Se se vai ou não fazer frente ampla não está colocado hoje. Está colocada é uma explosão de indignação contra as milícias, o laranjal, as rachadinhas”.

Casta

“Eles (os militares) não aceitam a democracia. ´O povo não sabe votar` é o pensamento médio militar. Neste país, nenhum governo civil governou o poder militar. As Forças Armadas são um Estado dentro do Estado. Agora, com a reforma da previdência, viraram uma casta”.

Capitalismo nacional

“(O general Ernesto) Geisel faz o II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento Nacional) e uma política internacional que defendeu os interesses do capitalismo brasileiro. O capitalismo nacional, os interesses nacionais, a burguesia nacional não existem mais hoje...”

Elites

“As elites vivem do rentismo. Os maiores problemas do Brasil são a estrutura tributária, a concentração de terra e o rentismo. São as três questões que travam o desenvolvimento. Não é dívida ou déficit público. Isso se resolve com crescimento”.

Degradação

“O Bolsonaro é a perversão, a degradação das elites brasileiras. O golpe de 2016 já é isso...”

Renda

“O Brasil não cresce porque não tem consumo. A renda está concentrada. Um por cento (da população) tem 28% da renda, 10% tem 50%. Cento e trinta milhões ganham até 2,5 salários mínimos.”

Bolsonarismo sem Bolsonaro

“Como o Bolsonaro expressa uma política de extrema direita, se chocou com o cosmopolitismo das classes médias urbanas e os interesses de setores das classes dominantes. Uma coisa é centro democrático que já está se formando e outra a oposição que o (Rodrigo) Maia, o Fernando Henrique, o Estadão, a Folha e a Globo representam, que querem um bolsonarismo sem Bolsonaro”.

Globo e Record

“Qual é a agenda da Globo? Meio ambiente, antirracismo, defesa da mulher, proteção da cultura nacional, defesa da diversidade. A Record não. O Bolsonaro está na extrema da Record: quer armar o povo, penalizar o uso de drogas, negar o aquecimento global, entregar a Amazônia para a ocupação econômica e por aí vai... Mas as duas querem dar continuidade à pauta do Guedes...”

Imagem do Brasil

“Aqui na América do Sul, mesmo os governos de direita se afastaram do Bolsonaro. Na França, até a Frente Nacional (de extrema-direita) deixou claro que não tem nada a ver com o Bolsonaro... Ele é um pária no mundo.”

Circo

“A reunião do dia 22 de março mostrou as vísceras do governo. Todo servidor de carreira diz abertamente que nada funciona. É um circo de horrores. Naquela reunião, o Guedes desmoraliza, humilha, o general (Braga Neto). Revela também esse caráter do Bolsonaro que toda hora se rende ao Guedes. Ele sabe que esse é ponto de inflexão. No dia em que ele falar que não concorda com o Guedes ele pode sair. E aí sai o impeachment”.

Integração

“Observando as economias dos EUA e da China, vamos ver que o Brasil se integra é com a China. Os EUA são nossos concorrentes e não dão nada pra ninguém”.

Hegemonia

“Bolsonaro já perdeu a hegemonia política, o que nem nós nem a oposição de direita temos. Estamos vivendo um empate, um jogo de pressão e contra pressão. Há muita ameaça e muito blefe da parte dele. Mas ele já capturou Coaf, Receita, Polícia Federal, Ministério Público e constituiu um serviço de inteligência. Que não é o dele mas as três armas e todos esses órgãos possuem ...”

Tragédia

“É uma tragédia o governo Bolsonaro. Pela pandemia, pelo desmonte do estado, pela política externa, ele tem que ser removido. É um crime de lesa-pátria”.

Forças Armadas

“Bolsonaro é um instrumento das Forças Armadas. O pensamento médio das FA é conservador, reacionário, pró-Estados Unidos. E antidemocrático. Essa é a verdade.”

(*)  O encontro foi promovido pelo Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito/RS, mediado pelo cientista político Benedito Tadeu César e com a participação da socióloga Reginete Bispo e do cientista político Cláudio Couto. Assista na íntegra:

Edição: Marcelo Ferreira