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Crônica | Ela disse Adeus

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Dryca, minha esposa e companheira, foi embora pro interior, você acredita nisso?

Eslander é motorista de aplicativo. Ele é falante. Agitado. Fala mal dos trabalhadores dos sinais. Acha absurdo pessoas nos sinais e nos cantos da cidade pedirem algum tipo de ajuda.  Dirige com muito cuidado. Uma profissão de família. O pai foi motorista de táxi. Diz que carregou gente famosa no aeroporto de Confins.

Se orgulha de nunca ter tido uma multa ou batido o carro. Também fala mal do povo dos aplicativos das motocas. Diz que são sem educação no trânsito. Acho que ele não tem solidariedade de classe. 

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Ele estava agitado nesse dia. Falava coisas desconexas. Me mostra um remédio para acalmar a cuca. Aliás, me mostra uma pequena bolsa cheia de remédios. Diz que está dormindo quase nada e fica pensando besteiras. Pergunto se ele quer conversar. Ele fala que sim.

 - Dryca, minha esposa e companheira, foi embora pro interior, você acredita nisso?

- Sério?

- Sério. Depois de 20 anos de casamento e um filho. Estou muito triste.

- Teve um motivo pra ela ir embora?

- Foi meu enteado. Aquele preguiçoso. Nunca trabalhou. Come e dorme o dia inteiro. Fica a noite toda jogando vídeo game. Ele fez fofocas com a mãe dele. Falou coisas mentirosas.

- Você não tá tirando sua responsabilidade e colocando a culpa nele? Isso é feio, hein? Vai ver ela se cansou.  Estava triste com a vida que levava. Sem carinho. Sem compreensão. Você pensa só em trabalhar.

- Não. Ele deu com a língua nos dentes. Não pensou na mãe e nem em mim. Foi por causa de dinheiro. Ele quer dinheiro para comprar as porcarias dele. E a mãe passa a mão na cabeça. Ele agora casou e está morando nos fundos lá de casa com a esposa e o filho. E não trabalha. A confusão começa aí.

- Sei.

- Estou muito triste e revoltado com esse moleque irresponsável. Mas vou me vingar. Outro dia, peguei um passageiro que faz as pessoas voltarem novamente: “trago a pessoa amada em três dias”, você já viu essa propaganda nos postes?

- Sim. Já vi. Você acredita?

- Ele me garantiu que a Dryca vai voltar. Vai ficar caro. Mas vou fazer.

- Você está disposto a tudo, né? Isso pode dar errado. O feitiço pode voltar contra o feiticeiro. Cuidado, hein?

- Estou muito disposto. Vou dividir o pagamento do trabalho em três vezes e trabalhar 18 horas por dia. Agora virou missão. Minha honra e felicidade tá em jogo.

- Três vezes? Vc está muito louco, meu amigo!

- É. Porque vou fazer dois trabalhos pesados.

- Dois?

- Dois. Vou fazer um para a Dryca voltar e outro para destruir a vida dele. Aquele ordinário e preguiçoso.

- Eslander, para com isso, né? Vc tá indo longe demais. Vc acha que fazendo alguém infeliz vai melhorar a sua?

- Uai. Ele merece.

Chegamos ao meu destino. Paguei a corrida e bati a porta. Coloquei a cabeça na janela da porta e falei:

- Eslander, bola pra frente, meu irmão, não vai fazer nada de mal pra ninguém. Sua felicidade não depende da destruição da vida de alguém. Cabeça no lugar. Vida que segue!

 Lá de dentro ele respondeu:

- Vou fazer sim. Vou destruir a vida dele, igual ele fez com a minha vida. Quero que ele fique ruim da cuca também, sem esposa e sem casa. Minha felicidade será destruir a vida dele. 

Nem despedi do Eslander.

 

Edição: Larissa Costa