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Marx, o retorno para Colônia e o seu banimento

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Marx e a esposa foram presos e banidos da Bélgica - Foto: Reprodução
Marx foi o redator-chefe da “Nova Gazeta Renana” revista lançada em 1º de maio de 1848

O lançamento do Manifesto do Partido Comunista, em 1848, coincidiu com uma grande crise econômica nos centros industriais da Europa, além das agitações políticas em vários países europeus.

Primavera dos povos

Na França, sob a liderança de Louis Blanc, surge uma revolta popular que uniu parte da burguesia e uma grande camada proletária urbana, que vieram a reivindicar o sufrágio universal. Ao longo do movimento, a burguesia se afasta dos operários, no entanto, estes conseguem a união de estudantes e artesãos, além deles a revolta ganha corpo, ao crescer através de partidários de reformas sociais e milhares de desempregados.

Isso faz com que o rei Luis Felipe abdique, nascendo daí, a Segunda República (1848-1852). Essa Revolução ocorrida em Paris em 1848, foi o estopim para uma série de revoltas que ocorreram na Europa nesse mesmo ano.

Revoltas de 1848 entram para a história como a “Primavera dos Povos”

Na Suíça, democratas enfrentam um movimento separatista interno do clero, as potências reacionárias da “Santa Aliança” dão todo apoio a este movimento separatista, o que traz grande incentivo aos democratas de todo o continente europeu.

No Norte da Itália, os democratas saem às ruas entrando em luta com a polícia dos conservadores. Em Palermo, manifesta-se uma intensa e colérica agitação popular, inicia-se assim a Revolução dos Estados Italianos. E assim, vão surgindo: A Revolução dos Estados Alemães; a Revolução da Áustria; a Revolução dos Checos e a Revolução dos Húngaros. Surge então, como Marx previra no Manifesto, a Revolução Comunista de âmbito universal. Tais Revoltas de 1848 entram para a história como a “Primavera dos Povos”.

Golpes, repressões e banimento

Nesse ínterim Marx já estava se preparando para deixar Bruxelas quando foi vítima de alguns episódios aborrecedores. O rei Leopoldo da Bélgica, genro de Luis Felipe da França, sente-se ameaçado pela extinção política do sogro, isso o leva a fazer uma aliança com o partido liberal desfraldando uma violenta repressão contra os democratas, contra os republicanos e em particular contra o movimento operário.

Marx é preso no decorrer dessa repressão; logo depois, sua esposa também é presa. A imprensa protesta contra essa arbitrariedade dada ao casal. As manifestações não impedem que o casal seja banido da Bélgica a pedido do governo da Prússia.

Ao chegar a Paris, em 6 de março de 1848, Marx encontra um ar de animação progressista, onde Adalbert von Bornstedt[1] apoiado por Herwegh[2] e Bakunin[3], organiza um exército de refugiados (de bandeira negra, amarela e vermelha) com o qual pretende invadir a Alemanha, financiado pelo governo provisório da França, a fim de livrar a França o mais rápido possível dos refugiados.

Marx se declara contra a invasão da Alemanha, uma vez que para ele a libertação deveria ser feita de dentro para fora e não de fora para dentro. Na sua opinião os refugiados deveriam voltar de forma pessoal à Alemanha lá então, deveriam se organizar com a intenção à revolução das massas. Ele então, é chamado de “covarde” e “traidor” ao se opor a essa aventura militar. Seu ponto de vista é confirmado pelos fatos aos quais vieram a se suceder. Tal invasão foi uma tolice, pois, a reação de grande parte da população alemã, levou a uma atitude de má vontade para com os republicanos e os socialistas, onde são acusados de “falta de patriotismo”.

Marx é tentado a se envolver em outras operações militares. Ele, no entanto, não se deixa intimidar, pois prometem-lhe devolver seu antigo ducado; Marx não se desvia do caminho da “sensatez revolucionária”

Outro tipo de ação é exigido na Alemanha: Metternich[4] havia caído e o rei Frederico Guilherme IV estava assustado, fazendo concessões aos liberais e aos constitucionalistas. É processada uma democratização interna parcial e monetária.

Marx e Engels aproveitam desse momento e, no dia 10 de abril de 1848, regressam à Colônia, na Prússia Renana, exatamente onde ambos haviam nascido e o lugar onde ambos escolheram para ser a sede da “Nova Gazeta Renana”, revista essa cuja primeira publicação aparece no dia 1º de maio de 1848. A essa nova revista, cabia defender a posição da “ala esquerda” da liberal democracia. Marx fica como redator-chefe, enquanto Engels, Burgers, Dronke, George Weerth, Ferdinand e Wilhelm Wolff formariam o quadro dos seus colaboradores definitivos.

