Março das Mulheres | A voz, o caminho e a poesia mapuche de Graciela Huinao

Uma entrevista e cinco poemas traduzidos da primeira indígena a ocupar uma cadeira na Academia Chilena de Letras

Foto: Alvaro de la Fuente/Dialogo

Por Luiza Mançano e Pedro Ribeiro Nogueira

De São Paulo (SP), 18 de março de 2019

“Como mulher, eu não tenho país, como mulher, meu país é o mundo inteiro”. Esta frase da escritora inglesa Virginia Woolf foi revisitada por outras escritoras, entre elas, a estadunidense Adrienne Rich, que afirmou “que é preciso compreender como é que um lugar no mapa se torna também um lugar na história”.

Esse lugar na vida da escritora Graciela Huinao é a comunidade mapuche Walinto, na província de Osorno, sul do Chile. Walinto é também o nome de seu livro, uma homenagem ao lugar onde nasceu, que significa “lugar de patos huala na minha língua materna, em mapudungun, um pato originário que habita somente a parte sul”, como conta nesta entrevista ao Brasil de Fato.

Durante a conversa de uma hora, Graciela revisita sua trajetória, a de seus pais e avós, sua comunidade, percorre um itinerário pessoal diz muito sobre a história do Chile e dos mapuche, inseridos em um conflito que atravessa séculos. Um conflito pelo reconhecimento de suas terras, cultura e língua. Os mapuche são um povo indígena que habitam a região centro e sul do Chile e o sudoeste da Argentina.

Primeira mulher indígena a ingressar na Academia Chilena de Letras (Academia Chilena de la Lengua, en espanhol), onde ocupa uma cadeira desde 2014, ela comenta também como este reconhecimento a seu trabalho podem ampliar a visibilidade de seu povo, em especial a das mulheres mapuche, ao assumir que “através dos meus textos, continuo lutando, de alguma forma, por fazer conhecer o que meu povo sofreu e que segue sofrendo na democracia”. 

Na entrevista, concedida gentilmente ao Brasil de Fato, Huinao fala sobre a poesia de sua língua, sobre a voz de suas antepassadas, reflete sobre o que significa ser uma poeta dos povos originários e sobre como a pobreza e os "nãos" do mundo branco não a impediram de seguir escrevendo. Confira a íntegra dessa conversa abaixo, assim como cinco poemas traduzidos pela primeira vez ao português.

Brasil de Fato: Quando você começou a escrever poesia? O que é poesia para você? E como é a recepção da sua poesia no seu povo e no Chile em geral?

Graciela Huinao: Faço poesia desde muito pequena. Acredito que desde quando comecei a aprender a ler e a escrever, comecei a escrever poesia. Mas não poesia, eram coisas que saíam de mim como criança. Quando tinha doze ou treze anos, escrevi sobre uma galinha. Depois, conforme fui crescendo, meus companheiros me chamavam de poeta, mas não por ter escrito algum verso ou poema. Me diziam: "Passe o lápis para a poeta", e eu virava a cabeça, porque sabia que era eu. Escrevia cartas que meus companheiros de sala me pediam, na adolescência, quando era recente a experiência do amor. Não existiam os meios de comunicação que existem hoje, então eles me pediam uma carta e eu escrevia como eles pediam, e eles, por sua vez, mandavam à pessoa que queriam, que eram as meninas do mesmo curso. Isso eu fazia. E, posteriormente, quando era mais adulta, aos dezoito anos, aí eu já escrevia poesia, no meu aniversário ou em datas importantes. Mas nunca deixei de escrever. Acredito que em poucos dias da minha vida eu não escrevi nada.

Escrevo sobre o meu povo, mapuche williche, pertenço a esse povo, meus quatro avós são mapuche, toda a minha família pertence a esse povo e a história do povo mapuche não é contada nas escolas. Existe somente uma parte que o Estado, ou a sociedade chilena, conhece, que é a parte da chegada dos espanhóis. Talvez aí no Brasil aconteça o mesmo. Mas a pior luta, a mais terrível, a mais macabra, é a invasão do exército chileno aos povos originários.

