Jogo político

Aliados de Dilma articulam reversão de votos em processo de impeachment

Expectativa é que fragilidades da gestão Temer e dúvidas da primeira fase do processo sejam esclarecidas, virando o jogo

RBA |
Lúcia (GO), Romário (RJ) e Valadares (AP), Braga, Cristovam e Reguffe (DF): discursos dúbios e imprevisibilidade
Lúcia (GO), Romário (RJ) e Valadares (AP), Braga, Cristovam e Reguffe (DF): discursos dúbios e imprevisibilidade - Agência Senado e PR

Depois da entrega da defesa prévia pela equipe da presidenta Dilma Rousseff na tarde desta quarta-feira (1º), parlamentares de vários partidos se preparam para a discussão e votação, amanhã, do plano de trabalho da Comissão Especial do Impeachment. O grupo que trabalha pelo impeachment tenta, segundo parlamentares ouvidos pela RBA, atrasar o rito do processo, em vez de acelerar – conforme pretendia anteriormente. As bancadas do PT e PCdoB querem o contrário.

“Vai ser uma tourada e estamos nos preparando para isso”, comentaram esta manhã dois senadores de apoio a Dilma. As negociações por mudanças de voto favoráveis ao afastamento em 11 de maio, na avaliação desses parlamentares, contam como pontos fatores favoráveis à "virada" o período de desgaste do governo Temer – com queda de dois ministros em duas semanas, envolvimento de peemedebistas em denúncias da Lava Jato, frustração de parte da população que foi às ruas pedir o impeachment com o que veio depois e até falta de confiança nos mercados na capacidade do interino de liderar um processo de "união nacional" pela governabilidade.

Muitos senadores votaram deixando claro que seus posicionamentos eram para que fosse aberto o processo e dada ampla defesa à presidenta para se defender e não porque a consideravam culpada de ter cometido crime. Estão entre o grupo de senadores que já deram declarações nesse sentido Cristovam Buarque (PPS-DF), Reguffe (sem partido-DF), Romário (PSB-RJ) e Acir Gurgacz (PDT-RO). Buarque justificou seu voto "pelo conjunto da obra" do governo Dilma. "Isso. porém, não está em julgamento, uma vez que o mandato de Dilma só deve ser julgado, pelas urnas, em 2018", disse um parlamentar.

O apoio de governadores com alguma influência no Legislativo também tem sido considerado fator importante – como Flávio Dino (PCdoB), do Maranhão, e Wellington Dias (PT), do Piauí. Assim como o reforço de senadores do PMDB que se posicionaram contrários ao afastamento, casos de Roberto Requião (PR) e João Alberto Souza (MA).

Aliados da presidenta tentam convencer Eduardo Braga (PMDB-AM), que se licenciou do cargo de senador e não votou na primeira vez, a se posicionar contra o impeachment. Braga foi ministro de Minas e Energia do governo Dilma, um dos últimos a entregar o cargo e sempre demonstrou estar dividido entre a fidelidade ao governo ou à decisão de seu partido. Ele tem evitado falar a respeito.

Outro muito procurado, o senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) fez críticas ao governo Dilma ao votar pelo afastamento, mas elogiou o governo Lula e lembrou o posicionamento menos hostil ao governo que vinha sendo adotado pelo PSB antes de a crise se acirrar. Lembrou também a importância de se defender a democracia ao se abrir o processo, com a ressalva de ser dada ampla defesa à presidenta – sem confirmar se estava aprovando só a admissibilidade do processo, nem como seria o seu voto final.

Governo instável

A avaliação desse quadro tem animado a base de presidenta Dilma. E preocupado os integrantes do governo interino, que passou a considerar a possibilidade de atrasar os trabalhos com o argumento de buscar ambiente que possa ser visto como “mais estável, com tempo para pôr a casa em ordem”, conforme disse um peemedebista esta manhã.

