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Crônica | Mil rosas roubadas

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Imagem ilustrativa - Foto: Freepik
Eles começaram a namorar quando tinham 11 anos de idade

A igreja estava lotada. O pastor todo sorridente. Era o reino de Deus representado aqui na Terra. A pregação empolgante: “refrigera a minha alma; guia-me nas veredas da justiça por amor do seu nome”. Foi o casamento do ano naquela quebrada. Muitas pessoas fizeram até dívida para não ficarem "feias na fita".

Os noivos nasceram na mesma maternidade. Muitos falavam que o destino dos dois foram traçados desde a barriga da mãe de cada um. Eles sempre foram unha e carne. Era um grude só.

Ela era mais atenta e esperta. Sempre com respostas prontas na ponta da língua. Seu cabelo liso, negro e grande chamava a atenção de todos daquele lugar. A menina tinha a proteção das benzedeiras. Olho gordo não passava nem perto. Seu corpo era fechado. Uma vizinha muito maldosa dizia que ela era muito dissimulada.

Ele era tímido e estudioso. Enquanto os outros meninos jogavam bola, empinavam papagaios e pipas, ele ficava estudando trancado no seu quarto. Ele era preto retinto, não gostava de pegar sol e só saía de casa com um terno que sua madrinha lhe deu de presente.

Eles começaram a namorar quando tinham 11 anos de idade. O ciúme dele era doentio. E as pessoas maldosas o achavam feio e muito devagar pra ela.  Aí começa toda a cisma do futuro noivo.

Na frente da casa de sua amada, morava um menino que tinha uns olhos azuis que chamavam atenção de todo mundo da quebrada. Sua amada não podia cumprimentar seu vizinho nem falar sobre seus olhos azuis.

Um dia, a mãe do noivo mostrou uma foto do pai dela pra ele e falou:

- Seu avô também tinha olhos azuis. Não fica bolado.

Isso ficou gravado nele como uma agulha de uma radiola fica encravada num disco velho.  Mas o ciúme aumentava ainda mais depois do casamento.

O tempo passou, e o primeiro filho nasceu. Ele foi correndo para a maternidade para conhecer o filho. A enfermeira logo viu que a criança tinha a mesma cor e o nariz muito parecido com o do pai, mas não quis comentar mais nada. Do lado de fora do berçário, apontou: aquele lá que é seu filho. Ele todo bobo e alegre começou a chorar passando mãos no vidro que ficou embaçado.

Logo a família completa e feliz retornou pra casa.

Ele chegou no berço e ficou olhando por muito tempo seu filho ali dormindo.

De repente, o menino abre os olhos e dá um sorriso pro pai.

Até hoje sua família o procura. Ele desapareceu e nunca mais voltou. Ninguém sabe o que aconteceu naquele berço.

 

Rubinho Giaquinto é músico, escritor e militante do Coletivo Solidariedade Cidadã.

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Leia outras crônicas de Rubinho Giaquinto em sua coluna no Brasil de Fato MG!

 

Edição: Elis Almeida