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A tatuagem de Greca e os dias sem memória

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Vivemos tempos de notícias fáceis e esquecimento do contexto e da luta de classes - Pedro Ribas
É o senso comum, imediato, fragmentário, sem contexto e sem História. É a água parada onde se banham

Acho que nesta semana todos nós da redação do Brasil de Fato Paraná resistimos a abordar a notícia do cidadão que tatuou Greca no braço, entre símbolos da velha "cidade modelo" de Curitiba.

Não falamos nada, deixando o silêncio sobre o assunto. É verdade, são tempos de notícias "caça-likes" fáceis, necessárias para as páginas que queiram que o algoritmo das empresas das redes sociais entregue seus conteúdos.

Assim, surgem páginas nos bairros de Curitiba, como o Tatuquara infoco, por exemplo, entre outras, ganhando seguidores com vídeos sobre atropelamentos, roubos na mercearia, apelos aparentemente sem contexto, mas que vêm carregados de ideologia, sem se apresentar como tal.

E a ideologia, já dizia o velho e bom barbudo, é a ideologia da classe dominante.

Afinal, qual é a posição desses veículos sobre temas como greves, lutas sociais, ocupações por moradia, direitos da juventude negra etc?

O que mais assustou no episódio do jovem que se encontrou com Greca, gerando apelo e curtidas, para mim foi pensar sobre qual visão o atual mandatário deixa sobre a cidade. Qual legado e qual memória?

Alguém recorda do pacotaço, do gás lacrimogênio e das balas de borracha com que servidores públicos foram recebidos em protesto na Ópera de Arame? Alguém recorda do impacto do ajuste contra os servidores em pleno período de pandemia? Alguém recorda que há quarenta anos inúmeros bairros de Curitiba não tiveram regularização fundiária?

José Arbex Jr, no livro Showrnalismo (2001), já anunciava como a cobertura da CNN da primeira invasão dos EUA no Iraque era eivada de uma carga gigantesca de pequenas notícias, que não formam um quadro de totalidade, gerando, na real, uma desmemória, a ponto de as pessoas, anos depois, não saberem explicar as razões do conflito e o que aconteceu.

Mais tarde, o cineasta e militante Michael Moore mostrou como soldados, já na segunda invasão do Iraque, em 2003, bombardeavam pontos escutando Radiohead, como se num jogo de video-game.

Vivemos tempos sem contexto, sem História, sem a ideia de luta de classes, e articulistas e empresas de comunicação aproveitam isso até onde podem, equivalendo os ataques do Hamas do dia 7 de outubro ao genocídio que vivem mulheres e crianças na Palestina. Fatos sem sujeito. Palestinos, de acordo com o jornal O Globo, teriam sido mortos "por buscar ajuda humanitária" no assassinato de 100 pessoas pelo Estado de Israel.

Enquanto isso, na Câmara Municipal, o presidente Fachinello, em pleno período de cheias e alagamentos, repudiava o desrespeito de Lula "contra o povo judeu". É o senso comum, imediato, fragmentário, repetitivo, sem contexto, sem estudo e sem História.

É a água parada onde a extrema direita e os neoliberais se banham.

Trabalhadores, organizações, movimentos, precisam permanentemente disputar e fazer valer a sua memória, suas ações. Sua História.

Edição: Lia Bianchini