Eles se enfureceram com o povo mapuche desde aquele momento até os dias atuais. Então, vendo essa repressão, esse ocultamento do meu povo, da minha cultura, de tudo que envolve a minha vida, é que decidi contar, através dos versos e dos relatos, a história do meu povo. E desta maneira fui ficando conhecida e, atualmente, já publiquei quatro livros e estou muito envolvida na literatura nacional do Chile, mas muito envolvida na cultura do meu povo, e acredito que este é um dever não apenas meu, mas de cada mapuche, de cada originário, não só do Chile, mas de toda a América, porque é uma história que não está contada.

Seu primeiro poema, ou sua primeira coletânea, saiu em 1989 e, depois, seu livro foi publicado só em 2001. O que explica essa distância? Como foi este processo entre o poema e o livro?

É a pobreza. Eu não tinha os meios suficientes para publicar um livro. Tive que trabalhar incansavelmente, "deixei os pés na rua" [expressão chilena dejar los pies en la calle, que indica um longo caminhar] para poder juntar dinheiro, porque nenhuma editora confiava nos povos originários nessa época. Estamos falando de 1989, uma época muito dura para este país, e eu não tinha os meios necessários para fazer os contatos e chegar a uma editora.

Aqui no Chile, a literatura é de elite, infelizmente. Eu não posso dizer que trabalho com literatura, com poesia, porque aqui esse trabalho não existe, é visto como hobby. As pessoas como eu, com poucos recursos, não tínhamos e não temos ainda a possibilidade de poder publicar um livro.

Como foi esse processo de enfrentar o “não” das editoras?

Eu bati em umas mil portas da literatura para que pudessem abrir a porta e me dessem um espaço. Essas mil fecharam as portas. Mas como sou teimosa, voltei a bater, voltei a bater, até que se abriu uma janela, pela qual entrei e fiquei.

Agora, temos mais de cem escritores de línguas originárias publicados no Chile. Mas eu fui a primeira, e ser a primeira é ser a ponta de uma flecha, uma flecha que vai abrindo o caminho no qual hoje em dia circulam muitas mulheres. Mas ser a primeira custa caro. Não estou arrependida, não olho para trás com pena, mas tudo que passei me dá mais força, mais coragem. E hoje em dia posso dizer que meus livros, que a minha poesia e meus relatos estão publicados em mandarim, em hebraico, em línguas que eu nem sabia que existiam. E mais, estão publicadas nas línguas originárias da América.

Para chegar a isto, tive que passar por muitas coisas amargas. Naquele momento, eram goles amargos, mas hoje eu não os sinto assim, porque era pelo meu povo, é pelo meu povo, é pelas gerações de mapuche que me antecedem. Então, penso que nossa luta atual, como poetas, de qualquer área da cultura, é um grãozinho que está aí, algo de todos que vivemos e temos uma língua-mãe e damos nossa contribuição. Estamos fazendo história.

Há uma frase comum no feminismo que diz que o corpo é o primeiro território das mulheres. Então, pensando a mulher como um sujeito que não é universal, que os mapuche estão em uma luta constante pelos seus territórios, como a questão de ser mulher e ser mapuche aparece em sua obra?

Eu escrevo principalmente sobre as mulheres do meu povo, quando comecei a escrever, percebi que existiam escritores [mapuche] homens antes de mim, mas não havia nenhuma mulher. Não é que eu tomei a liderança, mas meu coração, minha mente, meu corpo, me diziam que eu tinha que escrever sobre, recolher [tomar] a voz das mulheres do meu povo. Porque a minha avó foi uma grande mulher, possivelmente, foi a primeira poeta, ou sua mãe, ou sua avó, ou sua bisavó, mas nenhuma delas aprendeu a ler e escrever. Dos meus quatro avós, apenas um, juntando as letras, lia. Os outros não escreviam. Mas tinham uma sabedoria tão grande, uma sabedoria universal, que me sinto sortuda, porque eles me transmitiram esses conhecimentos mapuche, porque a história dos povos originários é uma história oral.

