Minas Gerais

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Crônica | Envelheço na cidade

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Kamil Macniak - Shutterstock
Uma comemoração para celebrar a vida pode ser um grande alento

De repente, o restaurante se encheu. A barulheira e a gritaria foram gerais. Umas cem pessoas foram ocupando as mesas. Não era confusão nem quebra-pau. Todo mundo estava sorrindo, e a alegria era geral.

Parecia uma comemoração de alguma empresa. Todos estavam com uma roupa igual. De longe, parecia um uniforme. Vi o povo juntando as mesas e colocando um bolo muito grande e uma vela. Era alguma coisa muito especial para toda aquela gente.

O povo falava alto. Muito alto. Vi uns falando:

- Será que ela não vem?

- Claro que ela vem. Vira essa boca pra lá.

Comecei a entender que era uma festa surpresa. Fiquei curioso para saber quem era e quem juntava tanta gente. Cheguei mais perto e ouvi vários elogios.

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De repente, um silêncio sepulcral. Entrei na onda. Também fiquei em silêncio. Os garçons. Até um cachorro que latia na porta do restaurante ficou de boa. Até o povo da cozinha. Nem barulho de carro. Nada.

Vi uma senhora com um olhar muito sereno se aproximando das mesas. Os cabelos brancos e sem qualquer maquiagem. Visivelmente, estava emocionada. Ela não esperava por toda aquela recepção calorosa no dia do seu aniversário. Uma pessoa mais animada já foi puxando os parabéns para ela. Foram uns cinco minutos de cantoria. Todos aqueles cânticos de comemoração foram entoados. Mas o que mais me chamou a atenção foram os discursos feitos àquela senhora muito serena e muito simples. Das cem pessoas, umas vinte fizeram uso da palavra. As palavras que mais ouvi naquele dia na hora do almoço foram:

- Amor. Nós. Gente fina. Gente da gente. Muita humana. Um coração tamanho do mundo. Fala mansa. Nunca falou um palavrão.

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Muitos lembraram casos da empresa. Parece que ela iria se aposentar. Foram várias falas emocionantes.

Uma fala que veio do fundo do coração fez todo mundo chorar foi de uma pessoa que tinha uma retórica retumbante. Ela lembrou que seu primeiro aniversário foi comemorado na empresa. Lembrou que nunca tinha tido uma festa de aniversário. Lembrou que a festa foi organizada pela homenageada do dia. Nunca esquecerei minha primeira festa. Meu primeiro bolo.

Nesses dias tão estranhos que estamos vivendo, uma comemoração para celebrar a vida pode ser um grande alento.

Rubinho Giaquinto é covereador da Coletiva em Belo Horizonte.

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Este é um artigo de opinião e a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Elis Almeida