Meio Ambiente

Venda de oxigênio: Paulo Guedes ignora realidade da floresta e do próprio governo

Proposta para Amazônia reforça falsa ideia de "pulmão do mundo" e desconsidera política antiambiental de Bolsonaro

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Imagens do INPE mostram o avanço na destruição da Amazônia
Imagens do INPE mostram o avanço na destruição da Amazônia - Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE)

A ideia de fazer o resto do mundo pagar pelo consumo do oxigênio que é produzido na Amazônia, lançada na semana passada pelo ministro da Economia Paulo Guedes, revela não só seu desconhecimento sobre a floresta, mas também sobre as diretrizes gerais do seu chefe imediato, o presidente Jair Bolsonaro (PSL), inimigo declarado da preservação ambiental.

Em evento realizado na Zona Franca de Manaus (AM) no último dia 25, Guedes propôs a criação de uma “Bolsa Mundial de Oxigênio”, que permitiria ao governo brasileiro negociar e receber recursos financeiros pela “propriedade” do oxigênio.

A ideia de que Amazônia seria o “pulmão do mundo” é antiga, mas não condiz com a realidade, já que a floresta é um ecossistema complexo que consome quase todo o oxigênio que produz. Em nível global, a responsabilidade de fornecer o oxigênio é predominantemente das algas.

A preservação da floresta, diz o engenheiro florestal Paulo Barreto, pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), é importante por outros motivos.

“Parte da água que é evaporada aqui na Amazônia vai pro restante do país, o abastecendo com as chuvas e beneficiando a produção agropecuária, enchendo reservatórios de água das hidrelétricas, para o consumo humano, etc”, afirma Barreto.

A floresta também “sequestra” grandes quantidade de gás carbônico (CO2), gás que é um dos responsáveis pelo efeito estufa: "A floresta é um grande estoque de carbono. Quando se queima essa floresta, isso vira um poluente que se acrescenta a toda poluição emitida no mundo, causando o aquecimento global”.

No entanto, estas questões, entre outras, não parecem no horizonte de Bolsonaro.

“Embora o governo fale que quer conciliar conservação ao desenvolvimento, não tem adotado as medidas necessárias para essa conciliação. Ao contrário, tem sido tanto no discurso quanto na prática bastante agressivo contra políticas ambientais”, lembra Barreto.

Ele questionou, por exemplo, a extinção do conselho gestor do Fundo Amazônia, em abril. O Fundo prevê a aplicação de recursos internacionais em projetos de conservação e desenvolvimento sustentável. Desde a sua criação, em 2008, destinou R$ 3,2 bilhões a projetos de preservação, oriundos sobretudo de Alemanha e Noruega.

“Se o Brasil quiser entrar em alguma negociação para ter mais benefícios para a floresta, está começando com um cenário negativo”, afirma ele.

O pesquisador também lembrou da diminuição das ações de fiscalização contra o desmatamento e o roubo de terras públicas, ao mesmo tempo em que cresce a ocorrência desses crimes. Para ele, esse recuo está diretamente ligado ao discurso de Bolsonaro.

“Antes mesmo de tomar posse, o governo eleito já criticava o IBAMA, o ICMBio. Essa linguagem agressiva criou um clima de impunidade. Tem muita gente achando que pode fazer o que quer, porque não vai ter problema nenhum. Na prática, depois de tomar posse, já houve redução na fiscalização”.

Segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), o desmatamento na Amazônia, em junho deste ano, foi 88% superior ao registrado no mesmo mês de 2018. O órgão governamental também mostrou que, de agosto de 2017 a julho de 2018, 7.536 km2 de mata foram derrubados, o que representa aumento de 8,5% em relação ao mesmo período entre 2016 e 2017.

A divulgação dos dados motivou críticas de Bolsonaro. No sábado (27) durante evento do Exército, no Rio de Janeiro, ele ironizou:

“Quando acabarem as commodities do Brasil, nós vamos viver do quê? Vamos virar veganos? Vamos virar, sim... Viver do meio ambiente? Não podemos tratar o meio ambiente como uma psicose ambiental”.

Edição: João Paulo Soares