E tenho que escrever sobre as mulheres, porque sempre a História ressalta só os homens. E nós mulheres vivemos escondidas, vivemos atrás das costas dos homens. Mas no meu povo existem grandes mulheres, mulheres que guerreavam, que lutavam . Então me apoderei da voz das minhas avós, porque foram mulheres que não tiveram voz, porque se, para mim, foi difícil, imagine na época em que elas viveram, ou o que viveram minhas bisavós, que foram perseguidas. A avó da minha avó foi perseguida por ser mapuche, junto com toda a sua família. 

Quando eu participo de uma apresentação em outro país, penso nelas e digo que no país dos mortos, como dizemos, minhas avós devem estar alegres por saber que eu estou continuando a luta que elas começaram, e que não puderam nunca expressar sua dor. E a única coisa que faço é recolher a voz das mulheres do meu povo e transpô-la ao livro.

É possível que eu não seja a poeta, a escritora, porque tudo está escrito na minha memória e aquilo que eu faço é buscar na minha memória, colocar para fora essas palavras que minhas avós colocaram aí e desaguá-las em palavras. Isso é o que eu faço.

Você é a primeira mulher não-branca a ingressar na Academia Chilena de Letras. No Brasil, há pouco tempo, Conceição Evaristo, uma escritora brasileira negra, teve sua entrada recusada pela Academia Brasileira de Letras, e isso gerou uma discussão sobre a questão de ser um espaço institucional de homens brancos. Nesse sentido, gostaríamos de saber da sua experiência, como é ocupar esse espaço no Chile, o que significa?

Em 2018, em novembro, fez quatro anos que estou na Academia Chilena de Letras, sem saber, eu fui a primeira mulher indígena a entrar na Academia do Chile, não só do Chile, mas da América. Mas, nessa época, quando eu entrei, eu não sabia disso. E, realmente, é um espaço que prima pelos homens aqui no Chile também. Acredito que cerca de 80% são homens. Eu nunca tinha pensado que chegaria à Academia. E não fui eu somente, claro, é o meu corpo que senta ali. Mas o que abriu a porta da Academia foram meus livros, meus textos e apresentações, as entrevistas que dei. Isto é, foram muitas coisas se somando para que eu pudesse estar ali, entre elas, que alguém coloque o meu nome ali, e foi uma poeta, Delia Domínguez, que vem do mesmo lugar que eu, onde eu vivo, que o fez. 

Cada poeta ou cada escritor quer ou deseja que seu nome esteja inscrito ali. Mas, como eu disse, meu nome foi indicado à Academia mas eu não sabia o que seria estar ali e, agora, pude fazer grandes coisas na Academia e fico feliz por estar ali.

A única coisa que posso dizer é que, aqui no Chile, minha nomeação e minha eleição — porque os acadêmicos votam, com as mãos levantadas — foram unânimes, não teve nenhum membro da Academia chilena que foi contra ou se retirou da votação sobre a minha candidatura. E eu acredito que isso não conquistei eu, mas sim meus versos.

Pensando na questão da identidade, chegamos também à questão da língua. Lemos algumas entrevistas suas, nas quais você comentava que seu pai foi alfabetizado em espanhol aos 12 anos, e nunca falou em mapudungun [língua mapuche] com você…

Meu pai viveu durante toda a sua vida na comunidade que dá nome ao meu livro, Walinto, que significa lugar de patos huala na minha língua-mãe, em mapudungun. O pato huala é um pato originário que habita somente a parte sul, e esse é o nome da minha comunidade.

E meu pai nasceu em 1907, e quando tinha 12 anos foi mandado para a escola como forma de pagamento, ao roubarem suas terras, a comunidade foi diminuindo. Ele, por quatro anos, foi à escola e, quando chegou ao colégio, não falava espanhol, só mapudungun, sua língua materna, e no colégio apanhou: ele, seus amigos, seus irmãos. Por cada palavra que meu pai dizia na sua língua, recebia um golpe de vara nas mãos, em cima da carteira, com uma varinha que parece um chicote.

Porque eles tinham que falar a língua celestial, que era o castelhano, e esquecer a língua do inferno, que era o mapudungun. Depois, quando nós começamos a ir para a escola, meu pai não nos ensinou mapundugun, eu não nasci e aprendi a falar mapundungun. Minha avó falava muito mal o castelhano, os sons da língua espanhola, cada vez que eu ia falar com ela, me respondia em castelhano, porque meu pai dizia que se eu fosse para a escola falando mapudungun, seria castigada como fizeram com ele.

