Minas Gerais

Violência

Repressão aos professores mineiros lembra episódio da ditadura

Profissionais da educação infantil foram atacados com bombas, gás e jatos de água. Governo vai investigar caso

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
Gravações registraram truculência da PM
Gravações registraram truculência da PM - Reprodução de vídeo

Nessa segunda-feira (23), Belo Horizonte se assemelhava à capital mineira de 1979. Na data, quando a ditadura militar ainda perdurava, professores e professoras da rede pública – a maioria mulheres – foram atacados pelas autoridades com bombas, gás lacrimogêneo e jatos d'água na Praça da Liberdade, enquanto manifestavam por melhores salários e condições de trabalho.

Quase 40 anos depois, a forma de repressão usada pela Polícia Militar (PM) foi praticamente a mesma da escolhida para o ato dos professores da educação infantil realizado no início desta semana.

O protesto era para reivindicar a principal pauta da greve da categoria: um salário equivalente ao que os profissionais do ensino fundamental recebem. Hoje, trabalhadores da educação infantil ganham apenas 65% da remuneração, mesmo com formação acadêmica igual.

A reivindicação existe desde 2014 e, de acordo com o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (SindREDE-BH), o pedido de negociação foi enviado à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) no dia 6 de abril.

No ato, dois educadores foram presos, Wanderson Rocha e Maria da Conceição Oliveira Silva. Presidenta do SindREDE, ela tem 58 anos e deu aula por 32. A sindicalista afirmou nunca ter passado por uma situação parecida. "Em três décadas de luta já vi muita truculência da polícia, mas com esse uso de força eu não me lembro", diz.

Conceição relata que, em todas as vezes que pediu para que os trabalhadores fossem recebidos pelo prefeito e seu vice, não foi atendida. Foi então que a categoria decidiu ocupar a avenida Afonso Pena.

A polícia teria pedido para eles desobstruírem a via e mesmo quando o pedido estava sendo atendido, segundo a professora, o choque entrou em ação. "Fomos surpreendidos com uma chuva de bombas de efeito moral, gás, nem sei bem ao certo porque foi uma coisa violenta". Logo depois, o 'caveirão' teria vindo com os jatos d'água. Ela conta que Wanderson foi arrastado e tem escoriações por todo o corpo.

Os dois ficaram detidos durante a segunda-feira, sendo liberados no fim do dia. A primeira audiência do processo contra os professores acontecerá no dia 21 de junho.

Polícia e Kalil se pronunciam

Durante coletiva de imprensa realizada também na segunda (23), a PM declarou que a dispersão dos manifestantes "foi técnica", “obedeceu aos critérios técnicos e protocolo padrão" e que "não foi ordenada nem pela PBH nem pelo governo do Estado".

Já o prefeito Alexandre Kalil (PHS) afirmou que o sindicato teria contrariado os interesses dos professores ao fechar a rua e que não aceitará mais "baderna". “Se querem a desordem e provocar as cenas que interessam a eles politicamente, toda vez que fizerem [a cena], nós vamos proporcionar a cena para eles”, finalizou.

A presidenta do SindREDE contesta o pronunciamento do Executivo municipal. Para ela, a ação marcou a gestão de Kalil como "truculenta e pouquíssimo preparada para uma cidade com a complexidade de Belo Horizonte". "O prefeito sai da sua função ao opinar sobre a organização dos trabalhadores. Nós decidimos como vamos nos organizar para lutar. Se ele quer uma educação realmente boa, cabe tratar os trabalhadores com dignidade", se posiciona.

Conceição salienta, ainda, que a greve é um direito dos trabalhadores. "Professora da educação infantil ganha, com os descontos do contracheque, aproximadamente R$ 1200. Essas mesmas professoras, que constroem uma educação que ele gosta de falar que é exemplar, o prefeito chamou de arruaceiras", completa.

Investigação

Pedida pelo governador Fernando Pimentel (PT), uma sindicância será aberta para apurar se houve excessos na ação da PM. Se confirmadas, de acordo com o Governo de Minas, as arbitrariedades serão punidas.

Veja vídeos do momento da ação da PM:

 

Edição: Joana Tavares