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Artigo | Nem pop, nem tech, o Agro é corrupto

Membro do MST fala sobre as relações do setor do agronegócio com o golpe parlamentar que colocou Temer na presidência

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Joesley Batista, um dos donos da JBS
Joesley Batista, um dos donos da JBS - Divulgação

Ao invés de perguntar a Deus como foi parar ali, Michel Temer deveria perguntar à Confederação Nacional da Agricultura ou aos seus associados. O setor do agronegócio esteve entre os setores mais ativos para o financiamento da campanha pelo Impeachment da presidenta eleita Dilma Rousseff, desde inflar patinhos amarelos a pagar os trabalhos do publicitário particular de Temer, Elsinho Mouco, como o próprio marqueteiro confessou.

As relações entre o Agronegócio e a quadrilha que se instalou no Palácio da Alvorada são íntimas. Como é público e conhecido, além de encontros na madrugada para acertarem a mesada para Eduardo Cunha, Michel Temer e Joesley Batista, da JBS, também compartilharam jatinhos e, principalmente, propinas. Em troca, a JBS receberia a intervenção do governo para facilitar seus negócios.

Um dos canais para a recepção da propina era a empresa de engenharia e arquitetura Argeplan, de propriedade do coronel aposentado da Polícia Militar João Batista Lima Filho. Em 2016, O Movimento Sem Terra ocupou a Fazenda Esmeralda, em Duartina (SP), conhecida em toda região como propriedade de Temer, mas registrada em nome de Lima Filho. Não seria a área destino da lavagem de dinheiro da corrupção?

Mas Temer não está sozinho na sua amizade. Um em cada 3 deputados foi financiado pelos irmãos Batista em suas campanhas eleitorais, num total de 166 integrantes da Bancada da Friboi. Ao menos oficialmente, em financiamentos registrados. Junto a eles, 28 senadores. Entre os Partidos, o PP é campeão de financiamentos pela JBS. Não à toa, a Operação Carne Fraca apontou corrupção na fiscalização pelo Ministério da Agricultura, justo na área de frigoríficos, e num Ministério cujo domínio tem sido dividido entre o PP e o PMDB nos últimos 18 anos. E a própria delação dos irmãos Batista confessa que a empresa foi beneficada com compra de votos para aprovação de isenção de tributos pela Câmara.

A JBS também um bom exemplo do quanto o Agro é “tech”, suas empresas estão afundadas em denúncias de trabalho escravo, precarização do trabalho e desrespeito as leis trabalhistas. Coincidentemente, outra bandeira do governo Temer, acabar com os direitos com a reforma trabalhista. O parãmetro de tecnologia da JBS certamente devem ser as senzalas do século XIX.

Os interesses da JBS e do setor do agronegócio com a aprovação de isenções tributárias e das reformas é fundamental para superarmos o discurso predominante da mídia que só encerga corruptos, mas transforma os corruptores em sujeitos ocultos. Como se a corrupção fosse um ato individual e auto-suficiente de um político, ignorando que em sua origem está o setor empresarial em busca de transgredir as leis e a economia. Faltou pouco para os irmãos Batista se apresentarem como vítimas da ganância de Temer e companhia, enquanto fraudavam concorrências, burlavam fiscalizações e desrespeitavam a lei.

A corrupção nem de longe é o único crime associado a Temer e ao agronegócio. Seu braço direito, o Ministro da Casa Civil Eliseu Padilha é adepto de outra característica típica do agronegócio, a grilagem de terras. Em bom português: fraudar documentos para roubar propriedades de terra. Padilha é acusado de grilagem tanto no Rio Grande do Sul, onde se apoderou de uma área valorizada para a construção de parques eólicos, como também no Mato Grosso, onde é acusado pelo Ministério Público de desmatar 19 mil hectares no Parque Estadual Serra Ricardo Franco.

Outro ícone do agronegócio, Blairo Maggi, rei da soja, ocupa o Ministério da Agricultura. Recentemente, com a apreensão de um avião carregado de cocaína, a imprensa supôs que a soja não é o único produto de exportação da Fazenda Itamarati.

Além dos bolsos dos integrantes do governo, as propinas do agronegócio tem outro destino certo: a pauta do Congresso Nacional. Sob medida aos interesses de seus Ministros e de seus financiadores, Temer enviou as Mps 756, 758 e 759 que produzem uma série de retrocessos na estrutura agrária brasileira e fazem a festa de grileiros e outros contraventores. A frente da aprovação destas medidas, está outro campeão do agronegócio, da grilagem e do Governo Temer: o senador Romero Jucá, de Roraima.

Com um governo com relações tão carnais com o agronegócio e o crime, não é a toa que os fazendeiros sintam-se blindados e protegidos, ou melhor, impunes. Não apenas em violar a política e a economia, mas em desprezar a própria vida humana. No primeiro ano do golpe, os indíces da violência no campo retrocederam aos números de 13 anos atrás. Os assassinatos no campo saltaram para 61 vítimas, incluindo 13 jovens, 6 mulheres, 13 indígenas e 4 quilombolas. “Quilombolas, indígenas, gays e sem terras” são tudo o que não presta, segundo o Deputado federal Luiz Carlos Heinze, um dos papagaios de piratas postados fielmente ao lado de Temer em seu pronunciamento após a denúncia da PGR.

Como se sabe, não foi deus, mas o “grande acordo nacional… com STF com tudo”, nas palavras de Jucá, que levou Temer ao governo. E sua saída, manifestada nos desejos de milhares de brasileiros deve resultar não apenas em novas eleições diretas, mas numa limpeza da quadrilha agro-corrupta que se instalou nos poderes legislativos e executivo. O Fora Temer deve ter como consequências, tanto a devolução ao poder soberano do povo para escolher o Presidente da República, como o próximo mandatário precisa imediatamente revogar todas as medidas provisórias criadas a preço de propina e corrupção para favorecer o agronegócio. Deve também retirar definitivamente o Ministério da Agricultura e importantes ferramentas do Estado como a Companhia Nacional do Abastecimento da mão da camarilha do agronegócio. E para que a sociedade brasileira seja definitivamente sanada da ação criminosa do agronegócio nos poderes legislativos e executivos é necessário uma profunda reforma política que acabe definitivamente com o propinoduto chamado “financiamento privado de campanhas”. O Fora Temer só será efetivo se for for Fora também para quem lhe colocou ali: os patinhos da FIESP, os boizinhos da JBS e os cifrõeszinhos do capital financeiro que sustenta a ambos.

(*) Miguel Stédile é membro da coordenação nacional no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST).

Edição: Sul21