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Nação Mulambo é resistência cultural

Grupo percussivo de Peixinho existe há 21 anos sem incentivos

Brasil de Fato | Recife (PE) |

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O  nome “mulambo” vem da calça com retalhos pendurados, usada pelos batuqueiros nas apresentações
O nome “mulambo” vem da calça com retalhos pendurados, usada pelos batuqueiros nas apresentações - Divulgação

O bairro de Peixinhos é o segundo mais populoso da cidade de Olinda. Com 36.133  habitantes, segundo o Censo 2010 do IBGE, a localidade sofre com falta de infraestrutura, além de carregar o estigma da maioria das periferias: violento. Entretanto, o local é um caldeirão de cultura, resistência e arte. Foi de lá que saíram grandes nomes da música brasileira, como Chico Science, Toca Ogan e Marcos Axé.

É nessa localidade que reside o Nação Mulambo, nascido em 1997. O nome “mulambo” vem da calça com retalhos pendurados, usada pelos batuqueiros nas apresentações. Para tentar intervir na realidade da violência e do tráfico de drogas, o grupo desenvolve um trabalho pedagógico e social com as crianças e os adolescentes moradores da comunidade. No projeto é trabalhado a cultura afro-brasileira e os ritmos regionais – samba, coco, maracatu, ciranda, afoxé – com letras do próprio Mulambo. 

Sem incentivos financeiros, as atividades do grupo foram ficando cada vez mais difíceis de acontecer. Durante os 21 anos de existência, muitas pessoas passaram pela diretoria e tiveram que reverter quadros de muita dificuldade. Foi em uma dessas crises que o ex percussionista Marcos Axé assumiu o grupo. Ele foi participante desde o início e estava como diretor, até seu falecimento - em Novembro do ano passado. Axé era percussionista de Otto, há mais de 20 anos e começou seu contato com a música aos nove anos de idade, ainda em Peixinhos, nas atividades do Grupo Comunidade Assumindo Suas Crianças, que hoje empresta os instrumentos e a sede para o Nação Mulambo.

Hoje, quem toca todas as atividades é a irmã de Axé, Senhorinha Joana Alves. “Depois que meu irmão faleceu, o Mulambo ficou apenas com 6 crianças. Ninguém mais queria tocar. Desde criança toco no Mulambo e decidir que iria assumir esse trabalho, mesmo não sendo musicista, para não deixar morrer. De 6 meninos, fizemos um trabalho de formiguinha dentro da comunidade, conversando com as famílias e hoje temos 40 batuqueiros.”, conta.  O Nação Mulambo além de trabalhar a música como ferramenta de transformação social, também trabalha os temas reais e necessários para a formação dos indivíduos “Aqui a gente não quer formar só músicos, a gente quer criar uma ideologia crítica e formar cidadãos e cidadãs que respeitem as diferenças”, diz. 

As condições para o Nação Mulambo ainda não são as mais desejáveis. Na terça-feira (30), por exemplo, eles não conseguiram ir ao ensaio que estava marcado na Casa dos Bonecos Gigantes de Olinda, no Alto da Sé, por falta de transporte. “Nessa crise, a gente estava até sem instrumento para trabalhar, foi ai que o pessoal do Grupo Comunidade Assumindo Suas Crianças, dispuseram da sede e dos instrumentos que tinha lá na instituição. Para os gastos com transporte, alimentação e afins, nós contamos somente com doações”, diz Senhorinha. 

A comunidade é a principal parceira do Mulambo. “Aqui todo mundo sempre foi muito receptivo.  Termina que somos além de mestre de maracatu, assistente social, pedagoga. Isso porque toda demanda que vem da criança, vem junto com a demanda das famílias e a gente passa a ser parte dessas famílias”, conta. Sobre quem pode participar das atividades do grupo, Senhorinha conta “como diz a música: aqui dança preto, aqui dança branco. É aberto para todo mundo, desde os 5 anos de idade até quando quiser e puder”. 

No carnaval, o Nação Mulambo sempre escolhe quem homenagear. E sempre são escolhidos nomes que têm relação com a comunidade. Já foram a escritora e educadora social, Zuleide de Paula, os mestres Galo Preto e Seu Manoel, a arte educadora Nilza Maranhão e o artista Otto. Em 2018, o homenageado é Marcos Axé, que também foi indicado para ser o homenageado do carnaval de Olinda. Para Ryan de Almeida, 15 anos, o grupo mudou sua relação com as pessoas do bairro e com a música “eu fico muito feliz tocando aqui. Agora as pessoas quando eu passo dizem: olha aquele menino que toca no Mulambo. Ganhei muitos amigos. Aqui é minha religião”, conta o garoto que é batuqueiro há dois anos. 

Para maiores informações sobre como ajudar o projeto
Telefone: (81) 99812.6686

Edição: Monyse Ravenna