Coluna

BR Distribuidora: por que vender uma empresa que dá lucro ao Brasil?

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Sede da BR Distribuidora no Rio de Janeiro
Sede da BR Distribuidora no Rio de Janeiro - Divulgação
Entregamos para o mercado o que ninguém entregaria em qualquer outro lugar

O projeto de desmonte do Sistema Petrobras, que vem avançando a passos largos desde o golpe de 2016, teve – nessa semana – um novo capítulo. Na semana passada, a Petrobras anunciou a venda de 30% das suas ações no capital da BR Distribuidora, o que a relegou uma participação acionária total de 41,25%. Dessa forma, a BR distribuidora passa a ser uma empresa privada, na qual o peso da participação estatal é inferior à metade do capital total.

A pergunta que fica é: Por que privatizar um dos “braços” do Sistema Petrobras? Você, obviamente, assim no susto, poderia pensar que é porque essa empresa não é lucrativa, logo, é importante que o Estado se desfaça dela. Acontece que a BR Distribuidora teve um saldo de faturamento de R$ 100 bilhões no ano de 2018, alcançando um lucro líquido de R$ 3,2 bilhões no mesmo ano [1]. Em termos comparativos, a BR Distribuidora apresentou crescimento de 93,1% no seu lucro líquido no primeiro trimestre de 2019 em relação ao mesmo período de 2018[2]. Ou seja, a empresa não somente não é deficitária como apresenta expressivo crescimento anual.

Outro motivo alegado no senso comum é que a competição é um elemento importante para a melhoria e eficiência dos serviços prestados e para a diminuição do preço final aos investidores. Assim, o processo de privatização, ao abrir espaço para a administração privada, iria pondo fim ao arcaico monopólio da Petrobras. Muitos desconhecem, mas a Petrobras não é uma empresa monopolista desde 1995, e a distribuição jamais esteve no rol das atividades monopolizadas. O mercado da Distribuição de Combustíveis sempre esteve aberto. Ou seja, o setor privado pode, como o faz, criar empresas que atuem nesse ramo. No entanto, mesmo a distribuição sendo uma atividade de livre mercado, ainda assim a Petrobras sempre foi líder no segmento. Se as empresas públicas são ruins e ineficientes, o que justifica que, em um regime de livre competição, a empresa controlada pela Petrobras detenha a maior parte do mercado nacional?

Um terceiro argumento que provavelmente você já ouviu diz que a Petrobras deve se concentrar naquilo que é central num setor próprio da indústria de Petróleo, que é a Exploração e a Produção Petrolífera. Portanto, a Petrobras estaria “gastando” muita energia, tempo e investimentos em um setor que pode ser atendido pelo “mercado”. Ocorre que, diferentemente talvez de outros setores, a indústria petrolífera do mundo inteiro busca a integração e a verticalização das suas atividades. Dessa forma, a Petrobras não é uma jabuticaba brasileira por atuar na exploração, produção, transporte, refino e distribuição. Essa é a lógica própria de uma indústria que lida tanto com alto risco geológico quanto com as variáveis econômicas e políticas na formação do preço internacional. Assim, atuar de forma verticalizada influencia na redução das incertezas e no controle da cadeia produtiva.

A Petrobras, atualmente, pode ter prejuízos na exploração e produção de petróleo por conta dos baixos preços internacionais e, mesmo assim, seguir sendo uma empresa lucrativa, porque no agregado – juntando o rendimento do refino e da distribuição, por exemplo – ela fecha seu balanço com lucro líquido. Isso torna a integração dos ramos da cadeia imprescindível para uma indústria tão central. Além disso, de todas as atividades da cadeia de Petróleo e Gás, a Distribuição é aquela que tem menos riscos, diferentemente da Exploração e Produção, que têm riscos geológicos; ou do Transporte e Armazenamento, que têm alto gasto em infraestrutura; ou do Refino, que é muito intensivo em capital e tecnologia.

Portanto, não existe qualquer razão, pelo menos do ponto de vista econômico, que justifique a privatização desse setor. A justificativa para isso repousa apenas na perspectiva política, edificada no governo Temer e intensificada no governo Bolsonaro, de redução do tamanho econômico e da importância política da Petrobras, além de sinalizar aos investidores financeiros que estamos entregando para eles o que nenhuma petroleira entrega em qualquer outro lugar.

* Juliane Furno é doutoranda em Desenvolvimento Econômico na Unicamp, formadora da CUT e militante do Levante Popular da Juventude.

Edição: João Paulo Soares