Para o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), as decepções com o governo Temer levam a uma mudança de pensamento por parte dos senadores, juntamente com a dúvida que já existia antes, entre muitos desses parlamentares, sobre a prática de crime pela presidenta. Costa também acha que todos os que estavam indecisos na primeira votação decidiram-se pela admissibilidade do processo porque sabiam que haveria uma nova fase pela frente. E desses, a maior parte agora não sabe se repetirá seus votos.

Pelas contas de representantes do PCdoB, esse número pode chegar a um total de 11 senadores, que farão a diferença para a virada de jogo no impeachment. A briga é dura, porque os aliados da presidenta afastada reconhecem que a escolha de Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), ontem, para líder do governo no Senado, pode atrapalhar as articulações.

Além da influência de Nunes Ferreira na Casa, há ainda a mão pesada dos próprios escudeiros de Temer – Eliseu Padilha (ministro da Casa Civil), Moreira Franco (responsável pela área de projetos de infraestrutura do governo interino), Geddel Vieira Lima (secretário de Governo) e os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Romero Jucá (PMDB-RR), mesmo estando esses últimos envolvidos na Lava Jato.

Sem certezas

Cristovam Buarque (PPS-DF) foi um dos primeiros a declarar que está indeciso em relação ao seu voto, ao lado de Reguffe. Os dois são aliados, integram o mesmo bloco político, são do Distrito Federal e costumam votar da mesma forma.

Buarque, que já foi governador (1995-1998) do Distrito Federal pelo PT, elegendo-se senador em seguida, foi um dos que mais criticaram o teor das conversas que flagraram o então ministro da Transparência, Fabiano Silveira, dando instruções ao senador Renan Calheiros sobre como agir diante das investigações da Lava Jato.

No final de março, Buarque afirmou, numa rede social, que protestou quando o PT começou a dizer que impeachment, mesmo dentro da Constituição, é golpe. Mas, ao mesmo tempo, entendia que ao gritar “Temer presidente” no momento em que se afastou do governo, a bancada do PMDB, a seu ver, deu argumentos para ser chamada de golpista.

Além dele, o senador Romário afirmou que assim como questões políticas influenciaram muitos votos na primeira votação, todos esses novos fatos políticos irão influenciar agora. "Meu voto final estará amparado em questões técnicas e no que for melhor para o país."

Outro a deixar pistas foi Gurgacz. Ele disse entender que não há crime de responsabilidade fiscal da presidenta por causa das pedaladas. “O que eu coloquei na primeira votação e reitero agora é que a admissibilidade era uma necessidade naquele momento, porque a população estava cobrando esta discussão. O mérito é outro momento, que estamos avaliando”, observou.

Sem querem se pronunciar abertamente, mas emitindo sinais, está a senadora Lúcia Vânia (PSB-GO). Ela votou com discurso de que estaria convencida da existência de razões de sobra “para investigar mais a fundo indícios apontados pelo relator da Comissão Especial do Impeachment”. Mas só isso. Segundo pessoas próximas, a senadora teria sido convencida por colegas do seu estado a votar pelo impeachment na primeira fase, mas está avaliando sobre como fará daqui por diante.

Fase de instrução

A nova fase da comissão do impeachment, que se inicia hoje, passa a ser a de instrução do processo. Nesta tarde, além da defesa da presidenta, encerra-se também o prazo final para que os membros da comissão indiquem testemunhas a serem ouvidas e provas a serem apreciadas.

Conforme o plano de trabalho proposto anteriormente pelo relator, senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), a ser avaliado amanhã, a comissão poderia realizar as diligências entre os próximos dias 6 e 17, e o interrogatório de Dilma, vir a ser agendado para o dia 20. Nesse ritmo, a votação final do impeachment teria condições para acontecer em 2 de agosto.

Agora, que a base aliada do governo afastado demonstra aprovação a esses prazos, peemedebistas e tucanos atuam para que sejam modificados. O que leva a crer que a temperatura na reunião desta quinta-feira será quentíssima.

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