direito à terra

Atar e desatar: Bem Viver repercute o "nó" do marco temporal diante dos direitos dos povos

Além de exemplificar impacto da falta de demarcação indígena, edição apresenta mobilizações para evitar a tese jurídica

Ouça o áudio:

Dados de 2022 apontam que no Brasil 29% do território ao redor das terras indígenas está desmatado, enquanto dentro das mesmas o desmatamento é de apenas 2% - Edgar Kanaykõ/ Cobertura colaborativa – Apib
Quando não estamos em uma terra demarcada, não podemos construir nossa casa

As disputas em jogo com a tese do marco temporal estão diretamente associadas à situação de insegurança alimentar de cerca de 180 famílias indígenas do povo Avá Guarani no extremo oeste do Paraná. Essa é uma das inumeráveis histórias que se espalham pelas terras e territórios do Brasil que fazem parte do contexto da demarcação de terras indígenas.

"Quando não estamos em uma terra demarcada, não podemos construir nossa casa. Além de não termos acesso a serviços básicos como saneamento, saúde e educação", relata o cacique Natalino Almeida, líder da Tekoha ITy Mirin, em Itaipulândia, a 73 quilômetros de Foz do Iguaçu.

O indígena denuncia a desassistência direta por parte da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) por viver em um território não demarcado.  Distribuídas de maneira irregular em uma faixa de terra de propriedade da Usina Hidrelétrica de Itaipu, situada entre os municípios de Santa Helena e Itaipulândia, sete ocupações sintetizam o conflito indígena que tem como principal responsável a usina "líder mundial na geração de energia limpa e renovável".

"Somos proibidos legalmente de recebermos apoio institucional de prefeituras, demais órgãos, e da própria Itaipu. Se a Funai não envia alimento, muita gente passa dificuldade e fica sem ter o que comer", afirma Natalino. 

O cacique faz parte do grupo de lideranças Avá Guarani que figuram como réus em ao menos cinco processos de reintegração de posse movidos por Itaipu contra o povo originário na região. 

O "nó" atado pelo marco temporal 

Além dos impactos dos grandes empreendimentos, o território de diversos povos originários pelo país sofrem com invasões e degradação do meio ambiente, além de ameaças e ataques à população. O relatório “Conflitos no Campo Brasil 2022”, elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e divulgado em abril, aponta que no ano passado 18 indígenas foram assassinados em disputas pela questão do território. A análise da identidade social revela que os crimes vitimaram ainda sem-terras (9), ambientalistas (3), assentados (3) e trabalhadores assalariados (3). O documento ainda aponta que a Amazônia Legal concentrou 59% dos conflitos por terra em 2022. 

Neste cenário violento, a Constituição reconhece textualmente o direito originário dos indígenas sobre terras tradicionalmente ocupadas, sem mencionar nenhum critério de tempo para demarcações. Mas setores do agronegócio apoiam a tese jurídica que considera a data da promulgação da Constituição Federal como o marco temporal de demarcação de terras indígenas.

"A tese do Marco Temporal fixa uma data onde os povos indígenas teriam direito aos seus territórios, que é a data de cinco de outubro de 1988, contradizendo, inclusive, a própria Constituição Federal brasileira, que no seu artigo 231 é muito clara, quando fala do direito dos povos indígenas e o usufruto exclusivo dos seus territórios", questiona o coordenador executivo da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), Kleber Karipuna.  

:: Indígenas de todo país iniciam acampamento contra marco temporal em Brasília ::

A ideia avançou na Câmara dos Deputados e segue agora para o Senado através do Projeto de Lei (PL) 490. Nesta quarta-feira (7), o Supremo Tribunal Federal julga a mesma tese em sessão plenária que começa às 13h (horário de Brasília). 

Na prática, a tese jurídica enfraquece a demarcação de terras indígenas, já que se não tiverem provas de que ocupavam a área no período estipulado, centenas de povos que foram expulsos de forma violenta de territórios perderão o direito à terra. 

As mãos para desatar os "nós"

Entre denúncias - como a do Povo Avá Guarani - e disputas - com o marco temporal - o programa Bem Viver da Rádio Brasil de Fato destaca um emaranhado de "nós" que envolve os direitos de diversos povos do Brasil no acesso à terra e ao território.

A metáfora representa a necessidade de atar, desatar, afrouxar ou reforçar uma teia que envolve, além das mobilizações indígenas, a organização de mulheres camponesas com a Marcha das Margaridas 2023 e a luta através da arte, como a militância do cantor e compositor Chico Cesar com a Reforma Agrária Popular.

Na entrevista com Kleber Karipuna, são apresentadas as articulações de organizações indígenas com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) na última semana, para entender como se dará a tramitação do PL 490 (no senado, PL 2903), no Congresso. 

"Nós colocamos todos os riscos, todas as inconstitucionalidades que contém no bojo do PL, e ele colocou para a gente o seu compromisso em tramitar de uma maneira mais cautelosa, porque ele entende que é uma pauta delicada, assim como outras pautas”, explica Karipuna.

Ainda no tema terra e território, o cantor e compositor paraibano Chico César se manifestou em defesa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e falou que não se sente apenas apoiando o movimento, e sim como parte dele.

"A pressão do agro existe desde 1500, desde que os portugueses botaram os pés numa praia da Bahia. Nós, descendentes de quilombolas, de indígenas, nós sociedade brasileira, nós do MST não podemos arredar o pé em nenhum momento e não podemos perder a narrativa. Não temos nada a temer e [o MST]  vai avançar cada vez mais: ocupar, produzir, distribuir e socializar.", analisa Chico César em entrevista veiculada no programa.

Exemplo de mobilização para "avançar", a Marcha das Margaridas iniciou nesta terça-feira (6) uma campanha de arrecadação pela internet para captar doações para a edição deste ano do evento. O protesto reúne camponesas em Brasília pela garantia de direitos, trabalho e sobrevivência. 

Realizada no Brasil a cada quatro anos desde 2000, a Marcha é a maior ação protagonizada por mulheres da América Latina. Em 2023, ela volta às ruas pela sétima vez nos dias 15 e 16 de agosto. A organização espera reunir 100 mil trabalhadoras do campo na capital federal. 

Mazé Morais, coordenadora da Marcha, afirma que a singularidade da manifestação este ano está no encontro com diversos outros movimentos, que estão presentes na reconstrução do país após o desmonte das políticas públicas observados a partir de 2016.

"Levaremos às ruas a força da nossa luta coletiva para mostrar que somos fundamentais para definir um projeto de sociedade para o Brasil. Um projeto que recupere e reconstrua a democracia, que reverta os retrocessos dos últimos anos e que reoriente a economia para a sustentabilidade da vida, colocando o Estado e as políticas públicas a serviço da construção da justiça social, abrindo caminho para a sociedade do amor, do bem-viver e do envolvimento."

A campanha pretende arrecadar 30 mil reais nos próximos dois meses, valor que será usado para custeio da manifestação, inclusive o deslocamento das camponesas com origem em todas as regiões do país. Doações podem ser feitas na página da Marcha das Margaridas na plataforma Benfeitoria.


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Edição: Daniel Lamir