Mesmo dentro do movimento operário, surge uma oposição à linha “conciliadora” e “reformista” da Nova Gazeta Renana. O líder dessa oposição de “esquerda” era o médico André Gottschalk. Segundo ele, a vanguarda do movimento operário deveria apresentar um programa claro e rigorosamente comunista, além de lutar por sua imediata realização, além disso, ele era contrário à participação dos comunistas nas eleições. Marx denuncia o “oportunismo” de Gottschanlk sob a máscara do aparente “radicalismo”.

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Marx enquanto pôde, procurou aproveitar as oportunidades ainda abertas para um trabalho político em aliança com os democratas. Mas, essas oportunidades foram desaparecendo. Já, ao final de 1849, Marx ainda mantinha esperança em um novo levante do proletariado francês. A esperança, no entanto, vai por água abaixo, pois a situação internacional piorou, além da situação interna. A burguesia alemã adota uma política de conciliação em face das forças nacionais locais, o que facilitou o fortalecimento delas.

Arbitrariamente o governo fecha o Congresso, decretando estado de sítio em Colônia: a publicação da Nova Gazeta Renana é temporariamente suspensa.

Engels: oficial estrategista

É expedido um mandado de prisão contra Engels, que se vê obrigado a sair da cidade, com ele saem Dronke e os irmãos Wolff, também perseguidos. Engels chega a Bruxelas, mas, com a polícia no seu encalço ele decide ir para a Suíça. Sem um tostão sequer no bolso, Engels segue a pé em sua jornada.

Os democratas do Sul da Alemanha se insurgem contra o fechamento do Congresso, pegando em armas para defender a legalidade. Engels se alista na tropa da região de Baden onde se notabiliza como oficial estrategista. No entanto, os democratas são derrotados devido à superioridade militar do governo e das inúmeras disputas internas. O batalhão de Engels é obrigado a inserir-se na Suíça.

Retorno da Nova Gazeta Renana

Ao final do estado de sítio instaurado, a Nova Gazeta Renana volta, mas sem Engels, Dronke e os irmãos Wolff. Além disso, a Nova Gazeta Renana está sem fundos, pois mais da metade de seus assinantes haviam cancelado as assinaturas, o que obriga Marx a fazer empréstimos em seu nome para sustentar a revista, tudo inutilmente, mas devido às condições econômicas instáveis, não impedem que a linha política da revista viesse a ser mais radical e mais agressiva do que antes.

Devido aos ataques de Marx, na revista ao governo, este decide processá-lo. Ele afirma diante dos juízes que o governo havia dado um golpe, desrespeitando as leis existentes, de maneira que só com muita hipocrisia poderia pretender aplicar tais leis contra os seus adversários vencidos. O tribunal de Colônia então absolve-o.

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No entanto, após desistir dos meios legais, o governo aproveita da ausência de Marx na cidade por um certo momento, e desferi um golpe fatal na Nova Gazeta Renana, ao decretar o banimento de Marx do país.

Refúgio em Londres, onde permanece até o fim de sua vida

Em maio de 1849, sem recurso algum, Marx retorna a Paris, mas sua chegada não é bem-vista pelo governo. Um mês depois, com a ajuda de amigos, que levantam fundos para ele comprar uma passagem para Londres, lá ele chega em 24 de agosto de 1849, logo depois, em setembro é chegada a sua família e em novembro, Engels. Marx permanece em Londres até o fim de sua vida.

Antonio Manoel Mendonça de Araujo é professor de Economia, Conselheiro do Sindicato dos Economistas (SINDECON/MG) e ex-Coordenador da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (ABED-MG)

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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

 

1) Adalbert von Bornstedt (1808-1851), democrata e pequeno burguês alemão; fundador e chefe de redação da Gazeta Alemã de Bruxelas; um dos organizadores da legião de voluntários emigrados alemães de Paris que participou na insurreição de Baden em abril de 1848.

2) Georg Friedrich Rudolph Theodor Herwegh (1817-1875), poeta alemão, considerado parte do movimento da Alemanha Jovem.

3) Mikhail Aleksandrovitch Bakunin (1814-1876), teórico político, sociólogo, filósofo e revolucionário anarquista. Considerado uma das figuras mais influentes do anarquismo e um dos principais fundadores da tradição social anarquista.

4) Klemens Wenzel von Metternich (1773-1859), Príncipe de Metternich-Beilstein, estadista do Império Austríaco e um dos mais importantes diplomatas do seu tempo, a serviço do Ministro do Exterior Imperial desde 1809 e Chanceler a partir de 1821 até a revolução liberal de 1848, que forçou sua demissão.

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Edição: Elis Almeida