Queda de 37,1%

Com pandemia e desinformação, transplantes diminuem enquanto 20 mil aguardam na fila

Redução registrada foi de 49% na segunda quinzena de maio, segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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No Brasil, existem estados com taxas altas de doações, mas outros com índices baixos - Governo do Estado do Paraná

Um número que já era baixo, tornou-se ainda menor com a pandemia de covid-19: o de transplantes realizados no Brasil. Em casos de óbitos por suspeita ou confirmação da doença, os órgãos não podem ser utilizados. Dados do Ministério da Saúde indicam queda de 37,1% nos transplantes de órgãos no Brasil este ano, frente aos resultados de 2019.

A conjuntura, no entanto, soma-se a um cenário de desconfiança e falta de informação, o que faz os números serem expressivamente baixos. De acordo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), a taxa média de recusa de doação de órgãos por parentes no mundo é de 25%, enquanto no Brasil é de 43%.

“Nós temos uma lista com cerca de 20 mil pacientes e não chegamos a fazer, no transplante de fígado ou de coração, nem 50% dos transplantes necessários”, exemplifica Ilka Boin, integrante do Conselho Consultivo da ABTO.

Em 2018, a associação apontava para 39.663 pessoas na fila de espera por um transplante de órgão, mas o número de cirurgias realizadas foi de 22.668 casos.

O familiar não sabe o que está acontecendo, tem a parte da religião, tem a parte da descrença em todo o protocolo que é feito. Então, é falta de conversa, uma elucidação vai auxiliar muito as pessoas a pensarem na doação de órgãos não como uma coisa que seja ruim, mas uma coisa que você está fazendo em prol do outro”, afirma Boin. 

No Brasil, existem estados com taxas altas de doações, mas outros com índices baixos, o que resulta em uma média que não condiz com a realidade de alguns lugares. “É uma média bem desigual", pontua. No Nordeste, por exemplo, os registros são pequenos, enquanto no Sul, maiores.

Sistema Único de Saúde (SUS)

Nesse aspecto, o SUS é o principal sistema de transplantes do Brasil. Cerca de 94% das cirurgias de todo o território são feitas pelo sistema. Além da quantidade, também ganha em qualidade, ao ser o único que garante acompanhamento em todas as fases do tratamento.

“Todo o mundo considera o SUS em relação a transplante como o melhor sistema de saúde no mundo, e o que faz mais transplantes públicos”, afirma Boin.

Alguns transplantes, inclusive, são feitos integralmente pelo SUS, como é o caso do fígado, que ao lado do transplante de coração e pâncreas, não são cobertos pelos convênios particulares de saúde em sua maioria. 

Como funciona um transplante? 

O transplante pode ser realizado com indivíduos acima de um ano, e a idade limite irá depender do órgão a ser transplantado. O coração, por exemplo, requer um paciente mais jovem, já o rim aceita um paciente mais idoso. Como regra geral, "o estado clínico dos órgãos devem estar bom para serem utilizados”, explica Boin. 

Outro fator é a urgência do paciente. Quando uma doença terminal está em jogo, como uma doença hepática, os pacientes geralmente têm até um ano de chance de vida. 

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“E a gente sabe que 70% deles vão morrer nos próximos três meses, então esse paciente é incluído na lista estadual de transplante de São Paulo, que faz parte da lista nacional, e é colocado nessa ordem de acordo com seu tipo sanguíneo", afirma.

Boin também explica que a compatibilidade entre paciente e órgão é realizada por meio de um sistema nacional, cuja central avisa as equipes de transplante. No caso de transplante de órgãos entre pessoas vivas, a doação segue o princípio do parentesco próximo, como pais e filhos. Fora isso, as cirurgias envolvem autorização judicial. 

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Atualmente, somente o cérebro não pode ser transplantado, “porque a gente pode usar osso, coração, pulmão, fígado, rim, pâncreas, intestino e pele”, afirma a integrante da ABTO.

Edição: Leandro Melito