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Coluna

Professores à beira de um ataque de nervos

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Éder Dantas, professor do Departamento de Psicopedagogia da UFPB e militante do PT. - Reprodução
os mestres paraibanos estão adoecendo e pouco está sendo feito para se reverter essa situação

Por Éder Dantas*
 

Professores cansados, com excesso de trabalho, jornada ampliada, consumindo remédios, sob intensa cobrança de diferentes setores da sociedade e sem nenhum suporte do ponto de vista dos cuidados com a sua saúde mental. Este foi o quadro relatado pela pesquisa "Saúde e Trabalho Docente na Pandemia", coordenado pela Profa. Dra. Thaís Máximo, do Departamento de Psicologia da UFPB e que teve apoio do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Paraíba – Sintep e que foi divulgado na última semana.

De acordo com a investigação, em que foram ouvidos mais de seiscentos trabalhadores na educação, a maioria da escola básica, cerca de 56% disse estar encontrando dificuldade em conciliar as atividades laborais com a vida pessoal durante a pandemia. Já 39,7% consideram que sua saúde foi muito afetada pelo advento do trabalho remoto, a exemplo da utilização de plataformas de videoconferência e outras ferramentas, enquanto que 41% acha que foi relativamente afetada.

A maioria dos pesquisados também sente estar trabalhando mais que sua jornada de trabalho definida em contrato. Muitos reclamam inclusive da quantidade de horas que não são remuneradas e uma parcela muito alta lamenta pela existência de demandas laborais em horário de lazer.

A experiência com o ensino remoto tem sido considerada cansativa. Muitos reclamam de cobranças excessivas. Muitos dirigentes escolares têm culpado os professores pelo não engajamento dos discentes nas atividades desenvolvidas, quando há causas estruturais para isso, como a necessidade da realização de tarefas domésticas (que envolvem pais e aprendentes) e as más condições de acesso à Internet, especialmente para as crianças de origem pobre.

Cerca de 59% dos profissionais ouvidos disseram ter desenvolvido algum sintoma físico ou psíquico relacionado ao trabalho durante a pandemia. Diante disso, mais de 36% dos professores pesquisados afirmam ter passado a consumir algum tipo de remédio, a exemplo de antiácidos, antidepressivos e multivitamínicos, com o intuito de “aguentar o rojão” e minimizar os efeitos do trabalho excessivo no organismo.

Os docentes já vinham enfrentando um processo de intensificação do trabalho, antes do Coronavírus. Com a pandemia e o ensino remoto, a situação só se agravou. Grande parte dos professores e outros profissionais que desenvolvem trabalho intelectual  ou atuam com atendimento ao público, costuma reclamar de sintomas da depressão ou de um estado de esgotamento físico e mental, decorrente de um alto nível de estresse, pressão ou excesso de atividade.

Os professores se sentem exaustos, apresentando forte crise de confiança, cansaço excessivo, irritabilidade e desmotivação no trabalho, sintomas característicos da Síndrome de Burnout, que consiste numa Síndrome do Esgotamento Profissional, que está associada ao desempenho profissional de pessoas que atuam em ambientes marcados por muita tensão e estresse intenso.

O adoecimento docente é uma realidade cotidiana, já vivenciada antes da pandemia. Segundo o estudo “Condições de Trabalho e Saúde dos Professores e Técnicos Administrativos no Ensino Privado do RS”, 47% dos 4.480 professores entrevistados já afirmavam se sentir constantemente esgotados e sob pressão no contexto letivo presencial. Eles reclamavam também de problemas de saúde como: dores, sono irregular, rouquidão e perda de voz, problemas alérgicos, tendinites e problemas de articulação, enxaquecas, gastrites, obesidade e  hipertensão. Já no tocante aos problemas relacionados ao sofrimento mental e questões emocionais, é possível citar o estresse, a ansiedade, a depressão e a síndrome do pânico.

O trabalho docente está, a cada dia, mais marcado pelo fenômeno do produtivismo. As escolas públicas e privadas estão mais submetidas a um ambiente de competitividade. Seguindo um modelo internacional, o Brasil adotou uma política de avaliações em larga escala, com o intuito de medir o desempenho escolar e os fatores associados a esse desempenho que estão presentes no cotidiano do aluno e dos docentes. Dentre as avaliações mais conhecidas, podemos citar o Sistema de Avaliação da Educação Básica – SAEB, cuja prova mais conhecida é o Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM.

O estudo desenvolvido pela UFPB/Sintep revelou uma preocupante realidade: os mestres paraibanos estão adoecendo e pouco está sendo feito para se reverter essa situação. O sindicato denuncia a ausência de políticas públicas no intuito de cuidar da saúde mental dos professores paraibanos em plena pandemia. É preciso se pensar em como se viabilizar a volta às aulas com condições sanitárias adequadas. Nesse contexto, é urgente que se olhe também para as condições de trabalho dos professores. Eles precisam se cuidar, mas também precisam ser cuidados.

É inaceitável uma atitude como a do Ministro da Educação, que recentemente ocupou cadeia de rádio e TV para cobrar o retorno às aulas, quando o MEC passou toda a pandemia “lavando as mãos”, diante da crise que afetou dezenas de milhões de alunos e trouxe uma piora na saúde dos responsáveis pela mediação do saber. A atitude reflete a política do governo Bolsonaro para a pandemia, marcada pelo negacionismo da ciência, ausência total de planejamento, falta de compromisso com a saúde coletiva e a educação pública. Foi essa política que levou, não só os professores, mas milhões de brasileiros e brasileiras a viverem à beira de um ataque de nervos.

 

*Professor do Departamento de Psicopedagogia da UFPB. Militante do PT.

 

Edição: Heloisa de Sousa