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Coluna

24% da população brasileira não possui acesso a quantidades suficientes de alimentos

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Em todo Brasil, manifestantes denunciaram a volta da fome e o aumento do preço dos alimentos - Chokito/Divulgação
a insuficiência alimentar também é mais expressiva entre as pessoas desempregadas

Por Paola Aparecida Azevedo de Souza*

O último levantamento do Instituto Datafolha, divulgado no final do mês de março, sobre os dados da fome no Brasil indicam uma insuficiência de alimentos em 24% das casas, com um em quatro brasileiros sofrendo com a falta de alimentos nos últimos meses. Em contrapartida, 63% da população indicou ter acesso suficiente a alimentos, enquanto 13% afirmaram ter quantidades acima do que seria necessário. Ao mesmo tempo que o percentual positivo em relação a segurança alimentar da população indica uma melhora em relação aos 55% da população brasileira que estavam em insegurança alimentar no final de 2020, como captado pela pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa e Soberania Alimentar (Rede Penssan), é preciso uma análise crítica desse número, uma vez que mais de 20% da população ainda se encontra em insegurança alimentar.

Isso significa dizer que essa parte da população brasileira não tem acesso a quantidades suficientes de alimentos para suprir as necessidades de suas famílias. Esse dado é ainda mais expressivo entre os que possuem uma renda de até dois salários mínimos (R$ 2.424). Nesse grupo o percentual de pessoas que não conseguem realizar refeições completas chega a 35%. A pesquisa em questão possui uma margem de erro de até dois por cento, para mais ou para menos, e foi realizada com base em entrevistas ocorridas em 181 municípios, durante dois dias (22 e 23 de março de 2022), e contou com cerca de 2.500 pessoas entrevistadas.

Assim, de acordo com o Datafolha, o aumento da insegurança pode ser notado principalmente na região Nordeste, na qual, segundo a pesquisa, 32% das famílias passam por insegurança alimentar. Conforme a pesquisa, entre as regiões do país, a região Sul possui o menor índice, com 18% da população alegando algum tipo de insuficiência alimentar. Enquanto Norte, Centro-Oeste e Sudeste apresentam a mesma porcentagem, com 23% cada. 

Além disso, apesar de evidentemente, como comprovado pelo Datafolha, a população com até dois salários mínimos ser mais afetada com a insuficiência de alimentos, entre os entrevistados que recebem de dois a seis salários mínimos (até 6.060 reais por mês) a insegurança alimentar também se mostrou presente. A porcentagem desse grupo dos que disseram passar por algum tipo de insuficiência nos últimos meses é de 13%.

Ademais, entre os que recebem de cinco a dez salários (até R $12.120), 6% declararam ausência de alimentos suficientes para o consumo. Esses números são reflexo da crise econômica que acompanha o país desde o começo da pandemia em março de 2020. 

A alta na inflação e, consequentemente, o aumento no preço dos alimentos e a diminuição do poder de compra das famílias aumentaram os índices de insegurança alimentar no país. Em 2021 foi registrado o maior índice inflacionário dos últimos 5 anos, fechando o ano com 10,6%. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) dos últimos 12 meses é de 11,30%. Analisar o IPCA nos ajuda a compreender melhor os dados da pesquisa do Datafolha, uma vez que esse índice mede a variação no preço dos produtos da cesta de serviços e produtos consumidos pela população, relacionando a porcentagem da renda das famílias gasta em alimentos, transporte e lazer. Durante a pandemia, o acumulado do IPCA aponta gradativamente a diminuição no poder de compra dos brasileiros. Em 2021 a alta no preço dos alimentos e bebidas chegou a 7,94%. Esse aumento afetou principalmente as famílias com renda de até cinco salários-mínimos. 

Além de que, a insuficiência alimentar também é mais expressiva entre as pessoas desempregadas, chegando a 38%. Entre os empregados informalmente e autônomos a pesquisa indica que 20% e 26%, respectivamente, declararam não possuírem acesso a quantidades suficientes de alimentos. 

Esses danos são preocupantes e apontam a grave crise de insegurança alimentar que o Brasil enfrenta. As famílias mais vulneráveis contam com alguns programas de assistência social como o Auxilio Brasil (que substituiu o Bolsa Família) e também o vale gás, que concede a famílias de baixa renda, a cada dois meses, um auxílio de até 50% do valor do botijão de gás. Nesse cenário tornou-se também evidente a importância da agricultura familiar e do papel desempenhado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) que durante o período pandêmico doou mais de 6 mil toneladas de alimentos. Contudo, muitos não possuem nenhum tipo de assistência e tornou-se cada vez mais comum encontrar famílias inteiras famintas nas ruas, semáforos, mercados, bares e restaurantes pedindo ajuda. Cabe essencialmente ao governo trabalhar na ampliação e fortalecimento das políticas de assistência que garantam a integridade dessas pessoas.  

*Estudante de Relações Internacionais e pesquisadora no FomeRI. Acesse o blog www.fomeri.org do Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais para acompanhar as principais notícias e relatórios de organizações internacionais sobre como a pandemia afeta a segurança alimentar e nutricional pelo mundo.

Edição: Maria Franco