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O Novo PAC e a expansão da energia eólica

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Foto de geradores de energia eolica - Foto: PAC/ Ari Versiani
Para a efetiva redução da desigualdade regional, será necessária a adoção de medidas complementares

Neste ano, o governo federal vem adotando novas estratégias político-econômicas visando reassumir, no cenário internacional, o papel de protagonista da transição energética para o enfrentamento das mudanças climáticas. Para demonstrar que o Brasil superou o discurso ambiental falacioso dos últimos quatro anos, as ações do governo Lula se concentram na proposição de incentivos e investimentos em tecnologias e projetos voltados à redução das emissões de gases de efeito estufa no setor energético.

Desse modo, no lançamento do Novo PAC foi dada a atenção especial ao setor de energias renováveis, incluindo projetos de geração (eólica, fotovoltaica) e transmissão. Não por acaso, destaca-se a presença de Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), no evento de lançamento oficial do Novo PAC, única representante convidada a falar em nome do setor privado junto ao governo.

Para além das sinalizações políticas, vale lembrar que a matriz energética brasileira já é menos poluente se comparada com a média mundial, o que se deve, em grande parte, ao papel da geração de energia hidrelétrica. Além de sua contribuição histórica na expansão da oferta energética, viabilizando o processo de urbanização e industrialização do Brasil, a energia produzida pelas usinas hidrelétricas possibilitou a consolidação das fontes renováveis e a independência relativa da matriz energética nacional em relação às fontes carbono-intensivas.

Com efeito, a recente dinâmica de expansão de empreendimentos eólicos e solares também vem impulsionando a inserção brasileira no cenário global. Atualmente, o Brasil gera mais de 80% da sua eletricidade a partir de fontes renováveis, ao passo que a matriz mundial alcança menos de 30%.

Investimentos em parques eólicos

Em consonância com a intenção de consolidar a posição de liderança internacional, a ponto de exportar a energia excedente, o Novo PAC prevê o investimento de R$ 75,7 bilhões em geração de energia, sendo que 79% da energia adicional gerada virá de fontes renováveis, com destaque para a energia eólica.

O programa prevê que R$ 22 bilhões em investimentos privados sejam vinculados a 120 projetos de parques eólicos. Com isso, o governo sinaliza que haverá a realização de leilões para a concessão desses projetos para a iniciativa privada, além de uma série de medidas institucionais para oferecer maior segurança jurídica.

Entre essas medidas, estão a revisão do quadro normativo do setor elétrico, incluindo a racionalização e redução de encargos e subsídios do setor e a revisão de normas e incentivos aplicados à geração distribuída e às energias renováveis.

De acordo com o sítio eletrônico da ABEEólica, existem atualmente mais de 900 parques eólicos no Brasil, com mais de 10 mil aerogeradores em operação. O investimento no setor estimado entre 2011 e 2021 foi de US$ 42,3 bilhões. Nesse período, o país passou de uma produção de 1.524 megawatts de energia gerada por meio dos ventos para 21.567 megawatts. Com esse crescimento expressivo, 12% da energia elétrica injetada no Sistema Integrado Nacional em 2021 foi de fonte eólica, participação que continuou crescendo desde então.

Redução da desigualdade regional

Além do combate à mudança climática, o Novo PAC também pretende contribuir para a redução da desigualdade regional. Entre os investimentos previstos, 72% dos projetos de geração de energia fotovoltaica e todos os projetos de geração de energia eólica serão implantadas no Nordeste, aproveitando o potencial natural de cada região.

Entre os 120 projetos de parques eólicos previstos, 48 estão na Bahia e 45 no Rio Grande do Norte. No Rio Grande do Norte, os municípios que concentram mais projetos são: Parelhas (10 parques); Currais Novos (8 parques); Pedro Avelino (8 parques) e Lajes (5 parques). O mapa abaixo mostra a localização dos municípios potiguares que receberão os parques eólicos previstos no PAC, sendo que a cor mais escura significa maior quantidade de parques.


 

Na Bahia, os municípios que concentram mais projetos são: Várzea Nova (9 parques); Xique-Xique (9 parques); Urandi (6 parques); Ibitiara (6 parques) e Caetité (5 parques). O mapa abaixo mostra a localização dos municípios baianos que receberão os parques eólicos previstos no PAC.


 

Para que essa concentração de empreendimentos no Nordeste resulte em efetiva redução das desigualdades regionais, não basta que os aerogeradores sejam instalados na região. O impacto da presença do setor no território sobre os indicadores de desenvolvimento dependerá da adoção de uma série de medidas complementares.

Deve-se considerar, por exemplo, que, para além do período de instalação dos parques, que dura cerca de dois anos, os empregos gerados depois que os aerogeradores entram em operação são poucos, insuficientes para fomentar o desenvolvimento local. Porém, esses postos de empregos são mais qualificados e se forem ocupados por moradores podem contribuir para a criação de novas perspectivas, especialmente entre os jovens.

Considerando que um dos objetivos gerais do Novo PAC é a geração de empregos de qualidade, é preciso que também haja investimento em desenvolvimento de tecnologia com a disponibilização de recursos para pesquisas vinculadas às universidades públicas e institutos federais, o que contribui para gerar oportunidades e renda aos mais jovens.

Direito à consulta livre, prévia e informada

Além disso, o Novo PAC prevê um aperfeiçoamento do marco regulatório do licenciamento ambiental, que inclui a regulamentação da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) – que trata da consulta livre, prévia e informada às comunidades tradicionais – e o fortalecimento institucional dos órgãos com atribuições no processo de licenciamento ambiental.

Com efeito, a realização dos procedimentos de consulta livre, prévia e informada se apresenta hoje como um dos principais pontos de debate no campo das políticas socioambientais, o que tem chamado a atenção dos órgãos e instituições de fiscalização e regulação ambiental.

Ocorre que, a despeito da ratificação e promulgação convenção no país, desde 2002, a inexistência de regulamentação normativa sobre sua aplicação tem potencializado o surgimento de conflitos ambientais e territoriais e a violação de direitos humanos garantidos aos povos e comunidades tradicionais do Brasil, a exemplo do trágico e violento assassinato de Maria Bernadete Pacífico Moreira (mãe Bernadete), liderança da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq).

Segundo afirmam o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU), a não aplicação dos procedimentos de consulta prévia, livre e informada tem relação direta com a escalada de violência que atinge as populações tradicionais do país.

O aprimoramento das condições de consulta é um dos aspectos que ainda devem ser melhorados para que a instalação dos empreendimentos de geração e transmissão de energia previstos possam de fato contribuir para o desenvolvimento regional e local. Além disso, uma atenção especial deve ser dada aos conflitos fundiários que podem se agravar nessas regiões, além de associar os investimentos a estratégias de geração e circulação de renda no território, geração de empregos qualificados e desenvolvimento tecnológico.

Renata Guimarães Vieira é doutora em economia pela UFMG e é consultora em pesquisas e estudos socioambientais na área de energias renováveis e licenciamento ambiental.

Max Vasconcelos Magalhães é cientista social pela Universidade Federal de Minas Gerais, mestre em planejamento urbano e regional pela UFRJ e especialista em Estudos de Impacto Ambiental e Licenciamento de Grandes Empreendimentos pela PUC Minas. É consultor em pesquisas e estudos socioambientais na área de energias renováveis e licenciamento ambiental.

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Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

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Edição: Larissa Costa