10 mortos

Pousada que pegou fogo em Porto Alegre tinha autorização da prefeitura para atuar sem alvará

O fogo no imóvel que, em convênio com a prefeitura, abrigava pessoas em vulnerabilidade, matou 10 e feriu 15

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Pousada recebe verba do município para pagamento de aluguel social de famílias em vulnerabilidade - Reprodução/X da deputada Daiana Santos

A Pousada Garoa, cujo incêndio de um de seus imóveis na última sexta-feira (26) matou 10 pessoas e feriu outras 15, atende pessoas em vulnerabilidade social por meio de um convênio com a prefeitura de Porto Alegre (RS). A rede de hospedaria atua com uma certidão que dispensa alvará de funcionamento e, portanto, torna a fiscalização menos rígida. 

Esta Emissão de Autodeclaração de Dispensa de Alvará pode ser feita na capital gaúcha desde que, em 2020, a Câmara de Vereadores aprovou a Lei Complementar Municipal nº 876/2020.

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Na prática, atividades consideradas de “baixo risco” ficam dispensadas de uma vistoria e autorização para funcionar e tem as documentações exigidas flexibilizadas. Podem prescindir de alvará as empresas cujos locais tenham até 200m² e três pavimentos, com lotação máxima de cem pessoas. 

Foi o caso da Pousada Garoa, uma rede de 35 unidades que existe desde 2010, cujas vagas são compradas pela administração municipal para encaminhar pessoas em situação de rua ou mantidas por aluguel social. Renovado em dezembro de 2023, o contrato com a prefeitura de Sebastião Melo (MDB) prevê um investimento mensal de R$225 mil para a empresa. De acordo com O Globo, a Pousada Garoa recebeu, em um ano, cerca de R$2,7 milhões em aluguel social.  

Uma consulta no site da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo (SMDET) confirma que a Pousada Garoa está “isenta de alvará”.  

A política da gestão municipal é criticada por entidades como o Movimento Nacional de Luta por Moradia no RS, que denunciam o fechamento de vagas em albergues e abrigos para a priorização da contratação de alojamentos da iniciativa privada, funcionando comumente sem condições mínimas de segurança, higiene e fiscalização. 

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O Brasil de Fato entrou em contato com o Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul questionando se a empresa possuía Plano de Proteção contra Incêndio (PPCI). Em alguns veículos da imprensa se veicula que não. Não houve resposta até o fechamento da matéria. Com o retorno, a informação será atualizada.  

Já o dono da Pousada Garoa, Andre Luis Kologeski da Silva, com quem a reportagem também tentou contato, fez declarações públicas de que a empresa possui “todas as documentações que a legislação exige”.  

Ao visitar o local da tragédia, o prefeito afirmou que na licitação os documentos estavam regulares, mas que “entre o papel e a realidade” há diferença e que é provável que o contrato seja rompido.  

O incêndio 

O fogo se alastrou rapidamente pela pousada da avenida Farrapos na madrugada de sexta-feira (26), por volta das 3h45. Sua causa é ainda desconhecida, mas incêndio criminoso não foi descartado. Os dois prédios tinham 60 vagas, 16 delas custeadas pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), da prefeitura.  

Além das 10 mortes, cinco pessoas estão internadas em estado grave, de acordo com a Secretaria de Saúde. Dois deles foram entubados, um por trauma e outro por ter inalado muita fumaça.  

Não é a primeira vez que uma unidade da Pousada Garoa pega fogo. Em novembro de 2022 um incêndio no imóvel da rua Jerônimo Coelho, no Centro Histórico, matou um homem. Três meses antes, o deputado Matheus Gomes (PSOL-RS) havia protocolado na Câmara Municipal de Porto Alegre uma denúncia de que, com lixo, insetos e ratos, as condições dos quartos da Pousada Garoa eram “insalubres e indignas”. 

Edição: Camila Salmazio