Minas Gerais

Coluna

Carnaval, educação e política

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Créditos - Foto: Andre Fossati/PBH
Em Minas Gerais, mais de 50 blocos de carnaval publicam uma posição comum contra Zema

No decorrer das últimas semanas, dois fatos me chamaram muito a atenção no noticiário sobre educação e política no Brasil (além, é claro, das ações da Polícia Federal contra os milicianos golpistas!): a repercussão dos encaminhamentos da Conferência Nacional de Educação (Conae) e a manifestação coletiva dos blocos de carnaval de Belo Horizonte contra o governo Zema e suas tentativas de se apropriar do carnaval.

Quanto à Conae, a realização de sua última etapa, a nacional, em Brasília, no fim de fevereiro coroou o trabalho de centenas de milhares de pessoas que em todo o Brasil passaram meses discutindo as novas diretrizes para o Plano Nacional de Educação. Ou seja, o investimento coletivo foi para colocar novamente a educação escolar brasileira nos trilhos e no centro do debate sobre os projetos de Brasil.

No decorrer da Conferência, não faltaram ótimas sugestões para o novo Plano Nacional e, claro, muitas vaias e manifestações de “fora Lemann”, numa clara denúncia e num enfrentamento ao poder das fundações privadas no MEC e nas políticas educacionais no país.

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Não por acaso, a reação à direita veio da imprensa paulista, capitaneada pela Folha de S. Paulo. Para o jornal as propostas da Conae – entre elas, empregar 10% do PIB nacional com educação pública – seriam fantasiosas e descontextualizadas. Mais uma vez, repetia o bordão dos privatistas: o Brasil não precisa investir mais em educação; precisa, sim, investir melhor.

Os argumentos do jornal, que é porta-voz do mundo empresarial em educação – nunca é demais lembrar que esse foi o jornal que, em 2018, dizia que não havia muita diferença entre o Haddad e o Bolsonaro, uma versão mais palatável da famigerada “escolha difícil” de seu primo-irmão Estadão – ,foram cabalmente desmentidos por comunicados públicos da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped) e pela Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), como se pode ver nos respectivos sites dessas instituições científicas.

De outra parte, nas Minas Gerais, mais de 50 blocos de carnaval publicam uma posição comum contra as tentativas do governo Zema em se apropriar e controlar o carnaval de rua de Belo Horizonte. Numa tomada de posição claramente política, colocam o governador Zema e seu governo nos devidos lugares: nunca apoiaram, nunca quiseram e nada contribuíram para o carnaval.

Pelo contrário, agem à luz do dia para trazer para Minas Gerais tudo aquilo que é contrário ao espírito que congraça os blocos, qual seja, o da alegria, solidariedade, democracia, da não-violência e do respeito a todas as diversidades.

Os gritos de “fora Leman”, na Conae, e o manifesto “fora Zema” dos blocos de carnaval, bem como as ações que essas manifestações buscam denunciar e repelir têm muito mais em comum do que a gente pode imaginar. Lembremos que a “grande imprensa”, ou melhor, a mídia empresarial, foi responsável por construir as condições para o recrudescimento do fascismo no Brasil, e que esse movimento teve todo o apoio do empresariado.

Lembremos também que Zema é amplamente apoiado pelo empresariado mineiro e nacional em sua sanha destrutiva e entreguista. E que a Conae e o carnaval reúnem justamente pessoas que querem reconstruir o Brasil em novas bases.

Somando tudo isso, a gente não apenas tem a noção de que o que está em jogo na educação e no carnaval, tal como se pratica nos blocos, é uma disputa pelos sentidos de projetos de Brasil que queremos construir.

Não é sem motivo, como já se disse aqui, que o empresariado sempre quis reduzir a educação à escola e banir desta a política. Foi justamente para poder controlá-las mais facilmente. Reunir, em conferência, centenas de milhares de pessoas para discutir o rumo da educação é educação política da população. Reunir centenas de milhares de pessoas para fazer carnaval de rua e se manifestar contra o fascismo representado por Zema et caterva, é educação política da população.

Hoje, mais do que nunca, o carnaval e a escola, a educação e a política, as pessoas que fazem a folia e as que fazem a escola se encontram, e isso pode mudar o rumo da sociedade brasileira.

 

Luciano Mendes de Faria Filho é pedagogo e doutor em Educação e professor titular da UFMG. Publicou, dentre outros, “Uma brasiliana para a América Hispânica – a editora Fondo de Cultura Econômica e a intelectualidade brasileira” (Paco Editorial, 2021)

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Larissa Costa