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Quem sabe fazer escolhas difíceis?

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Foto 1: Emilly Firmino - Foto 2: Ana Carolina Vasconcelos
Nesta altura do campeonato, deveria ser uma escolha fácil, como foi para Simone Tebet

A “direita democrática” brasileira está pagando um alto preço pela “escolha difícil” que fez depois de 2014: para implementar o programa de destruição da dimensão econômica da Constituição de 1988 derrotado nas urnas, optaram por abrir uma porta do inferno direto para dentro da política brasileira. Na avidez de chegar ao poder dois anos antes do previsto, entregaram tudo nas mãos de militares mamateiros, vendilhões de templos e milicianos cariocas. Não sabiam, mas estavam assinando uma autorização de eutanásia assistida pela doutora Nise Yamaguchi.

A “direita democrática” foi a maior perdedora do primeiro turno das eleições brasileiras. Partidos, como o MDB, diminuíram ainda mais na eleição. Mesmo o “centrão” viu alguns de seus quadros serem dispensados para dar lugar a mais fascistas, inclusive versões em miniatura. O PSDB parece estar na última esquina de seu cortejo fúnebre. A imprensa comercial brasileira – segundo partido mais forte da “direita democrática”, atrás apenas da parcela não-fascista do Judiciário – caminha para a irrelevância. O principal produto impresso do grupo Folha-UOL são os recibos de maquininhas da PagSeguro.

A esquerda brasileira também enfrentou grandes escolhas difíceis na última década. O Partido dos Trabalhadores, acossado pelas investigações parciais da Lava Jato, por uma imprensa tão irascível quanto incansável, com sua maior liderança presa, olhou nos olhos do abismo. Os movimentos sociais também viveram maus bocados: sindicatos levaram golpes pesados com a reforma trabalhista e, sem espaço para negociação e com ameaças crescentes, os movimentos populares ficaram acuados.

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No entanto, ao contrário da tal “direita democrática”, a esquerda sabe fazer escolhas difíceis. Cerramos fileiras e entendemos que a sobrevivência dos movimentos populares depende hoje do sucesso eleitoral de Lula. Entendemos que o sucesso de Lula, por sua vez, dependia de assumir a responsabilidade de fazer a Constituição de 1988 atravessar a atual tempestade. Engolimos alianças e alianças, fizemos campanhas inimagináveis uma década atrás. Contra a violência bolsonarista, estamos colocando o bloco na rua, vestindo o vermelho e trabalhando pesado.

A recompensa tem vindo, ainda que não na velocidade que gostaríamos. A esquerda cresceu no Congresso e, por muito pouco, não levou a eleição presidencial no primeiro turno. O MST elegeu seis deputados e deputadas. Dentro do PT, sinais de uma tão necessária renovação de quadros – e renovação à esquerda – começam a despontar e a se afirmar em suas posições. A bancada de esquerda em Minas deu sinais claros com Dandara e Bia Cerqueira, por exemplo. O PSOL não apenas sobreviveu como cresceu.

Há também escolhas fáceis

Cada um com suas escolhas difíceis. Mas há também as escolhas fáceis. Não há escolha mais fácil que aquela enfrentada pela “direita democrática” em 2022. Para os fiscalistas, a escolha é entre Lula, disposto a negociar uma nova solução fiscal, e Bolsonaro, que enforcou a última regra fiscal com as tripas da legislação eleitoral. Para os juristas, temos uma escolha entre Lula, que escolheu não ir para o exílio e passar 580 dias na cadeia para provar sua inocência, e Bolsonaro, cujo vice-presidente já apresentou a nova edição do Ato Institucional número 2 da ditadura para colocar o Supremo Tribunal Federal sob seu controle.

Enfim, não cabe listar aqui todas as variantes da escolha fácil de 2022. Nesta altura do campeonato, deveria ser uma escolha fácil, como foi para Simone Tebet. Impressiona que parte da tal “direita democrática” ainda não tenha entendido que a escolha fácil de 2022 pode ser feita com base no mais simples instinto de sobrevivência. Uma jornalista que sofreu perseguição bolsonarista grave ao longo dos últimos quatro anos não deveria ter dificuldade em decidir sobre a relevância de perguntar sobre a Nicarágua a menos de duas semanas da eleição. Pelo visto, parte considerável da “direita democrática” não gosta é de ter que escolher.

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Vão seguir em linha reta, esbarrando nas perseguições e nos crimes eleitorais, rodopiando na beira do abismo fascista até dia primeiro de janeiro de 2023. Afinal, independentemente do resultado das eleições, há muito trabalho pela frente: se Bolsonaro ganhar, ano que vem eles terão mais cinco indicações do STF para sabatinar no Roda Viva e no Senado. Se Lula ganhar, terão tapiocas no cartão corporativo para fiscalizar. Espero que eles possam saudar a mandioca no ano que vem.

Pedro Faria é economista e historiador. É pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG e membro do Instituto Economias e Planejamento.

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Larissa Costa