Paraná

Coluna

Quando a (má) notícia é sobre jornalismo

Imagem de perfil do Colunistaesd
"Foram contabilizadas 245 ocorrências, de janeiro a junho de 2020" - Antonio Cruz - Agência Brasil
São quase dez ataques ao trabalho jornalístico por semana, neste ano

O jornalismo profissional enfrenta uma conjuntura difícil. É serviço decretado essencial na pandemia, portanto repórteres estão no rol de trabalhadores em risco, nessa linha de frente que formam para que o acesso à informação seja também uma forma de diminuir o número de casos de coronavírus no país.

E é também nesse contexto da produção da notícia que os jornalistas do país são a categoria de trabalhadores mais atacadas. E as agressões são verbais, virtuais e presenciais, muitas vezes chegando à violência física.

A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e os sindicatos de todo o país historicamente monitoram essas ocorrências de violência no Brasil, mas é na atual conjuntura, sob a presidência de Jair Bolsonaro e num cenário de avanço das mortes pela pandemia que se torna claro que os ataques contra jornalistas não é só da conta de entidades sindicais e representativas da profissão: é uma dimensão que diz respeito à toda população.

Em seu mais recente monitoramento divulgado sobre ataques contra jornalistas e atos para descredibilização do jornalismo, cujo principal agente é o presidente Bolsonaro, foram contabilizadas 245 ocorrências, de janeiro a junho de 2020. A entidade monitora discursos, entrevistas, lives, postagens no Twitter, vídeo no Youtube. Todas as fontes são institucionais e oficiais. E é na formalidade que o maior representante governamental do país se dedica a deslegitimar a credibilidade das notícias. E neste ano, mais ainda se elas estão relacionadas ao coronavírus.

Conforme destaca a Fenaj, o monitoramento evidencia que, “independentemente da crise que o governo enfrenta em tempos de pandemia, produção de notícias é alvo de ataques reiteradas vezes”. São quase dez ataques ao trabalho jornalístico por semana, neste ano.

No contexto da pandemia, eles começaram dia 10 de março. Para Bolsonaro, existir uma pandemia mundial do vírus Covid-19, que causa uma doença que atingiu, até o fechamento desde artigo, quase 65 mil mortes e 1,5 milhão de casos confirmados, é um detalhe, quando é a imprensa que “propaga fantasia”. De março a junho, o trabalho jornalístico na cobertura da pandemia é reiteradas vezes alvo do presidente. Para ele, “grande parte da mídia potencializou em cima desse evento”. Para ele, o povo “foi enganado” por governadores e “grande parte da mídia” em relação ao coronavírus. Para ele, jornalistas “insistem em falar em assuntos”, que alimentariam “intrigas que causam pânico.

Em pronunciamento em cadeia de TV e rádio, o presidente afirmou que meios de comunicação “espalharam exatamente a sensação de pavor” e associou a atuação da imprensa como causadora de “histeria”.

A postura de descredibilizar a cobertura do jornalismo não passou conforme as mortes e as confirmações foram aumentando. Ao mesmo tempo que Bolsonaro refuta o uso de máscara e o isolamento social, quando ele mesmo comparece a compromissos públicos sem proteção, continua, mês a mês, associando o trabalho de jornalistas como causa de terror, histeria, caos, disseminação de pânico. Um pânico “pregado lá atrás pela mídia”.

Para além dos ataques por parte do presidente no contexto da pandemia, jornalistas foram hostilizados, reiteradas vezes, na cobertura em Brasília, no Palácio do Alvorada, mas também nas ruas, nas manifestações anti-isolamento, de apoio ao presidente, em diversas regiões do país.

A atuação profissional em risco, portanto, no Brasil 2020, extrapola uma doença invisível e mortal. O risco é causado também por ações do presidente, um exemplo para seus seguidores.

Precarização da profissão

A dimensão do que é ser jornalista no Brasil em tempos de pandemia e de governo Bolsonaro não para por aí. Ainda que muitos trabalhadores das redações estejam também exercendo seu trabalho em home office, tornou-se quase regra na profissão as reduções de salário, de 25%, 50% e até 70%, ou ainda suspensão de contratos, possibilitados pela MP 936.

Além do monitoramento de ataques de Bolsonaro, o movimento sindical dos jornalistas também realiza pesquisas e acompanha informações junto aos sindicatos de jornalistas sobre as condições de trabalho no contexto do coronavírus e os acordos individuais e coletivos de redução de salário. Os dados podem ser consultados junto aos sites e redes sociais destas entidades.

Edição: Pedro Carrano