Coluna

Içando as velas

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Após pressão, taxa Selic foi reduzida pelo Copom, do Banco Central, ainda presidido por Campos Neto (à esq.), indicado por Bolsonaro - Lula Marques/Agência Brasil
A notícia da semana para o governo foi ter conseguido dobrar a intransigência de Campos Neto

Olá!

A maré da economia virou e até Campos Neto fez o L. E com o bolsonarismo afundando, agora só falta dobrar o centrão.

.Batalha naval. O recesso do Congresso terminou e com ele o tempo que o centrão deu para o governo entregar mais cargos. Na mesa de negociações estão a aprovação do novo arcabouço fiscal, da LDO, das novas regras do CARF e da reforma tributária. Enquanto Arthur Lira balançava no mar ao ritmo de Wesley Safadão, Lula aproveitou para pescar peixes grandes na economia e usar a boa fase a seu favor. A estratégia do presidente foi desinflacionar o preço do centrão, como definiu Helena Chagas e, para isso, ganhar tempo antes de avançar na tal reforma ministerial, lembrando que o sistema é presidencialista e que a palavra final é dele. Lula também blindou alguns ministérios da sanha avassaladora do centrão, como a Saúde e o Desenvolvimento Social, e ainda bancou a presidência do IBGE para Márcio Pochmann, um petista puro-sangue. Tudo isso, é claro, teve um custo político. Em resposta, Arthur Lira disparou contra o ministro das Relações Institucionais Alexandre Padilha e ressuscitou a ladainha do semipresidencialismo. O presidente da Câmara ainda lembrou que é ele próprio quem garante os votos do PP para o governo e, para mostrar quem é que manda, resolveu atrasar a votação do novo arcabouço fiscal na Câmara que estava prevista para esta semana. Coincidentemente, a volta do recesso parlamentar também trouxe problemas para o governo com a convocação do ministro da Casa Civil Rui Costa à CPI do MST. Como a batalha é por cargos, o centrão sabe que cedo ou tarde a negociação virá, e já começou a bombardear alguns ministros, como Carlos Fávaro da Agricultura, Luciana Santos da Ciência e Tecnologia, Alexandre Silveira das Minas e Energia e Ana Moser dos Esportes para ver quem é que vai a pique.

.Somos todos governo. Apesar dos limites que ainda persistem na economia, como a dificuldade em alavancar o setor industrial, o governo tem o que comemorar. A Petrobras vai bem, batendo recordes na produção de petróleo e gás, e o mercado aceitou a nova política de dividendos da empresa. O Projeto Desenrola de renegociação das dívidas proposto por Fernando Haddad teve boa aceitação dos bancos e já começou a dar resultados. No Congresso, o novo arcabouço fiscal depende das negociações com o centrão, mas a expectativa é que seja aprovado em breve e espera-se também que a reforma tributária comece a andar. Mas, a notícia mais importante da semana para o governo foi ter conseguido dobrar a intransigência de Campos Neto. Mesmo que o placar do Copom mostre que há dissidência interna na autoridade monetária, o corte de meio ponto percentual na taxa básica de juros, com o voto favorável do próprio presidente do BC, aponta para a mudança de rota que há muito Lula esperava. Além de beneficiar o crescimento, o corte na Selic também deve contribuir para aliviar a pressão da dívida pública. De cara, o meio ponto economiza o equivalente a um Minha Casa, Minha Vida. Às vitórias na economia, somam-se às da política. O aliado de Lula, Cristiano Zanin, assumiu como ministro no STF e, em breve, haverá a indicação de um novo ministro que deverá ocupar a vaga de Rosa Weber, que está para se aposentar. E se o governo conseguir fazer do limão uma limonada, usando a reforma ministerial tão aguardada pelo centrão para ampliar sua base aliada e engolir o PP e o Republicanos, ele pode sonhar com águas mais tranquilas e estará pronto para passar a tarrafa nas eleições municipais de 2024. No entanto, se o problema não é a oposição, a amplitude e a diversidade de um governo cada dia com mais cara de coalizão pode gerar problemas para manter no mesmo barco aliados que vão do MST aos dissidentes do bolsonarismo, passando pelos pragmáticos do centrão. 

.À deriva. Enquanto o transatlântico de Lula busca as melhores correntes, o bolsonarismo sobrevive num bote. Ele se move com os ventos das pequenas escaramuças nas CPIs, onde conta com a ajuda das Forças Armadas, e com as marolas do tema do desarmamento, podendo comemorar a convocação de Flávio Dino para sessão da Comissão de Segurança da Câmara. O resto do tempo é gasto tapando buracos. O rombo mais recente veio do inquérito da PF contra a deputada Carla Zambelli (PL-SP), que envolve a tentativa de invasão do sistema do CNJ para forjar um mandado de prisão contra Alexandre de Moraes, então presidente do TSE. A tentativa teria ocorrido no início de janeiro, com a participação do hacker Walter Delgatti, e pretendia desmoralizar o resultado das eleições. Delgatti, que já foi convocado para a CPMI dos atos antidemocráticos, ainda poderá fazer uma delação premiada, possibilidade que causa calafrios em Bolsonaro, já que o hacker afirma ter conversado com o ex-presidente sobre a viabilidade de hackeamento das urnas eletrônicas. Para além de incorporar novas evidências das tentativas golpistas do bolsonarismo, o caso também respinga no PL, que já dá como certa a cassação de Zambelli na Câmara e também não está descartada a possibilidade de uma prisão da deputada. Tudo isso leva a crer que, no final, um dos poucos sobreviventes do naufrágio bolsonarista deve ser mesmo Tarcísio de Freitas. Afinal, enquanto os aliados do capitão afundam, o governador de São Paulo vai ocupando o espaço vazio à direita e incorporando o jeito miliciano de governar, seja distribuindo cargos para os parentes da família Bolsonaro, seja exaltando a polícia que mata. Ou talvez, avalia Maria Cristina Serra, Tarcísio esteja abraçando o bolsonarismo miliciano para sobreviver politicamente num Estado onde não tem nem raízes, nem influência eleitoral.

.Ponto Final: nossas recomendações.

.“Eu me sinto mais seguro sem a polícia aqui”. Na Piauí, um testemunho dos momentos de tensão da comunidade de Morrinhos, no Guarujá, diante da ação da PM paulista. 

.Profetas da Faria Lima acumulam previsões furadas sobre economia no governo Lula. No Intercept, João Filho elenca o festival de besteiras que assola a Faria Lima.

.Uma crítica da ideia de financeirização. No A Terra é Redonda, o economista Eleutério Prado discute com os teóricos da financeirização e propõe uma leitura original sobre o atual estágio da economia capitalista.

.Agosto eleitoral: entenda as próximas 3 votações latino-americanas. No Giro Latino, um panorama de três eleições que podem redesenhar o mapa da América Latina.

.Ampliação dos BRICS? No A Terra é Redonda, o ex-vice presidente do Banco dos Brics Paulo Nogueira Batista Jr explica porque a ampliação do bloco pode não ser positiva para o Brasil.

.Assim os rentistas cobiçam as águas do mundo. Cinco pesquisadores denunciam os riscos da ONU promover o aumento da desigualdade com a privatização das águas. No Outras Palavras.

.SNI comprou imóvel para espionar adversários e registrou em cartório no RS. No UOL, Graciliano Rocha conta o inacreditável episódio do serviço de espionagem da ditadura que registrou um esconderijo no seu próprio nome.


* Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

** Este é um texto de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Rodrigo Chagas