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Mutirão constrói abrigo em terra indígena para militantes dos povos originários no DF

Com base em ações de bioconstrução, voluntários se unem em Sobradinho para receber indígenas

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Voluntários reunidos em tenda de bambu montada no território indígena Recanto dos Encantados, em Sobradinho (DF)
Voluntários reunidos em tenda de bambu montada no território indígena Recanto dos Encantados, em Sobradinho (DF) - Mutirão do Bem-Viver/Divulgação

Com quantos braços se faz a solidariedade? No território indígena Recanto dos Encantados, localizado em Sobradinho (DF), a 22 km de Brasília, com muitos. Reunidas em uma ação de voluntariado, dezenas de pessoas estão concentradas desde o dia 22 de dezembro para executar o “Mutirão do bem-viver”, pensado para construir estruturas de hospedagem que possam receber indígenas de outros estados.

A ideia é acolher também militantes parceiros que estejam em trânsito e precisem de abrigo em Brasília. O ambientalista Thiago Ávila, um dos voluntários envolvidos, destaca que a ação parte da necessidade de ajudar a construir instrumentos que possam fortalecer a luta dos povos tradicionais e preservar os diferentes biomas.

Por conta disso, o projeto foi planejado de acordo com os princípios de respeito à natureza, um dos norteadores do conceito de “bem-viver”, que dá nome ao mutirão. O ambientalista destaca que é, antes de tudo, um projeto de sonhadores.

 “Isso daqui é uma soma de fragmentos de pessoas que são um universo em si só e que resolveram construir um universo comum, que é muito maior e tem um potencial realmente transformador”, afirma Ávila.

Bioconstrução

Buscando uma relação harmônica com os recursos naturais, o projeto foi arquitetado a partir da bioconstrução, prática que lida com materiais de baixo impacto e que não concorrem para a exploração indevida do meio ambiente. Diante disso, bambu, barro, terra e pneus usados são alguns dos aliados fundamentais.

O grupo já construiu espaços de acampamento, composteira, sistema de tratamento de água, banheiros ecológicos e uma ecotrilha.

Também foram feitas pontes e escadas de bambu às margens do ribeirão Sobradinho, onde está localizado o território, com o objetivo de facilitar o acesso de grupos que queiram aproveitar o recanto para a prática da educação ambiental.

A universitária Júlia de Flora, que mora em Brasília e tem se dedicado a participar do mutirão desde a concepção dos trabalhos, afirma que o engajamento no projeto tem sido uma forma de resgatar a participação na política. Com isso, ela espera sedimentar outros caminhos possíveis para a prática da militância, como é o caso das ações de caráter socioambiental.

“Eu estava numa vibe de querer me afastar da política, dessas coisas, porque eu via muitas crises na forma como a gente atuava, e [aqui] acabei conhecendo pessoas que fazem isso de uma forma diferente e comecei a reacreditar nisso. O que me move mesmo é saber que tem pessoas aqui que realmente são realizadoras e que querem construir a sociedade do bem-viver”, afirma.

Solidariedade

Se para quem vive no Distrito Federal a proposta é atraente, para quem mora em outros estados e resolveu viajar para participar do mutirão, então, a ideia parece ainda mais sedutora. É o caso da estudante Beatriz Moraes, que veio de São José do Rio Preto, interior de São Paulo.

Presente desde o início dos trabalhos, ela conta que já se engajou em diferentes atividades na rotina do mutirão, como capinação de terreno, medição de bambus, cozinha coletiva e até mesmo na produção de um documentário que registra o dia a dia das ações.

A fonte de energia pra dar conta de tudo isso vem, segundo ela, da inspiração que o projeto provoca nos voluntários.

“É [da ideia de] utilizar os meu recursos, não só financeiros, mas meu tempo, disposição, força, vontade de trabalhar, em prol de algo coletivo e comum, algo que não seja só pra mim. É ver algo que seja construído pelo bem comum”, explica.  

Além de terem a solidariedade dos parceiros como motor, os trabalhos promovem uma maior interação entre indígenas e não indígenas, incentivando o intercâmbio de culturas e conhecimentos.

“É de suma importância porque é uma troca de experiências, de vivências culturais. Eles aprendem com a gente e a gente aprende com eles, e isso nos deixa muito motivados. É de uma preciosidade que não tem dinheiro nem nada que pague”, considera a indígena Airy Gavião.

Ao todo, o “Mutirão do bem-viver” tem atraído uma média de 300 pessoas, com público flutuante de cerca de 100 voluntários por dia. As atividades seguem até o próximo domingo (13). 

Edição: Pedro Ribeiro nogueira