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O que realmente está em jogo com a criação da Liga do Futebol Brasileiro?

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A CBF vê com bons olhos a criação da LIBRA - Rebeca Reis / Staff Images Woman / CBF
A LIBRA deve nascer com os mesmos vícios dos dirigentes responsáveis pela sua criação

*Por Luiz Ferreira 

Dirigentes de Flamengo, Bragantino, Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo assinaram um documento que prevê a criação da Liga do Futebol Brasileiro (LIBRA). Estes se reuniram num hotel em São Paulo na última terça-feira (23) junto com cartolas de outros 16 clubes e agendaram uma nova reunião para o dia 12 de maio na sede da CBF para aparar as arestas e finalmente sacramentar a LIBRA. 

A grande divergência (como já era de se esperar) está no rateio das receitas. O bloco dos paulistas mais o Flamengo propôs a divisão dos valores em 40% do total dividido igualmente entre todos os participantes da competição, 30% de variável pela performance e os outros 30% por engajamento (média de público nos estádios, base de assinantes no Pay Per View do campeonato, número de seguidores nas redes sociais, audiência na TV aberta).  

Os outros 14 clubes da Série A exigem que a divisão seja feita em 50% fixo, 25% por performance e 25% por engajamento. Fora isso, ainda existe uma série de questões sobre premiações, valores a serem repassados para os clubes que estão na Série B e por aí vai. 

Mas o grande X da questão ainda não é a criação e o funcionamento da LIBRA (se é que esse nome será mantido). Em tempos onde se vende o almoço pra comprar a janta e contam-se as moedas para se conseguir um mínimo de entretenimento no meio desse pandemônio que tomou conta do país, as dúvidas pairam sobre um processo que vem tomando conta do nosso futebol. Trata-se da crescente elitização do esporte. 

É verdade que estamos falando de algo que deveria ser função prioritária da CBF. Promover o velho e rude esporte em todos os cantos do e torná-lo acessível para todos. É mais do que natural que a entidade veja a criação da LIBRA com bons olhos. Afinal de contas, ela vai tirar mais esse “custo” do seu orçamento. 

Ah, lembre-se que a CBF teve faturamento recorde de quase um bilhão de reais em 2021.  

Mas o que eu quero dizer com isso tudo? Se a Liga do Futebol Brasileiro realmente sair do papel, caberá a ela promover o esporte e torná-lo acessível. É como se a CBF estivesse “terceirizando” parte do seu serviço e apenas dando a chancela para que os clubes administrem a competição e seus custos. 

Quem ainda tem condições de fazer parte de algum programa de sócio-torcedor sabe muito bem a dificuldade que é manter o amor pelo seu clube do coração, conseguir juntar algum dinheiro para comprar o ingresso e ver os jogos no estádio e ainda pagar a quantidade absurda de streamings e PPV’s que surgiram nos últimos meses. 

A LIBRA mal saiu do papel e já terá que lidar com uma série de questões que parecem insignificantes para os dirigentes que estão à frente da ideia. E é de se esperar que a CBF lave suas mãos.  

Ao mesmo tempo, é bem possível que os clubes se façam de desentendidos quando questões como o preço dos ingressos, o barateamento dos programas de sócio-torcedor e a transmissão exclusiva dos jogos em streamings forem abordados nas redes sociais. 

Não quero dar uma de “Profeta do Apocalipse”. Mas se a tal liga não encontrar soluções para que o torcedor fiel consiga acompanhar seu clube do coração, ela já nasce fadada ao fracasso. E o futebol seguirá seu curso de elitização e afastamento do povo. 

Porque nenhum dos dirigentes dos nossos clubes (nenhum mesmo) está preocupado com seu torcedor. Quer é que ele venda o almoço e a janta para pagar o ingresso e acompanhar seu clube e tenha o mesmo gasto de quem vai numa noite de gala no Copacabana Palace. 

*Luiz Ferreira escreve toda semana para a coluna Papo Esportivo do Brasil de Fato RJ sobre os bastidores do mundo dos atletas, das competições e dos principais clubes de futebol. Luiz é produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista e grande amante de esportes.

Edição: Mariana Pitasse