E, felizmente, eu posso dizer que meu pai jamais me bateu, nem a minha mãe. Então, para ele, se apanhássemos na escola, eu acredito que ele ficaria com o coração partido, por saber que seus filhos, que não apanhavam em casa, apanhavam na escola.

Mas quando eu vim para Santiago [capital do Chile], algo me faltava, era a minha língua materna. No entanto, eu tinha alguns sons do mapudungun na mente, ao escutar meu pai falar com a minha vó ou com algum amigo no campo. E eu estudei o mapudungun aqui em Santiago, com uma professora que se chama Clara Antinao, uma linguista, ela me ensinou o mapudungun por sete anos. Essa é uma dívida que tenho, porque entendo 80%, mas não falo por medo de errar, essa é a minha situação atual.

Tudo isso que você fala nos conta muito sobre a política linguística do Chile. Neste sentido, existe alguma tentativa de reparação, de considerar as línguas mapuche como parte do território chileno?

Não existe. Aqui somente existem políticas para o espanhol, inglês e francês, e outros idiomas como o mandarim, o português, alemão. Nos colégios, estas línguas estão disponíveis. Mas o mapudungun não, não está registrado no Ministério da Educação aqui no Chile. Mas sim o inglês; é obrigatório que as crianças aprendam inglês e o francês também, em alguns colégios. No entanto, hoje em dia, alguns prefeitos que foram eleitos pelo povo mapuche, que são mapuche, e eles implementaram em suas cidades o mapudungun, contratando professores de cultura mapuche.

Onde eu vivo, nos arredores da capital Santiago, eu sou contratada pela prefeitura desde 2008 para dar oficinas sobre literatura e cultura mapuche nas bibliotecas públicas. Mas não é porque seja lei, não existe nenhuma lei que respalde a cultura mapuche.

Neste sentido, a sociedade chilena tem uma dívida muito grande com os povos originários, não só com os mapuche, mas também com os aymara, com o rapa nui, com os nove povos que habitam essa terra, para conhecer suas raízes. Porque para saber aonde ir, é preciso saber de onde se vem.

Eu sei de onde venho, da minha história, mas os chilenos não sabem. E se alguém afirma que eles vieram da comunidade mapuche, eles negam, se sentem ofendidos. O vírus da discriminação se espalhou tão fortemente na mentalidade chilena, que vai demorar muito para extirpá-lo. Este é o desafio do Ministério da Educação, criar uma lei, porque não só os mapuches querem aprender suas raízes, outros setores do povo chileno têm que conhecer.

Todo idioma carrega uma visão de mundo, uma cosmovisão. Você escreve em castelhano, mas os elementos da cosmovisão do seu povo estão presentes na sua poesia.

A cosmovisão do povo mapuche é tão rica e abundante, mas só nós, mapuche, a vemos. O povo chileno não a vê. Por exemplo, eu todos os dias abro a minha cortina, olho as árvores que estão lá fora, o céu, a noite, as estrelas, a lua – se está minguante ou crescente –, essa relação que os povos originários têm com a natureza não está presente no povo chileno. E eu, de alguma maneira, quero transmiti-la também, não como um conselho de que eles vejam o mundo como veem os povos originários, mas para serem mais amigáveis. 

Porque para se aproximar das pessoas, é preciso um pouco de contemplação, é preciso olhar ao redor. E acredito que isso é parte fundamental do povo mapuche e de todos os povos originários. É a irmandade com a natureza, que se traduz em um grande respeito. Nós não destruímos a natureza porque a natureza é parte de nós, é nossa aliada.

Aqui no Brasil, estamos vivendo um período de ascensão da extrema direita, com Jair Bolsonaro. Você pode comentar um pouco da história moderna dos mapuche, durante o regime do general Augusto Pinochet, que comandou uma ditadura militar de 1973 a 1990, e como estão agora.

