Minas Gerais

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Militarismo e comemorações da Independência

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Integrantes do Exército durante desfile militar de 7 de Setembro, na Esplanada dos Ministérios - Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Militares deram o golpe de 15 de novembro de 1889

Cinquentenário

As comemorações periódicas da Independência do Brasil coincidiram sempre com o predomínio da força militar. 

O cinquentenário, em 1872, coincidiu com a celebração da paz com o Paraguai após o fim da guerra. Os voluntários egressos da guerra receberam patentes militares, mesmo sem exercícios profissionais. Os que não foram contemplados com títulos militares passaram a obter privilégios, como preferência em nomeações em empregos públicos, pensões e créditos bancários. Além disso, muitos, entre os voluntários, tornaram-se comerciantes e fazendeiros. 

Comemorações insinuavam que a “verdadeira independência” era a “Revolução Militar” de 1964

Os negros que atuaram na guerra não obtiveram benefícios e continuaram como escravos, fomentando a causa abolicionista. Foi nessa oportunidade que o Exército, até então incipiente, consolidou-se, passado a exercer influência política no Império. 

Os militares se revoltavam por não poder se manifestar politicamente e passaram a optar pelo regime republicano, o que culminou com o golpe de 15 de novembro de 1889, tendo à frente o marechal Deodoro da Fonseca que se tornou o primeiro presidente da República, seguido pelo Marechal Floriano Peixoto. 

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De 1910 a 1914 o Brasil foi governado pelo marechal Hermes da Fonseca, que desde a campanha eleitoral criou um clima de rivalidade entre civis e militares, divergências e revoltas entre as próprias forças armadas. 

I Centenário

Nas comemorações do centenário da Independência, em 1922 o presidente da República era Epitácio Pessoa, que governou o país em fortes crises sociais e políticas. Aguçaram-se as rivalidades entre civis e militares e a pressão das oligarquias regionais por privilégios. Epitácio Pessoa nomeou dois civis para pastas militares, o que contribuiu para agitar as diversas esferas da vida pública. 

Intelectuais, artistas e ativistas reagiram às comemorações oficiais do I Centenário da Independência, com exposições e manifestos, especialmente os eventos da Semana de 1922 em São Paulo. Além disso, Epitácio Pessoa vetou a participação de atletas negros na seleção brasileira de futebol ao mesmo tempo em que foi criado o Partido Comunista, que deu nova orientação a operários e camponeses brasileiros. 

A campanha eleitoral ficou tensa quando diversos Estados se colocaram contra a candidatura de Artur Bernardes, continuador da política do café com leite. As facções políticas divulgavam cartas em jornais com falsas acusações a adversários. Tudo muito parecido com os dias atuais. Uma carta atribuída a Artur Bernardes atacou Nilo Peçanha com palavras de discriminação racial e contra o Marechal Hermes da Fonseca com ofensas morais. 

Houve uma tentativa de criar um tribunal de honra, composto de civis e militares para apurar as eleições em 1922 e evitar a vitória de Artur Bernardes por meio de fraude. O ex-presidente Marechal Hermes, que era o presidente do Clube Militar manifestou-se contra a intervenção federal no Estado do Pernambuco. O presidente Epitácio Pessoa, usando a condição de comandante das forças armadas, determinou o fechamento do clube militar e a prisão do marechal Hermes. 

Os militares tentaram dinamitar o trem que conduzia Epitácio Pessoa de Petrópolis para o Rio de Janeiro, mas foram presos criando clima de guerra. Em 5 de julho de 1922 irrompeu a revolta do Forte de Copacabana, com adesão da Escola Militar. Visava a deposição de Epitácio Pessoa e impedir a posse do eleito Artur Bernardes. Até então, o corporativismo militar nunca tinha estado tão evidente.  

Sesquicentenário 

As comemorações do sesquicentenário, em 1972, ocorrem no período governamental do presidente Emílio Garrastazu Médici (1969-1974). 

O golpe de 1964 foi antecedido por outras tentativas de tomada do poder pelos militares. Quando Juscelino Kubitschek foi eleito, em 1955, tendo João Goulart como vice-presidente, o coronel Jurandir Mamede organizou abertamente a tomada do poder para impedir a posse da chapa, alegando sempre o mesmo fantasma do perigo comunista. Em 1964, João Goulart era o presidente quando ocorreu o golpe militar e foi deposto com a mesma retórica do perigo comunista. 

Médici tratou de associar a Independência ao descobrimento do Brasil e, com isso, exaltar os colonizadores, transferindo a data 7 de setembro para 22 de abril. E, também, providenciou a transferência dos restos mortais de Dom Pedro I para o Brasil. Nas cerimônias, no Brasil, Portugal foi representado por Marcello Caetano, continuador do ditador Antônio Salazar. 

O esquife de Pedro I percorreu as capitais do Brasil e as comemorações insinuavam que a “verdadeira independência” era a “Revolução Militar” de 31 de março de 1964. A festança visou reforçar o fanático patriotismo oficial. Tudo isso acabava justificando o Estado todo-poderoso, que massacrava seus inimigos nos porões da ditadura. 

 

Antônio de Paiva Moura é docente aposentado e mestre em história pela PUC-RS

 

Edição: Elis Almeida