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Família do Barulho...

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A minha mãe confirmava isso, mas fazia um lobby materno para justificar tanta sorte. Ela falava pra mim que o Tonico Barulho ganhou muito dinheiro porque era muito bom para a mãe dele - Creative Commons
Se não der certo, não me culpem. Eu só conto o que me contaram

Na minha terra alguns apelidos se tornam sobrenomes informais. O sobrenome que consta nos documentos é um, mas quase ninguém sabe. O que vale é o sobrenome informal.  

Assim aconteceu com uma família de Bom Jesus da Penha, antigo distrito de Nova Resende, hoje cidade. No papel, tinham o sobrenome Ribeiro, mas quase ninguém sabia. Para o povo, o nome deles era Zeca Barulho, Tião Barulho, Dito Barulho... 

Tudo começou com o primeiro deles que apareceu por lá, vindo não sei de onde.  

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Segundo uns parentes, ele era muito festeiro, daí o apelido Barulho. Outros diziam que ele tinha mania de dar tiros pro alto. Por qualquer coisa, saía dando tiros, não para atingir alguém. Era pra cima. E pegou o apelido de Barulho por isso.  

Aí vieram os filhos, que herdaram o sobrenome Barulho. O Tonico, filho dele, também teve muitos filhos e alguns se casaram com parentes meus. Tenho tios e primos Barulhos. 

É uma família considerada rica, e o primeiro deles a ganhar muito dinheiro foi esse Tonico Barulho. Segundo meu avô, João Ourives, que vendia bilhetes da loteria mineira, a fortuna começou por sorte mesmo. O Tonico Barulho raramente jogava na loteria, mas quando jogava, era prêmio na certa.  

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A minha mãe confirmava isso, mas fazia um lobby materno para justificar tanta sorte. Ela falava pra mim que o Tonico Barulho ganhou muito dinheiro porque era muito bom para a mãe dele, e me contava: 

— Quando criança ele era pobrezinho. Trabalhava na enxada, Tudo que fazia era pela mãe. 

Ainda segundo minha mãe, no final de cada dia de trabalho, em vez de pegar dinheiro ou qualquer outra coisa que o fazendeiro lhe oferecia, pedia um pouquinho de cada mantimento. E, como convém aos contos desse tipo, ele tinha só um saco de estopa para levar tudo.  

Como fazer para não misturar arroz, feijão e o que mais levasse, naqueles tempos que não existiam saquinhos plásticos, e mesmo saquinhos de papel eram raridade na roça? 

— Ele punha um pouco de feijão no fundo do saco, dava um nó logo em cima dele, aí punha arroz, dava outro nó, em seguida punha fubá, depois café... e assim por diante. 

— Deus deu sorte pra ele por causa disso — afirmava minha mãe. 

Portanto, meninada que quer enriquecer, antes de jogar na loteria, olha aí o exemplo dele... Se não der certo, não me culpem. Eu só conto o que me contaram. 

 

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Daniel Lamir