Eu era muito jovem quando aconteceu o golpe de Estado, estava no primeiro ano do ensino médio, vivia no sul, e tudo o que tínhamos em casa era um rádio a pilha, e a voz demorava uns dez minutos para sair, porque o tubo precisava esquentar primeiro, era o único meio que existia na minha casa. E meu pai foi um trabalhador e dirigente sindical, mas, por sorte, tinha se aposentado no ano anterior, em 1972, e por isso não foi perseguido, porque a partir de 1973, os dirigentes foram perseguidos, torturados e mortos.

Mas quando teve o golpe de Estado, eu não sabia o que [isso] significava, e a vida me ensinou o quanto era terrível e inumano é um golpe de Estado. Até hoje. Ainda que a democracia tenha chegado no Chile, mas não chegou para os povos originários. Ficamos fora da democracia. Nunca um governo demonstrou algum carinho pelos povos originários, mas no governo de Pinochet, se já éramos pobres, ficamos mais pobres, porque Pinochet queria inclusive que os mapuche deixassem de ser mapuche e que passassem a ser chilenos. Mas nascemos mapuche e vamos morrer mapuche. Não tem como obrigar um povo a se vestir, pensar e acreditar em outras coisas aprendidas depois de virar adulto.

Ou seja, Pinochet foi um calvário para os povos originários. Mas acredito que eu e todo o meu povo criamos ilusões com a democracia quando ela chegou. Que seríamos mais reconhecidos, que poderíamos falar mapudungun nas escolas. Nos fizeram muitas promessas e nós apoiamos para nos livrar do açoite da ditadura. Saímos para marchar, o povo mapuche também lutava [contra a ditadura], mas o que adiantou? Para nós, muito pouco. Porque até agora não recebemos nada dessa democracia. Como consequência, continuam matando os mapuche, há nove homens mapuches assassinados na democracia. E aqueles que os mataram não estão presos. E por quê? Porque os mortos são mapuche. 

Eu não quero que o Chile nunca mais tenha uma ditadura, mas os governos de alternância não estão preocupados com os povos originários. E nós estamos exigindo do povo chileno que devolva o que nos roubou e, entre essas coisas, está a terra. É por isso que hoje em dia meu povo continua lutando. E, por isso, que eu, através dos meus textos, continuo lutando de alguma forma, por fazer conhecer o que meu povo sofreu na ditadura e o que segue sofrendo na democracia.

O que é poesia para o povo mapuche?

Minha língua, o mapudungun, é pura poesia. Acredito que é uma língua muito poética e, talvez, venha daí o ditado de que cada chileno é um poeta, mas deve vir do povo mapuche. Para mim, a poesia é tudo. O ar que respiro, norte e sul. O dia que eu deixar de escrever será o dia em que vá para debaixo da terra, ou que eu tenha alguma doença grave.

E não quero que os meus livros, os relatos que eu ouvi desde criança, morram comigo. Porque eu conheci as florestas do sul, com árvores milenares, que desapareceram. Eu quero que as próximas gerações de mapuche possam ler e encontrar essa floresta que conheci, vê-la através das minhas palavras, encontrar esse rio limpo que eu vi. 

Hoje, nós dizemos "vou comprar uma maçã" e vamos à feira, inclusive eu, mas não tem aroma de maçã como aquela que colhíamos do pé, que era aromática, e que inundava toda a casa, isso já não existe. Isso é o que eu quero transmitir através dos meus textos, aquilo que conheci e que a natureza me ofereceu e fazê-la conhecida, porque eu sei que as crianças, os futuros mapuche, das gerações futuras, não a conhecerão, porque o desmatamento está destruindo.

Essa matéria faz parte do especial Março das Mulheres, produzido pelo Brasil de Fato. As fotos foram cedidas pelo projeto Escritores Indigenas, que retrata a voz e a imagem de mais de vinte poetas mapuche chilenos.

Coordenação e edição: Vivian Fernandes | Tradução: Pedro Ribeiro Nogueira e Luiza Mançano | Fotos Alvaro de la Fuente/Dialogo (cedidas pelo autor) | Artes: Ana Flávia de Oliveira | Coordenação de artes: José Bruno Lima