Pernambuco

Coluna

O direito de estabilidade de dirigente de sindicato sem registro sindical

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Apenas com a Constituição de 1988 e após muita luta do movimento sindical brasileiro é que passou a se prever a liberdade de organização e de atuação sindical - Wellington Santos
Nesse sentido, é preciso melhor entender: o que é o registro sindical?

O Tribunal Superior do Trabalho, em julgamento recente, firmou o entendimento de que o trabalhador dirigente sindical tem direito à estabilidade no emprego por exercício de mandato ainda que o sindicato não possua o registro sindical. 

O principal fundamento da decisão do TST foi o de que o registro de entidade sindical no antigo Ministério do Trabalho - hoje, realizado junto ao Ministério da Economia - é uma mera formalidade não essencial, não dependendo dele para a sua efetiva constituição e existência, de modo que a finalidade desse registro é a verificação da obediência ao princípio da unicidade sindical. Isso porque o Supremo Tribunal Federal, desde a década de 1990, garante aos sindicatos a aquisição da personalidade jurídica mesmo antes do efetivo registro ministerial e, por conseguinte, o direito de seus dirigentes à estabilidade sindical.

Nesse sentido, é preciso melhor entender: o que é o registro sindical? Segundo a estrutura sindical brasileira, cujas bases foram criadas ainda pelo Governo Vargas, o Estado atua sobre as entidades sindicais obreiras (sindicatos, federações e confederações) de modo a fiscalizar e garantir que apenas exista uma única entidade que que represente uma determinada categoria profissional em uma área territorial específica. É o modelo da unicidade sindical, próprio de uma forma de Estado autoritária que intervinha diretamente no movimento sindical.

Nessa lógica, a criação de um sindicato dependia de expressa autorização do Ministério do Trabalho, os atos de gestão de um sindicato eram fiscalizados por órgãos estatais, as eleições de suas diretoria eram controladas pelo governo, podendo inclusive esse intervir e destituir uma diretoria não alinhada a uma linha político-ideológica determinada – isso da Era Vargas até o fim da Ditadura Militar.  

Ou seja, não existia a livre atuação dos sindicatos e dos militantes sindicais, sem que houvesse o controle e fiscalização dos órgãos estatais, até pelo menos a Constituição de 1988. Apenas com a Constituição de 1988, em seu artigo 8º, após muita luta do movimento sindical brasileiro nas décadas, é que passou a se prever a liberdade de organização e de atuação sindical, de maneira que não se poderia mais “exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical” (art. 8º, I). Entretanto, no inciso II do mesmo art. 8º do texto constitucional, o modelo da unicidade sindical seguiu existindo.  

Dessa forma, o registro sindical junto a um órgão ministerial competente, após a Constituição de 1988, deixou de ter um caráter de autorização estatal para constituição e efetiva existência de uma entidade sindical – o que se dizia antigamente de ter a “concessão da carta sindical”. Passou a ser uma mera certificação de atendimento à unicidade sindical, ou seja, que aquele sindicato seria o único a representar uma determinada categoria na sua respectiva localidade. É o que se chama hoje da “dupla certificação”: a entidade sindical é verdadeiramente criada enquanto pessoa jurídica ao ser registrada em um cartório e o registro ministerial atesta a sua observância à unicidade sindical. 

Portanto, formalmente um sindicato passa a existir desde o seu registro em um cartório, quando se deposita a ata da assembleia de sua fundação e o seu estatuto. Politicamente, ele existe com a classe em movimento e as suas lideranças legitimadas. A estabilidade no emprego dos dirigentes sindicais é uma garantia democrática que objetiva preservar a sua autonomia na atuação como representante da categoria obreira, protegendo-o do arbítrio e perseguição patronal. É por isso que esse manto protetivo deve existir desde que efetivamente exista um sindicato, desde que a classe esteja politicamente organizada.

Edição: Vanessa Gonzaga