Rio Grande do Sul

Coluna

A PALAVRA

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"A comemoração de final de ano do Brasil de Fato RS com seus colaboradores e equipe teve mil significados" - Divulgação
Longa vida ao Brasil de Fato RS! Ao Verbo e à palavra

A comemoração de final de ano do Brasil de Fato RS com seus colaboradores e equipe teve mil significados. Além do afeto distribuído, da amorosidade, do encontro/reencontro de companheiras/companheiros de muitas lutas e histórias, da música do Unamérica cantada latino-americanamente, a festa e comemoração espalharam-se por todos os poros de um ano, 2022, que finalmente termina.

Saraí Brixner falou do Verbo, da palavra que atravessou corações, almas, corpos e mentes em 2022 via Brasil de Fato RS.

Fui recuperar arquivos e poemas meus de idos tempos, dedicados a Carlos Drummond de Andrade e seus famosos versos de ´O Lutador´, que dizem o que é e significa o Brasil de Fato RS: “Lutar com palavras/ é a luta mais vã./ Entanto, lutamos/ mal rompe a manhã.”

“O REINO DA PALAVRA. O reino da palavra é cercado/ de torres e arames/ por todos os lados./ Guardam-no soldados/ de metralhadoras na mão.

Quem está no trono/ aproveita do tesouro,/ manda recolher dicionários,/ biografias,/ todos os livros./ Ninguém mais tem o mistério nos dados,/ no pensamento.

O reino da palavra/ subverte a cidade,/ embebida de prazeres,/ sem olhos à injustiça,/ ouvidos à loucura,/ consciência dividida.

Abocanha-se dinheiro./ Compra-se tudo/ até a boca que fala/ e denuncia./ Não sobra possibilidade/ de ressurreição.

O peito de aço/ fechou-se em si mesmo, amarrados os pulsos ao movimento,/ à luta do trabalho,/ à destruição da decência no meio das ruas,/ construções marcadas de sofrimento,/ de homens e mulheres abafados-as/ e demolidos-as.

Não conhece o reino da palavra,/ quem para do lado de fora./ É preciso adentrar seu mundo,/ abrir a porta,/ torná-lo público,/ à escolha do povo,/ dos humildes, dos pobres,/ da gente toda./ Para não converter a cidade/ no circo da morte” (Selvino Heck, poema escrito nos anos 1970, em plena ditadura, do livro MIGRANTE, nunca publicado, muito atual em 2022).    

Katia Marko escreveu em sua página no Facebook sobre a gloriosa noite do Brasil de Fato RS: “Uma noite em que a palavra teve um lugar de honra. Uma noite regada a afeto, reconhecimento, admiração, música e mástica, com a deliciosa paeja da Graça e do Pedrão. Uma noite para nos olharmos nos olhos e nos reconhecermos companheiras/os por um mundo com justiça social e que a humanidade seja nosso norte. Viva o Brasil de Fato RS, nosso instrumento para levarmos aos quatro cantos nossa visão do mundo. Seguimos caminhando!   Os próximos anos serão muito importantes para construirmos a utopia! E que as boas palavras saiam em profusão de nossas bocas!”

“POSSIBILIDADES. A palavra não gera ódio; geram-no os atos/ e seus trâmites./ A palavra não gera desentendimento;/ promovem-no as iras,/ o comportamento.

A palavra não destrata o próximo;/ destrata-o o homem e sua boca.

A palavra não cansa o poeta;/ cansam-no o peso e os limites.

A palavra não prende a ideia;/ prendem-no a grade e as circunstâncias.

A palavra não mede o cumprimento;/medem-no a visão e o encontro.

A palavra não mata o povo;/ matam-no a fome e a censura.

A palavra não dá solução de continuidade; dá-lhes o poeta e sua capacidade.

A palavra não tira a liberdade; tiram-na os poderosos e seus tiros” (Selvino Heck, livro MIGRANTE, nunca publicado, anos 1970.)

2023 será um ano de muitas lutas. 2023 será um ano onde a democracia e a soberania voltarão a brilhar. E o Brasil de Fato RS, com a palavra, o sentimento, a paixão, vai abraçar, não só as leitoras e os leitores. Abraçará a liberdade, com coragem, o sonho e a utopia no horizonte, construídas todos os dias.

“VIVÊNCIA. Vivo o peso da palavra./ Destroço cada letra,/ cada ponto,/ cada livro./ A caneta desliza,/ forma rascunhos,/ riscos,/ garranchos,/ na pele lisa,/ na brancura,/ na escuridão.

O medo foge/ do descobrimento da força da palavra,/ da letra que esmaga/ seu equipamento.

Luto o tempo todo/ para sentir a angústia,/a medida do rasgo,/ a potência de tijolo da palavra.

O povo respira,/ penetro seu ar,/ seu sofrimento,/ a ternura que sente,/ seu desespero.

A tensão não alivia/ a necessidade de participar da revolução.

Quero desvendar o segredo,/ a vida,/ o mundo que anima cada esperança,/ o silêncio que rodeia a voz.

Quero acordar o grito,/ a fuga,/ a pressão,/ a liberdade.

O peso da palavra/ ocupa-me o espaço do corpo,/ constrói a superfície,/ o horizonte do povo.

A palavra e seu encanto./ A palavra e seu mundo” (Selvino Heck, 1974, do livro nunca publicado PEQUENA BIOGRAFIA DO POVO.)

Longa vida ao Brasil de Fato RS! Ao Verbo e à palavra.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko