CURTO E GROSSO

A maior partida de todos os tempos

Saturno entra em quadra poucos meses após a Copa da Itália

Brasil de Fato | Belo Horizonte (MG) |
"Tudo o que realmente importava era o instante mágico de poder sonhar com um estádio lotado a festejar sua atuação"
"Tudo o que realmente importava era o instante mágico de poder sonhar com um estádio lotado a festejar sua atuação" - Reprodução

Uma imponente camisa vermelha, calção e meias brancas. Tênis preto, apenas preto, diferente desses pisantes ridiculamente coloridos que passaram a calçar nossos jogadores. Lembro-me, como se fosse hoje, do dia em que aquele menino franzino e tímido entrou em uma quadra para a maior de todas as partidas. Com seus sete ou oito anos, era o caçula do Saturno, saudoso esquadrão formado por vizinhos que moravam no bairro Esplanada, na Região Leste de Belo Horizonte, onde ele nasceu, cresceu e aprendeu a enxergar o futebol e toda sua beleza.

Corria o ano de 1990, poucos meses depois da Copa do Mundo, que teve o italiano Totó Schillaci como artilheiro, autor de seis gols no torneio. Em uma tarde de setembro, o Saturno enfrentou o Monte Verde. E lá estava o menino, com a camisa de tão grande que lhe escondia o calção, correndo entre adversários bem maiores que ele, mas isso nada importava. Ele castigou o goleiro uma, duas, três... seis vezes. De cavadinha, de bico, deixando o arqueiro no chão com um toque rápido, de rebote, de tudo quanto é jeito.

Metia a bola no arame velho do gol e saía numa disparada sublime, quando tudo o que realmente importava era o instante mágico de poder sonhar com um estádio lotado a festejar sua atuação. E ali mesmo, quando fechava os olhos e o mundo inteiro o reverenciava em um aplauso incontido, Barbosa, Heleno de Freitas, Maradona e Joãozinho vinham lhe abraçar. O jogo terminou 8 a 2 para os vermelhos do Esplanada.

Nivaldo, tio de dois jogadores do Saturno, foi testemunha da peleja magistral. Incrédulo, ele não podia conceber que estava diante de um discípulo dos gênios do futebol. Era como reviver o seu tempo de moleque. Era, também, a efêmera redenção de um homem que quando garoto corria pelos campos chutando uma bola cheia de poesia. Nivaldo comemorou cada gol do menino franzino como se dele fosse.

Quase 30 anos se passaram desde aquele dia. Algumas coisas ficaram pelo caminho, o Saturno não existe mais e sonhos foram desfeitos ou reconstruídos durante essa caminhada. Mas sempre quando se encontram em algum botequim, Nivaldo arregala seus olhos verdes, abre um sorriso e grita feliz como naquela tarde de setembro: “Schillaci! Totó Schillaci!”.

Edição: Wallace Oliveira