Minas Gerais

Coluna

Conflitos no campo aumentaram 30% em 2022

Imagem de perfil do Colunistaesd
Cerca de 60% das invasões a territórios indígenas dos últimos 10 anos ocorreram durante o governo Bolsonaro - Arquivo Movimento Munduruku Ipereğ Ayũ
Amazônia concentra 55% de todos os conflitos no país

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) lançou o livro-relatório Conflitos no Campo Brasil 2022 no último dia 17 de abril. Iniciado em 1985, esta é a 38ª edição anual que reúne o diagnóstico dos conflitos e violência no campo.

Os dados recolhidos por centenas de agentes de pastoral da CPT, tabulados e analisados pelo Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (CEDOC), com uma equipe com competência técnica e compromisso ético com a causa do campesinato nas áreas dos conflitos agrários e socioambientais.

Assassinatos e invasões de terras indígenas

O documento ressalta que no ano de 2022 foram registradas 2018 ocorrências de conflitos no campo no Brasil, envolvendo 909.450 pessoas e 80.165.751 hectares em disputa. Na Amazônia Legal a CPT registrou, em 2022, 1.107 ocorrências de conflitos no campo, representando 54,86% de todos os conflitos registrados no país.

Em 2022, aconteceram 47 assassinatos (206 ameaças de morte e 123 tentativas de assassinato), por conflitos no campo, um crescimento de 30,55% em relação a 2021 (36) e 123% em comparação com os dados registrados em 2020 (21).

Dos 47 assassinatos, seis eram mulheres, uma criança (Jonatan), de 9 anos, e seis indígenas em luta contra o agronegócio e contra os órgãos policiais e judiciários. Foram assassinados também Dom Phillips e Bruno Pereira que trabalhavam na defesa dos povos indígenas da terra indígena do Vale do Javari, na Amazônia.

:: Receba notícias de Minas Gerais no seu Whatsapp. Clique aqui ::

Entre 2013 e 2022, houve 1935 invasões de territórios indígenas. Porém, somente entre 2019 e 2022 - os quatro anos de governo Bolsonaro - foram registradas 1185 invasões de terras indígenas. Foram 61,25% das invasões dos últimos dez anos ocorreram nos últimos quatro! Mais de 37% dessas ocorrências de invasão durante este governo se deram em terras indígenas.

A grilagem teve crescimento relevante entre 2013 e 2022. Das 1310 ocorrências de grilagem nesta década, 659 ocorreram entre 2019 e 2022, 50,30% de todas as ocorrências do período.

A pistolagem também aumentou nos últimos quatro anos. Das 1379 ocorrências de pistolagem registradas entre 2013 e 2022, 505 ocorrências se deram no governo Bolsonaro, 36,62% das ocorrências dos últimos 10 anos.

Contaminação por agrotóxicos

Houve também um aumento exponencial da contaminação por agrotóxicos nos números de ocorrência de violência contra a pessoa. Em 2020, foram duas pessoas contaminadas. Em 2021, foram 71. Em 2022, o número subiu para 193 casos. Em 2022, 6831 famílias foram contaminadas pelos agrotóxicos, um número 86% maior que o registrado em 2021 e o maior já registrado pela CPT.

Esses números demonstram que o agronegócio com o uso abusivo de agrotóxico está causando uma brutal epidemia de câncer, Alzheimer e doenças respiratórias.

Trabalho análogo à escravidão e conflitos trabalhistas

Em 2022, foram registrados 207 casos de trabalho análogo à escravidão no meio rural, com 2218 pessoas resgatadas, o maior número dos últimos dez anos.

Somados, o número de ocorrências de conflitos trabalhistas no campo em 2021 e 2022 representam mais de 32% do total registrado na última década. Entre 2021 e 2022, apesar de 50% dos cargos de Auditor Fiscal do Trabalho estarem vagos, houve uma explosão nos números de autuação constatando trabalho escravo.

Entre 2016 e 2022, período que vai do golpe que deu início ao desgoverno do golpista Michel Temer ao final do desgoverno do fascista de extrema direita, 27,36% dos territórios onde ocorreram os assassinatos também sofreram pelo menos uma ação de pistolagem, 15% sofreu pelo menos uma ameaça de expulsão, 9% sofreu pelo menos uma ação de invasão e 13% uma ação de grilagem.

No ano de 2022 foram registrados pela CPT um total de 225 conflitos pela água, principalmente na Amazônia e tendo os indígenas e ribeirinhos como vítimas.

Solução

Enquanto perdurar a iníqua estrutura fundiária, pautada no latifúndio e no agronegócio com monoculturas, a injustiça agrária e socioambiental se reproduzirá e se ampliará. E não será possível superar as gravíssimas injustiças sociais que se abatem sobre a maioria do povo brasileiro.

Conscientes disso, centenas de agentes da CPT seguem acompanhando pastoralmente o campesinato, em sua imensa pluralidade, e conspirando a democratização e a socialização da terra.

 

 

Gilvander Moreira é frei e padre da Ordem dos Carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; professor de teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica).

-------

:: Leia outros artigos da coluna de Frei Gilvander Moreira ::

-------

Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

---

Edição: Elis Almeida