Rio de Janeiro

Coluna

Situação do Botafogo é mais complexa do que parece

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O Botafogo vem de três derrotas seguidas no Brasileirão e parte da torcida perdeu a paciência com o time - Vítor Silva / Botafogo
Querer que as coisas funcionem como num passe de mágica é abusar da ingenuidade

*Luiz Ferreira

O futebol parece ser a única modalidade esportiva deste mundo em que falar em tempo e paciência soa como heresia. Ainda vivemos e defendemos teorias completamente infundadas, mas repetidas como se fossem verdades absolutas. A crença de que as coisas funcionam como num passe de mágica ainda é muito forte. Principalmente aqui no Brasil, o berço do chamado “futebol-arte”.

Só que a prática é bem diferente. Há muito mais suor, dor, ranger de dentes e lágrimas do que muita gente pensa por aí.

Os processos de recuperação e reerguimento de Botafogo e Vasco seguem essa linha. Estamos falando de dois clubes gigantes que precisaram recorrer à venda da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) para conseguirem respirar no meio do caos deixado por gestões anteriores. É algo que demanda tempo, trabalho e muito estudo para dar certo.

Mas a venda da SAF não é o assunto desta coluna. Confesso que me falta conhecimento para tratar do tema do mais profundidade. E aqui mesmo no Brasil de Fato há colegas que abordaram esse assunto com a maestria de um camisa 10. O papo aqui, meus amigos, é outro.

A reação da torcida do Botafogo na derrota sofrida para o Goiás na última segunda-feira (6) me deixou preocupado. Até pouco tempo, ela vinha abraçando o clube e os jogadores e mostrando compreensão com o trabalho de Luís Castro. Bastaram dois resultados negativos para que toda a massa alvinegra (ou pelo menos boa parte dela) se voltasse contra a comissão técnica e os jogadores, tal como uma inquisição.

Até ouvir que “o time perdeu a torcida” eu ouvi. Puxado demais, não acham? Ainda mais para quem vinha dando exemplo no Estádio Nilton Santos não faz muito tempo.

Só que a goleada sofrida diante do Palmeiras (o melhor time do Brasileirão até o momento) nesta quinta-feira (9) piorou ainda mais esse cenário. Os quatro a zero deixaram bem claro que o time do Botafogo ainda precisa de tempo e paciência para entender e executar bem os conceitos trabalhados por Luís Castro nos treinamentos.

E isso não vai acontecer do dia para a noite.

É verdade que todo o time esteve muito mal no Allianz Parque e que o treinador português errou a mão em alguns pontos. Mas isso é perfeitamente normal no contexto em que o Botafogo se encontra no momento.

Falando aos mais emocionados, é óbvio que o time poderia estar jogando muito mais do que vem jogando e que Luís Castro poderia abrir mão de suas convicções para adaptar seu estilo de jogo às características dos atletas que tem à disposição. Mas tudo isso faz parte de um processo longo de entendimento mútuo entre todas as partes envolvidas nesta história. E aqui vamos ao óbvio ululante: querer que as coisas funcionem como num passe de mágica é abusar da ingenuidade.

O Vasco passa por um momento um pouco menos turbulento. Mesmo com a saída de Zé Ricardo para o futebol japonês, o time conseguiu se manter no G4 da Série B e vem apresentando um futebol que, se não é vistoso, pelo menos é eficiente. A vitória sobre o Náutico nesta terça-feira (7) fala por si só.

A grande diferença (e que os mais exaltados e suscetíveis me perdoem) está no comportamento das duas torcidas. Não que uma apoie mais ou seja mais apaixonada do que a outra. Mas a impressão que fica é a de que os vascaínos parecem mais cientes das limitações do seu time do que os botafoguenses. É por isso que as reações (até mesmo nas derrotas) é diferente.

Mas a cobrança por resultados imediatos ainda está lá.

A crença no “passe de mágica” ainda é muito forte e parece tomar conta da crônica esportiva como uma daquela fake news que se espalham com a velocidade de um vírus.

Estamos falando de processos demorados e altamente complexos de recuperação dentro de um cenário completamente caótico. É jogo atrás de jogo e uma exigência absurda por resultados imediatos. E isso tudo sem perceber que mal há tempo para treino e descanso para os jogadores de Botafogo e Vasco. São situações muito mais complexas do que eu e você estamos pensando.

É por isso que toda e qualquer dose de compreensão e paciência será muito bem vinda nesse momento. Mesmo as situações mais complexas pedem um pouco de calma para serem contornadas. Em tempo: pedir a saída do treinador não vai resolver o problema, tá?

*Luiz Ferreira escreve toda semana para a coluna Papo Esportivo do Brasil de Fato RJ sobre os bastidores do mundo dos atletas, das competições e dos principais clubes de futebol. Luiz é produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista e grande amante de esportes.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Mariana Pitasse