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A derrocada da Operação Lava Jato - reflexões sobre a corrupção no Brasil

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bolsonaro e moro
A Operação Lava Jato não apenas cumpriu sua missão de criminalizar o PT, como também foi cirúrgica no desmonte de um importante setor da economia brasileira - Sergio Lima/AFP
Moro imaginou que servindo ao ciclo bolsonarista, poderia de fato combater de frente a corrupção?

É conhecida a obsessão do juiz Sérgio Moro em instalar no Brasil uma operação inspirada na operação Mãos Limpas, ocorrida na Itália entre os anos de 1992 a 1994. Em seu artigo “considerações sobre a operação mani pulite”, publicado na revista eletrônica do portal do consultor jurídico (Conjur), em 2004, Moro anota, que: “No Brasil, estão presentes várias das condições institucionais necessárias para a realização de ação judicial semelhante. Assim como na Itália, a classe política não goza de grande prestígio junto à população, sendo grande a frustração pelas promessas não cumpridas após a restauração democrática”.

A operação Mãos Limpas emergiu com muita força sob o manto do combate à corrupção política e empresarial numa Itália considerada um dos países mais corrompido do mundo. Seu marco inicial ocorreu em fevereiro de 1992 com a prisão de Mario Chiesa, liderança ligada ao Partido Socialista que ocupava o cargo de diretor de instituições filantrópicas de Milão.

Da capital europeia da moda a operação se estendeu ao centro do poder político na capital, Roma. Políticos, administradores e empresários foram condenados. A Democracia Cristã (DC), e o Partido Socialista Italiano (PSI), principais partidos que disputavam a hegemonia política italiana desde o final da segunda guerra mundial foram dizimados.

Contando com amplo apoio de setores da mídia e da maioria da sociedade, juízes e promotores avançaram na produção de resultados impressionantes. De acordo com o próprio artigo de Moro, em pouco mais de dois anos de duração foram expedidos 2.993 mandados de prisão, 6.059 pessoas sob investigação, sendo 872 empresários, 1.978 administradores locais, 438 parlamentares, dentre os quais quatro haviam sido primeiros-ministros. Suicídios foram registrados como decorrentes dos efeitos da operação.

A tática usada pelos coordenadores da operação foi a de ampliar o apoio da sociedade por meio da ampla divulgação das ações de prisões preventivas e estímulo às delações premiadas.
Encerrada há 26 anos, é importante que façamos uma leitura do balanço da megaoperação italiana para avaliar os cenários da operação brasileira. São várias as vertentes que poderão ser analisadas, em capítulos que poderemos continuar avaliando em textos futuros. Decerto que ninguém com um mínimo de sensatez poderia esperar que de operações como a Mãos Limpas ou a Lava Jato houvesse apenas acertos. Porem, é notável que o principal fracasso da operação italiana vem se repetindo no Brasil. Aproveitando-se do vácuo de poder aberto pela operação judicial o empresário neoliberal Silvio Berlusconi, dono do clube de futebol Milan por 30 anos, criou no mesmo ano de encerramento da operação judicial o partido Forza Italia (Força Itália), com o qual foi guindado ao poder central. No governo atuou para alterar regras dificultando a ação do poder judiciário. Denunciado por corrupção e também por assédio sexual, continua atuante aos 83 anos foi internado recentemente por contaminação do Covid-19.

Por sua vez, não à toa, no Brasil a operação Lava-Jato foi essencial na ascensão de Bolsonaro e dezenas de parlamentares da mesma linhagem ideológica. A decisão de Sergio Moro em abandonar o cargo de juiz para se tornar Ministro da Justiça e Segurança Pública aderindo ao novo ciclo de poder político ilustra bem essa premissa. O principal juiz da Lava Jato inebriado pelo brilho falso do poder desconsiderou suas próprias constatações quanto a um dos limites da operação Mãos Limpas: “Não deixa de ser um símbolo das limitações da operação Mani Pulite o cenário atual da política italiana, com o cargo de primeiro-ministro sendo ocupado por Silvio Berlusconi. Este, empresário da mídia local, ingressou na política em decorrência do vácuo de lideranças provocado pela ação judicial e mediante a constituição de um novo partido político, a Forza Italia. Não obstante, o próprio Berlusconi figura desde 1994 entre os investigados pelos procuradores milaneses por suspeita de corrupção de agentes fiscais”.

Ciente dos acertos e erros dos colegas do judiciário italiano, Moro imaginou que servindo ao ciclo bolsonarista, poderia de fato combater de frente a estrutura que favorece a corrupção no país? Não estudou minimamente a exploração familiar dos Bolsonaro arraigados ao poder público há três décadas?

O agora ex-ministro não parece o autor atento do artigo de 2004: “A ação judicial não pode substituir a democracia no combate à corrupção. É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção. Ademais, a prisão de agentes públicos corruptos é sempre difícil, senão por outros motivos, então pela carga de prova exigida para alcançar a condenação em processo criminal. Nessa perspectiva, a opinião pública pode constituir um salutar substitutivo, tendo condições melhores de impor alguma espécie de punição a agentes públicos corruptos, condenando-os ao ostracismo”.

É inacreditável! Sim, o principal agente da operação Lava Jato foi um dos protagonistas e responsáveis pela miséria moral, social e econômica em que o Brasil se encontra sob um governo que vem desmontando o Estado de proteção social. Moro demonstra ser contaminado pela principal dificuldade coletiva da nação brasileira, não aprender com a própria História.

Edição: Pedro Carrano